Sagrado Coração – Capítulo 06
Escrito por: Marcelo Jr Maia e Silva
Supervisão de texto: Domingos. Santiago
Sagrado Coração
CAPÍTULO 6
CENA 1 – HOSPITAL – QUARTO – MANHÃ
Gabriel agradece o abraço recebido e observa da janela do quarto as árvores que ficam na praça ao lado do hospital. Senta na cadeira ao lado de Alexandre a convite dele.
ALEXANDRE: Deve ser tão difícil perder a mãe de forma tão brutal… – observa Gabriel com um olhar piedoso. – Eu sinto muito.
GABRIEL: Obrigado. – encosta sua mãe direita sobre o ombro esquerdo de Alexandre que está encostado na cabeceira da cama e apoiado por travesseiros – Você também está enfrentando uma barra…
ALEXANDRE: Eu sobrevivo – interrompe-o. – Estou acostumado e não vai ser um cancerzinho que vai me derrubar – tenta rir da situação.
Gabriel tenta ser polido e evita o sorriso largo da brincadeira do amigo com medo de ser interpretado como uma zombaria da situação. Fitou o olhar e foi discreto no sorriso tirando a mão do ombro dele e as apoiando sobre as próprias coxas.
ALEXANDRE: Não precisa ficar sem graça não. Eu que resolvi brincar com coisas sérias – mudou de assunto ao perceber que ele ainda continuava sem graça. – Alguma pista seobre os responsáveis pelo acidente?
GABRIEL: Que nada, Alexandre. A polícia parece estar fazendo pouco caso com a morte da minha mãe. Certamente foi um crime com dolo e o motorista saiu em disparada sem prestar socorro. – levou o olhar para Alexandre, – você viu. Não vou descansar, não. Quem quer que tenha feito isso precisa pagar – apertou as duas mãos apoiada sobre a coxa direita, observando o chão do quarto. – É muito difícil perder alguém que você tanto ama… Que cuidou de você… Que fez parte dos piores – soltou um leve sorriso como quem está lembrando de algo – E dos melhores também.
ALEXANDRE: Ela deve ter sido muito bacana mesmo.
GABRIEL: A melhor mãe… – parou e olhou para ele com um sorriso espontâneo – Os filhos sempre vão dizer que sua mãe é a melhor, mas eu garanto que a minha é. – solta um largo sorriso que Alexandre o acompanha. – Ele sempre fui muito batalhadora e me orgulho disso.
ALEXANDRE: Mas você deve ter sido um ótimo filho também.
GABRIEL: Tirando minha teimosia… Sim!
Os dois riem.
ALEXANDRE: Só você mesmo pra me fazer rir nesta altura da minha vida mesmo vivendo isso. – retira o sorriso do rosto. – Acho que é o fim.
GABRIEL: Engraçado… – soltou um sorriso tentando tirar o rosto de tensão de Alexandre. – Não parece a pessoa que disse que um “cancerzinho não vai me derrubar”.
ALEXANDRE: Você tem razão. Acho que sou bipolar ou fico me iludindo achando que sou forte.
GABRIEL: Ei… – pôs a mão sobre o antebraço esquerdo de Alexandre e forçou que ele prestasse atenção às suas palavras. – Você está errado, totalmente errado. Precisa se dar uma oportunidade de continuar vivendo. Não é o fim Alexandre. Pode ser um recomeço, não?
ALEXANDRE: Quem está por fora acha que tudo é muito fácil de lidar, é só fazer umas sessões de quimioterapia e pronto, o câncer está vencido. É fácil, muito fácil dizer isso. – para um instante e observa que Gabriel o escuta com atenção. Se retrata – Me desculpa estar te amolando com esta conversa chata de doente terminal – dá um grande suspiro e muda o assunto. – Mas me fala… O que você faz da vida?
GABRIEL: Você está errado, mas não vou insistir numa conversa que você não está a fim de falar. – muda o tom de voz – Bem, eu faço teatro. Na verdade, estou terminando artes cênicas ainda este ano…
ALEXANDRE: Que legal!
GABRIEL: Aham. Amo fazer isso. Se dedicar a um trabalho, a algo me deixa cada dia mais forte, entende? Falo forte no sentido de encarar tantas coisas ruins que eu e minha mãe passamos. O quanto ela se esforçou pra conseguir que eu fizesse a faculdade não tá no gibi.
