O grande caderno azul – III
III
Na oficina tentando apaziguar a minha irrequieta alma com os últimos acontecimentos de origens alcoólicas. Meio ressabiado, olho para os lados, temeroso de ter feito alguma besteira enquanto estava sob efeito maléfico dela. Apanhei os últimos cinco reais e coloco na porta-cedula. Seu Carlos, o borracheiro na labuta com um pneu que teima em não querer sair da calha. Uma cliente vem fechar um negocio, diz que amanhã trará o dinheiro. Vamos ter uma esperança. Se for da vontade do Senhor que seja bem-vinda. Seu Cardoso Puro passa com sua sacolinha de compra. “Serafitus” já começa enveredar pelos caminhos filosóficos-cristão, assunto que não sou muito chegado. E o affaire Deline me tira de tempo, não sei quando poderei solucionar esse problema que esta tirando o meu sossego.. Oh! Vida poeta! – mas tudo culpa tua que quer ser muito doido, acompanhar loucuras dos outros, querer ser o que não és. Então acaba te prejudicando com essas ressacas homéricas que te deixa prostrado, atrasando toda a tua existência. Vou ler Anatole France.
No quarto onde durmo, a leitura foi interrompida com a chegada de Zé Caraca que acompanhou-me até encerrar o expediente. -“Ei! Mamãe a senhora me dar um bombom?? – Pede Larissa. O silvo da panela de feijão, o cheiro forte de merda dos gatos, assim como no sofá de urina.
Começo da tarde – Minha infatigável cunhada fez a faxina aqui no quarto onde durmo, mesmo assim o fedor continua. Professor chega da rua com uma novidade, a morte de Reginaldo Ui-Ui, exímio passista da Flor do samba, o corpo está sendo velado na sede da Escola no bairro do desterro.Antenor curioso tenta puxar conversa:
– Quem é Reginaldo?
– Tu não conheces, ele é lá do Desterro – responde exasperada minha cunhada sem dar muita trela.
O velho Reginaldo Pátria Amada trabalhou como garçom numa boate que Pai Bamba teve na Zona. Uma triste e desagradável noticia, a pensão de Mama Grande não será mais paga expirou o prazo. Agora que o bicho vai pegar. Com a pensão e a aposentadoria a situação já era caótica, imagina agora. Larissa frita alguma coisa. Seu Jailson popularmente conhecido com Pé-de-Pato passa carregando uma sacola no ombro com seus passos pé-de-patoliano, meio trôpego pelo álcool rumo a sua residência que divide com Dona Rita Marley – são um casal que vivem se ameaçando com facas e porradas, mas no fundo se amam a maneira deles. O corpo continua na mesma malemolência de sempre. Sarinha e as colegas se preparam para uma viagem. termina a Sessão da Tarde. Clarinha me serve um chá com um bolo imaginário. Dormi um pouco, mas o resto da tarde fiquei deitado lendo “Historia Cômica” (que de cômica não tem nada) do mestre Anatole. O fedor forte que entranhou no meu corpo devido a uma urina de um gato no sofá.
Começo da noite – Venho para o terraço,lá dentro a mesma rotina sempre, minha cunhada braba gritando para os seus amados bichanos. Uma leve brisa que vem do mara – Antenor com o pote de farinha na mão. O Mestre Serralheiro Preguinho desempenando algumas barras na sua oficina na Praça das Sete palmeiras. Chega um amiguinho de Sara e uma amiguinha vem fazer companhia a ele. Antenor com sua sacola com a comida da cadela. O amiguinho presenteia uma sandália para a amiguinha. O casalzinho feliz se despede. Ela feliz entra com a sacola na mão. Bruce encabuloso late estranhando a menina.
– Chambinho – Grita minha cunhada.As vozes dos jogadores de dominó na casa de Seu Correia mais embaixo