Sombras do Passado – Capítulo 21
Capítulo 21: O destino adora pregar peças!
“Não espere por uma crise para descobrir o que é importante em sua vida”. (Platão)
Pedro continuava me enforcando.
– Queria lhe dizer que… _ parei devido à dificuldade para falar, Pedro afrouxou um pouco sua mão em meu pescoço para que eu pudesse falar _ eu nunca gostei de você mesmo _ dou um meio sorriso e continuo. _ mas naquele dia em que disputamos uma corrida até minha casa, eu percebi que você também pensava que não tinha escolhas, assim como eu pensava que eu não tinha. _ ele pareceu se interessar pelo o que eu dizia e afrouxou um pouco mais o seu aperto. _ deixa de ser idiota e se permita dar um voto de confiança em alguém. Pelo menos uma vez. Eu sou Alicia. Eu não matei minha mãe. Não sou sua amiga, mas sou uma das mocinhas da história. Você vai matar uma das mocinhas, seu idiota? Só pelo fato do meu cabelo estar diferente? Sabia que existe água oxigenada e lentes para os olhos?
Então ele me soltou e eu comecei a tossir, me curvando para frente. Nós ficamos em silêncio por alguns instantes.
Ele quase me matou. O pior é que eu estava toda confiante de que não lutaria com ele para não machuca-lo e no final das contas era ele quem estava com o poder de estragar tudo e me matar.
– Então você é mesmo a Alicia? _ ele perguntou sem jeito enquanto encostava-se a uma arvore. Ele estava ofegante.
– É o que eu estou lhe dizendo desde o primeiro momento em que nos vimos, imbecil! _ digo irritada e massageando o pescoço.
– Não posso acreditar! _ ele diz passando a mão na cabeça. Ele havia voltado á sua forma humana.
– Percebi. Você quase me matou! _ eu disse entre uma tossida e outra. _ vocês não desconfiaram nem se quer um momento de que ela poderia ser uma impostora? Poxa, ela não deve ser tão parecida assim comigo.
– Claro que tive meus momentos de desconfiança, mas nunca nada tão serio. _ ele faz uma pequena pausa. _ Ela parece gostar muito do Rodrigo, e sempre está conversando com todo mundo, ela parece lega! _ ele disse.
– Legal? _ lancei um olhar mortal para ele. _ está me dizendo que eu não sou legal? E se você estava em duvida, por que tentou me matar? Você mata primeiro e pergunta depois? Você sabia que os mortos não costumam conversar com os vivos? Como você iria se desculpar se matasse a garota errada?
– Alicia! _ ele disse em tom serio. _ muita coisa aconteceu nessas ultimas semanas! Ninguém pode confiar em ninguém. Você me convenceu quando começou a me chamar de idiota. Isso é a sua cara! Mas me desculpe pelo que fiz!
Fiquei surpresa com o pedido de desculpas e é claro que isso me desarmou.
– Tudo bem! _ eu disse.
– Por que você pintou o cabelo? _ ele perguntou.
– Eu não pintei o cabelo! _ respirei fundo para tentar me acalmar.
– Mas você disse que… _ eu o interrompi antes que terminasse a frase.
– Eu sei o que eu disse! Mas eu só disse aquilo porque eu estava meio sem tempo para explicar a história inteira.
– Como assim? Você mentiu? _ ele pareceu chateado.
– Relaxe, Super-Homem! Eu não menti quando disse que eu sou Alicia! _ me sentei no chão. _ é melhor se sentar também, vou lhe contar o que aconteceu. _ ele se sentou no chão logo á minha frente
Contei para ele tudo o que pude. Sobre o plano de Rodrigo ao me deixar para morrer e sobre o que Alexia pretendia ao tomar meu lugar. Contei sobre o submundo, que era onde ficava a casa e o castelo de Roger, e sobre como ganhei minhas mechas de cabelo azul e olhos azuis quase roxos.
– Eu já desconfiava de Rodrigo, mas nunca pensei que pudesse ser algo tão sério. Ele planejou matar você? _ Pedro disse quando terminei de contar o que havia acontecido.
– Sim. Você sabia que ele tinha me enfeitiçado, não sabia? _ eu perguntei me lembrando do dia em que fizemos uma reunião na casa de Karina.
– Sabia! _ ele confirmou.
– Por que não disse nada? _ eu perguntei.
– Achei que ele estava afim de você. Não pensei que fosse um plano macabro. Além disso, eu jamais conseguiria desfazer aquele feitiço, era magia negra e eu teria que saber exatamente o que tinha no feitiço para criar um antidoto. _ ele disse.
– Você poderia no mínimo ter me contado. Eu beijei aquele nojento. _ eu fiz uma cara de nojo.
Ele riu um pouco da minha careta.
– Você não teria acreditado. _ ele disse por fim.
– Como você fez aquilo na casa da Karina? _ eu perguntei.
– O quê? _ ele perguntou se fazendo de desentendido. Mas eu sabia que ele se lembrava.
Revirei os olhos.
– Foi como se por alguns instantes você tivesse me libertado do feitiço de Rodrigo. Parecia que você e eu estávamos em uma bolha. _ eu tentei explicar.