Alexandre solta um sorriso e por um breve instante faz uma reflexão sobre sua vida. A faculdade que consegue fazer sem sacrifícios já que conta com a ajuda dos pais. Apesar de não terem um padrão de vida de classes A ou B, sempre teve conforto em tudo que se envolve graças ao empenho dos pais em oferecer o melhor para ele e os irmãos. Gabriel percebeu que sua história tinha alterado o humor de Alexandre.
GABRIEL: E você faz o quê?
ALEXANDRE: Meus pais fizeram todo o sacrifício sozinhos, admito. Eu curso ADM… Já deveria estar no quarto período, também admito isso – coça as sobrancelhas direita com a mesma mão do lado do corpo – Eu que falhei com eles nisso e percebo agora.
GABRIEL: Como te disse, né? Eu também dei trabalho à minha mãe e nem por isso me culpo. Percebi que estava errando com ela e consertei os rumos da minha vida. Agora posso dizer que ela sentia orgulho de mim.
Gabriel olhou a hora e percebeu que faltavam poucos minutos para um dos ensaios da sua nova peça.
GABRIEL: Eu preciso ir. Tenho que estar no teatro em 15 minutos…
ALEXANDRE: Poxa, desculpa se atrapalhei algo…
GABRIEL: Claro que não. É nesse teatro aqui depois da praça – Alexandre demonstra um olhar de quem não sabe a qual teatro ele se refere. – Esse aqui da Rua do Oscar – ele continuava perdido mesmo com as novas referências dadas. – Bem, acho difícil você saber já que não deve frequentar estes lugares. Mas é tão perto que com meus passos largos, chego em cinco minutos.
Alexandre sorri despreocupado.
ALEXANDRE: Obrigado pela conversa.
GABRIEL: Ah, obrigado também por me ouvir. Acho que nos dois estamos carentes de atenção neste momento. – levanta da cadeira e estende a mão para Alexandre. – Tenho ensaio aqui de segunda a quarta e se você ainda estiver por aqui posso passar. Quer dizer, posso passar, né?
ALEXANDRE: Claro. Quer anotar meu telefone?
Gabriel consente e pega o seu aparelho para anotar os números que são verbalizados e confirmados por Alexandre para evitar erro. Despedem-se.
CENA 2 – CASA DE BRANCA – QUARTO – MANHÃ
Branca anda impaciente no quarto enquanto conversa com a filha do outro lado do telefone.
BRANCA: Eu estou em cólicas aqui filha… Sim! Já vi a notícia do jornal. Claro que eu fiz tudo direito pra não deixar nenhum rastro. Não tem polícia nenhuma neste mundo que pode descobrir. Mas que aquela Antônia teve o fim que mereceu, sim, ela teve. Claro que não filha! Eu não posso simplesmente chegar e reivindicar uma fortuna sem os aparatos legais. Se o Berg resolveu dividir com aquelas duas peruas a fortuna não tem nada que eu possa fazer a não ser tirar elas do meu caminho. Com calma, e agora que eu já dei um fim na Antônia, só tem a Sandra no meu caminho e ela não pode esperar o que planejo para ela. Eu não vou falar essas coisas por telefone, não é Bárbara. Você vem aqui que horas? Está bem, te espero.
Branca tranca-se no banheiro. Observa sua imagem reproduzida no enorme espelho do ambiente. Leva a mão ao rosto e faz movimento esticando a pele do canto dos olhos certificando-se que as rugas não estão aparentes. Toma uma ducha. Sai do banheiro e escolhe uma das roupas do imenso closet do quarto. A empregada interrompe a escolha da roupa com uma batida na porta e entra após a autorização da patroa.
EMPREGADA: Dona Branca, a dona Bárbara já chegou.
BRANCA: E por que não mandou ela subir? – falou irritada sem tirar os olhos de um dos vestidos que parecia ser o escolhido.
A empregada se retira. Minutos depois Bárbara entra e cumprimenta a mãe com um beijo no rosto.
BÁRBARA: Mãe, que loucura você está inventando dessa vez. Olhe, quando você está determinada a fazer uma coisa não tem que tire esta ideia da sua cabeça…
Branca pede ajuda da filha para puxar o zíper do vestido. Bárbara atende prontamente enquanto analisa o vestido branco em tons verdes que a mãe escolheu.
BÁRBARA: Me conta o que você pretende fazer para enfim lucrar com este teu envolvimento com o Berg?
BRANCA: Eu te asseguro que eu fui a mulher que mais amou aquele homem e olha o que ele faz comigo, filha. A Antônia só pagava de santa e a Sandra não é nenhuma flor que se cheire. O Berg nunca levou em consideração que eu aguentava as crises do casamento dele com a Antônia. Quem aturava aquele mau humor depois de uma das brigas que ele tinha com ela era eu. E ainda suportei calada quando ele começou a se envolver com a Sandra. O que a Antônia fez quando descobriu o caso dele com Sandra? – indaga enquanto calça o pé direito com o sapato num tom de verde bem escuro e com 12 centímetros de salto – Rechaçou ele. Expulsou de casa. E a Sandra quis acolher ele? Não. – termina de calçar o pé esquerdo e levanta. – Ela deu foi um pé na bunda. Agora aquele imbecil, e que o diabo o tenha bem nas profundezas do inferno, faz comigo, Bárbara… Me coloca numa briga com aquelas duas mesmo depois da morte.
BÁRBARA: Mãezinha, não há dúvidas de que você é merecedora desses bilhões. Mas achei arriscado se livrar da Antônia… Assim, eu achei muito arriscado…
BRANCA: Não são os dez mil que ele me paga de pensão não, Bárbara. São bilhões. Já imaginou bilhões passando por sua mão e escorrendo pro lado das suas inimigas? Me livrei da Antônia e a Sandra que se prepare porque a vez dela está bem próxima…
BÁRBARA: Mas me conta o que você vai fazer pra tirar a Sandra do caminho?
Bárbara segue a mãe até o banheiro e a observa se maquiar enquanto conversam.
BRANCA: Uma bomba! – fala friamente enquanto passa o rímel nos olhos. – Imaginou aquela vadia se despedaçando inteira? Cada pedaço daquela maldita voando pelos ares? – completa enquanto faz o retorque no batom.
BÁRBARA: É complicado, não? Sei lá. – demonstra um pouco de espanto. – Implantar uma bomba assim em plena disputa judicial por uma herança. Pode pesar pra você.
BRANCA: Filha, claro que podem suspeitar de mim, mas estarei bilionária, meu amor. Terei dinheiro e não sou uma tola que não sabe fazer um serviço direito. Já tenho tudo planejado. Vou esperar um pouco até baixar a poeira dessa história da Antônia e coloco meu segundo plano em ação – deixa escapar um sorriso maquiavélico.
CENA 3 – SHOPPING – PRAÇA DE ALIMENTAÇÃO – TARDE
Carol finaliza o pedido e vai de encontro a Deyse que já está sentada na mesa aguardando a amiga. Põe a bandeja sobre a mesa e bufa assim que senta.
CAROL: Ai amiga, estou perdida! Não paro de pensar sobre o que o Douglas me falou. É muito estranho um cara como ele se apaixonar por mim…
DEYSE: Não é estranho, é clichê. Você, a gata borralheira e ele o príncipe encantado. Que mal tem nisso? É tão fora de moda pensar que um garoto rico não pode se apaixonar pela empregada, pela pobretona. E você não é nem pobre…
CAROL: Não é isso Deyse. É de achar isso muito precipitado. A mãe dele é uma bruxa e me olha, aliás – dá um gole no refrigerante – a todas nós com muito desdém. Imaginas se ela descobre que o filho foi logo se apaixonar pela… Pela…
DEYSE: Pela Carol! – é enfática. – Viu que é você quem está sendo tão preconceituosa quanto ela? Você está gostando dele ou não?
CAROL: Demais. Por isso estou com medo. Quando estou com ele sinto as pernas bambearem, o coração começa a bater num ritmo tão acelerado que às vezes preciso respirar fundo pra ele não perceber o quanto estou nervosa. É uma sensação de euforia, uma vontade de me entregar totalmente, mas no sentido de me sentir protegida. Não tem um minuto do meu dia que não pense nele, que não suspire imaginando os seus beijos, aqueles lábios perfeitos, sua barba, além de todo o seu charme que me deixa encantada.
DEYSE: E qual o medo?
CAROL: De ser infantil e em algum momento perceber que não serei correspondida por tudo isso.
DEYSE: Mas ele parece querer algo sério, não é? – enrola o macarrão no garfo e aguarda a resposta da amiga antes de levá-lo à boca.