– Não vou te contar. _ ele disse.
– Por que não? Eu sou de confiança, sabia? _ eu disse fingindo magoa.
– Não é não! _ ele disse e sorriu.
– Tudo bem. Eu não queria saber mesmo! _ eu disse.
– Queria sim! _ ele disse.
– Idiota! _ eu disse e revirei os olhos.
Pedro e eu conversamos durante um tempo. Contei sobre os treinamentos de artes marciais, equilíbrio, força e velocidade.
Pedro também me deixou por dentro de muita coisa. Ele me contou sobre a volta da Alicia falsa e o livro Sombras do Passado que ela havia trazido. Logo chegamos á conclusão de que o livro era falso assim como ela. Ele também contou que no dia anterior, pela manhã, minha irmã disse que havia descoberto que teria uma irmã gêmea do mal e, que seu nome era Alexia. Ela disse também que era preciso matar Alexia, que neste caso seria eu.
Eu havia subestimado Alexia. Ela havia descoberto que eu estava viva e já estava planejando, novamente, minha morte. Ela havia matado minha mãe e aquela dor estava rasgando meu peito. Além de tudo, ela colocou todos contra mim, fazendo com que eles pensassem que eu sou Alexia.
– Seria mais fácil se Alexia não existisse! _ eu disse enquanto meus olhos se enchiam d’água _ Talvez eu não tivesse perdido minha mãe!
– Eu discordo! _ ele disse.
– Como é? _ eu perguntei.
– Se Alexia não existisse a amaldiçoada seria você. _ ele disse.
Claro. Há essa altura do campeonato não sei se conseguiria ver o lado bom da vida.
– Eu perdi minha mãe. _ eu disse encarando o chão. _ meus amigos não confiam em mim. Acha que eles vão acreditar que eu sou Alicia? Eu devia deixa-los morrer nas mãos de Alexia.
Devia ter me arrependido do que disse, mas não conseguia. Estava com raiva e magoada.
– Ei! _ Pedro disse me fazendo olha-lo. _ não pode desistir agora. A vida é difícil assim mesmo. Sua mãe morreu, mas muitas outras pessoas estão vivas e estão correndo perigo.
– Isso não é problema meu. Por que eu tenho que salva-los? _ eu perguntei. Algumas lágrimas escorriam pelo meu rosto.
– A vida deles não é problema seu, mas a de sua mãe era e mesmo assim você não conseguiu salva-la. Você pode ajudar a evitar que outras pessoas sinta essa mesma dor que você está sentindo pela perda de sua mãe. Talvez ela tenha morrido justamente por existir muitas pessoas nesse mundo que também pensam que não tem nada a ver com os problemas alheios. _ ele disse. _ seja diferente, Alicia. Você não pode pagar todo mundo na mesma moeda.
É claro que depois dessa lição sobre a realidade da vida meus olhos transbordaram de vez. Ele tinha razão, eu estava sendo egoísta. Mas como não ser diante de uma situação dessas? Meu choro aumentou e comecei a soluçar baixinho. Meu peito parecia que iria explodir de tanta dor.
Pedro, que estava sentado logo á minha frente, se levantou, andou até mim e se sentou ao meu lado. Puxou minha cabeça para que eu me encostasse-se a seu peito, passando uma mão pelo meu cabelo enquanto a outra me abraçava. Eu não esperava que ele fizesse isso e estava com vontade de perguntar o porquê, mas minha dor falou mais alto e eu apenas aceitei seu apoio e chorei em seu peito.
– Me desculpe, não devia ter falado assim com você! _ ele disse enquanto acariciava meu cabelo. _ sei que você está sofrendo.
– Não! Você estava certo. _ consegui dizer entre os soluços. _ eu estou sendo egoísta, eu sei. Estou tentando ser forte, Pedro. Eu até estava conseguindo, mas depois de ver minha mãe naquele quarto… Não consigo! Está tão difícil! _ eu disse fungando e chorando mais.
– Você ainda tem seu pai, ainda tem pessoas que te amam e que você pode contar. _ ele levantou minha cabeça para que eu o encarasse e secou minhas lágrimas com os polegares _ e se você quiser, também poderá contar comigo.
– Espero que você não esteja me pedindo para confiar em você! Por que isso também será difícil!_ eu disse.
– Não, não estou. Estou dizendo que posso ajudar você. Nós dois queremos a mesma coisa, quero dizer, tirando a parte em que eu quero salvar os mestiços enquanto você está mais interessada em se vingar de Alexia e Rodrigo.
– Quer dizer tipo uma parceria? _ eu disse já conseguindo sessar meu choro.
– Isso. O que você acha? Parceiros? _ ele estendeu sua mão para que eu apertasse.
Pensei por um instante enquanto encarava sua mão á minha frente.
– Parceiros! _ eu disse enquanto apertávamos as mãos.
E foi assim que começou uma parceria inusitada entre eu e o garoto que sempre esteve louco para me matar. Seria ironia do destino? Talvez. Mas pensando bem, acho que não acredito mais no destino.