CAROL: Parece, não tenho certeza…
DEYSE: Talvez você possa se certificar disso agora – e aponta Douglas que vem em direção delas.
Carol vira-se e tenta disfarçar o sorriso, mas não consegue esconder a felicidade assim que Douglas se aproxima e eles se beijam. Ele cumprimenta Deyse que o convida para sentar.
DOUGLAS: Que bom que encontrei vocês. Passei na loja e me disseram que foram almoçar. Fui na outra praça e fiquei procurando feito um tonto – ri da situação.
DEYSE: A gente passou por lá e estava superlotada. Aqui é mais distante, então o pessoal fica meio preguiçoso em andar isso tudo – faz referência ao longo corredor que liga a praça ao restante do Shopping enquanto come o último camarão do prato. – Vou precisar passar numa loja pra ver uma roupinha pro meu bebê, então fiquem à vontade.
Deyse pisca em direção a Carol e levanta-se. Retira a bandeja com seu prato e os deixa sozinhos. Carol observa Douglas e solta um leve sorriso sem graça.
DOUGLAS: O que foi amor? – puxa a cadeira para bem próximo dela e deixa os corpos encostados.
CAROL: Estou te amando! – fala impetuosamente e desvia o olhar evitando a reação do namorado.
DOUGLAS: Também te amo – puxa o rosto dela suavemente para seu lado e a beija carinhosamente.
CAROL: Você me ama quanto?
DOUGLAS: Não estou entendendo. Existe isso? – confuso. – Numa escala de 0 a 10, acho que te amo umas 100 vezes mais que dez.
Carol solta um largo sorriso e encosta sua cabeça no ombro dele.
CENA 4 – HOSPITAL – QUARTO – FINAL DE TARDE
Ivo acena do outro lado da porta pela parte de vidro para Alexandre que solta um largo sorriso assim que vê o amigo. Ivo entra e cumprimenta o amigo com um longo abraço. Puxa a cadeira e fica bem próximo do lado direito da cama, ao lado esquerdo de Alexandre que ainda está com o cateter nas veias e com uma bolsa de soro pela metade.
IVO: Que susto que você me deu! Não se faz essas coisas com os amigos não, Alê.
Alexandre solta o sorriso e aponta para os braços que estavam com alguns hematomas devido às furadas até encontrar uma veia que permitisse a injeção dos medicamentos no organismo.
ALEXANDRE: E você acha que eu queria isso pra mim? Olha o que fizeram comigo. Se a água do organismo não tivesse bem distribuída na matéria eu estaria jorrando água por cada um desses furos.
IVO: Eu acho que estes remédios devem ter uns cem miligramas de drama…
Os dois riem com o comentário de Ivo.
IVO: Sério. Na faz mais isto pelo amor de Deus! – observa novamente os hematomas e olha para o rosto pálido do amigo. – Tirando a brincadeira, você sabe que não te deixo de maneira alguma. Você é assim… Um amigo que… – pigarreia para disfarçar a voz que começou a ficar embargada.
ALEXANDRE: Pode chorar amigo. Eu fiz isso o dia todo. Todo mundo que veio aqui fez isso.
Ivo não consegue controlar o choro após as palavras do amigo e o abraça. Alexandre tenta consolá-lo, mas permite que o abraço dure tempo suficiente para o amigo representar toda dor naquelas lágrimas. Ivo se afasta e enxuga as lágrimas com as mãos. Volta pra sua posição na cadeira.
IVO: Desculpa… Desculpa não me conter. Quando pensei que poderia te perder não consegui controlar a emoção.
ALEXANDRE: Fica tranquilo porque eu ainda tenho algum tempo pela frente e não vou cair com um cancerzinho de nada.
IVO: Mesmo que você esteja falando isso só da boca pra fora, ainda assim, você é muito forte.
Alexandre não consegue conter a emoção e chora copiosamente.
IVO: Amigo, eu sei que você tá querendo disfarçar a sua dor neste momento como sempre tentou por qualquer coisa. Não precisa fingir dizendo essas coisas porque no fundo você é muito forte. Uma das pessoas mais fortes que eu conheço.
Alexandre tenta enxugar as lágrimas, mas elas vêm em abundância e utiliza uma toalha de papel para enxugar o rosto encharcado.
ALEXANDRE: Eu aqui tentando manter a pose e você vem acabar comigo desse jeito. Derrubar este “Alê durão” que finge que não é atingido por nada – continua a passar a tolha sobre o rosto.
IVO: Mas você não precisa bancar o durão porque te conheço e te digo Alê: você é o cara mais forte e corajoso que eu conheço. É sério – reafirma após um sorriso de descrédito do amigo. – Não vejo outra pessoa lidando com o que você passa de forma tão madura e firme.
Os dois soltam um sorriso e Ivo fica mais aliviado por perceber que o amigo conseguiu considerar as suas ponderações.
IVO: Mas me conta. Eu soube que você recebeu muitas visitas hoje.
ALEXANDRE: Sim. Muita gente mesmo. Num momento desses é que a gente percebe quem realmente se importa. Ao mesmo tempo – continua num tom melancólico – é difícil imaginar que de alguma forma estas pessoas vão me julgar em algum momento por eu ser gay. É ruim esconder uma coisa assim e só penso em me livrar desse fardo, desse peso. E o câncer veio acrescentar mais um. Sei lá Ivo, não sei se suporto. Se suporto ser tratado com indiferença ou a todo tempo ser julgado por aquilo que você não escolheu ser. Eu sou diferente…
IVO: Temos diferenças, mas não deixamos de ser semelhantes, Alê. Não tem na testa de ninguém: “sou hétero” ou “sou gay” ou “sou administrador”, “sou economista”. Posso fazer uma lista de qualidades e defeitos seus, mas isso não está relacionado ao fato da sua sexualidade. Para de paranoias quanto a isso.
ALEXANDRE: Ah Ivo, você é uma pessoa cabeça que consegue enxergar fora da caixa. Vê o Roberto… Ele é um cara muito antiquado e só é dois anos mais velho que eu. Parece que foi vive no século passado. Não sei se a minha família é capaz de aceitar isso, o fato de eu ser diferente…
MARTA: Oi filho, oi Ivo! – Marta entra repentinamente no quarto e se aproxima dando um beijo na testa de Alexandre. – Diferente de quê filho? O que você é diferente do seu irmão?
Ivo e Alexandre se entreolham e demonstram um olhar tenso diante do questionamento de Marta.
ALEXANDRE: Ah Ivo, você é uma pessoa cabeça que consegue enxergar fora da caixa, vai ver meu irmão, ele é um cara muito antiquado e só é dois anos mais velho que eu. Parece que foi vive no século passado. Não sei se a minha família é capaz de aceitar isso, o fato de eu ser diferente…
MARTA: Oi filho, oi Ivo! – Marta se aproxima e dá um beijo na testa de Alexandre. – Diferente de quê filho? O que você é diferente do seu irmão?
Ivo e Alexandre se entreolham e demonstram um olhar tenso diante do questionamento de Marta.
Ivo reage ao questionamento de Marta.
IVO: Esse seu filho dona Marta que agora inventou de achar que é diferente só porque descobriu que está com câncer.
MARTA: Você é especial filho. Não porque tem essa doença aí, mas porque é meu filho e te amo. Amo demais, inclusive.
Alexandre respira aliviado e mira o olhar para Ivo que prossegue.
IVO: Esse garoto é o mais forte que eu conheço e ele não acredita nisso.
Marta observa em pé, no lado do pé da cama, ficando totalmente de frente para ele. Seu olhar de compaixão faz Alexandre ficar mais apreensivo e tentar desviar o assunto.
ALEXANDRE: E como está lá na faculdade?
IVO: Aquele pessoal não tem jeito. Mas estamos tocando a vida e muitos deles mandaram um abraço pra você.
ALEXANDRE: Não acredito.
IVO: Acredite sim. A compaixão tem o poder de transformar as pessoas.
ALEXANDRE: Não gosto que sintam pena de mim. Odeio isso – responde irritado.
IVO: Mas compaixão é diferente de pena, amigo. Compaixão é o desejo de que sua dor diminua. É como ser parte e demonstrar que estamos juntos pra vencer isso. Você entende o significado e de onde ela vem.
ALEXANDRE: Etimologias não ajudam muito agora…
IVO: Deixa de ser chato, né!
ALEXANDRE: Desculpa Ivo. Eu não estou bem.
Marta toca os pés de Alexandre que estão cobertos pelo cobertor e acaricia-o.
MARTA: Meu amor, sempre vamos torcer para o melhor para você. Você não precisa ficar radiando de felicidades porque entendemos a seriedade da sua doença, mas não precisa agir com grosserias com quem te quer bem.
Alexandre olha para a mãe brevemente reprovando sua repreensão naquele instante. Torna a olhar para Ivo e desabafa.
ALEXANDRE: Não sei se terei coragem em enfrentar esta doença até o fim, mesmo com o apoio de vocês. Sei lá quantas vezes vou passar mal com a quantidade de drogas que vão injetar no meu corpo, se vou aguentar encarar o olhar piedoso do pessoal da faculdade. Não gosto de piedade e não admito a possibilidade de aceitar isso com tranquilidade. Ainda tenho que viver com a possibilidade de a doença ser mais forte que eu e vencer ao final.
IVO: A primeira possibilidade de quem entra numa batalha é a vitória.
ALEXANDRE: Mas há a hipótese da perda… – suspira e inclina a cabeça para trás demonstrando cansaço. – Estou cansado de cogitar essas possibilidades. Nunca imaginei chegar a este ponto na minha vida. Tenho 21 anos e quantas coisas legais eu fiz? Bebi, curtir, mas e o legado? Vou morrer sem construir nada, sequer um sonho.j
IVO: Primeiro, que ninguém decretou sua morte. E os legados não são apenas materiais, Alê. Há mais legados ideológicos porque eles resistem ao tempo. Aristóteles, Platão, Freud, Newton deixaram suas marcas sem precisar de uma pá de cimento ou um bloco de pedra. Há outros legados que são lembrados por menos pessoas, porque estão no nosso dia a dia. Lembra de um dos nossos professores de filosofia? Aquele do ensino médio que contou um pouco da história dele e fez com que a gente resolvesse se interessar pelos estudos? O nome dele pode não ser lembrado nos livros, nas exposições, nas teses de mestrado ou sei lá o quê… Mas parece que ele deixou uma lição pra gente e talvez o legado dele tenha sido esse. E quantas pessoas ele pode ter ajudado com o exemplo de vida dele? E sim, você está pegando seus soldados e desestimulando eles a irem pra guerra. Eu confio em você, sua mãe, seu pai, seus irmãos confiam. Só falta você acreditar em si mesmo e batalhar pela sua vida.
Alexandre ouve as palavras do amigo em silêncio absoluto, desviando poucas vezes o olhar. Por fim, inspira e fecha os olhos quase vencidos pelo cansaço.
ALEXANDRE: Estou morto. O dia todo com este troca-troca de remédio, o monte de visitas que recebi acabou enchendo minha cabeça. Estou exausto. Preciso dormir um pouco e organizar as ideias.
Ivo levanta e cumprimenta o amigo com um aperto de mão. Despede-se de Marta que senta na cadeira do lado da cama e ajusta os travesseiros para que o filho fique bem apoiado.
Cena 5 – Casa Sandra – Manhã.- Sala.
Sandra sentada na mesa preocupada e sussurrando, entra Guilherme .
Guilherme.- Mãe bom dia, o que houve?
Sandra – Preocupação meu filho.
Guilherme- É de ficar mesmo, vi ontem nas manchetes acharam o corpo da Antonia.
Sandra – Infelizmente ela está morta, pensando por uma lado é bom, menos uma no meu caminho.
Guilherme.- Não fale assim, se alguém ouvir isso você pode virar suspeita viu.
Sandra – Você tem razão.
Sandra fica pensativa e abaixa a cabeça.
Cena 6 – casa Carol / manhã / Cozinha.
Marta entrando na cozinha, triste e pensativa.
Roberto – Bom dia mãe.
Marta.- Bom dia.
Roberto – Me parte o coração ver você assim mãe.
Marta – Estou péssima. – abraça o filho e começa a chorar.
Roberto – Mãe, seja forte, pois é a família quem deve dar forças ao Ale.
Marta – Está difícil meu filho, impossível.
Roberto – Vamos ter fé.
Marta- Final de semana é a comemoração de Natal e meu filho no hospital eu estou péssima.
Roberto levanta e faz um comentário com a Marta e a mesma fica alegre sorri e comenta.
Marta – Obrigado pelo apoio meu filho, vamos sim fazer seu irmão feliz, vou conversar com q Cá. – Sorrindo.
Uma semana depois…