INSÔNIA – Episódio 02: do passado a morte
Insônia: contos de horror e suspense
Série de
Gabriel Fonsêca
Escrita por
Gabriel Fonsêca
Segundo Episódio
Do passado a morte
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Ninguém nasce poliglota, até porque ninguém nasce falando, aprender é um exercício árduo e continuo, em algumas vezes as pessoas aprendem pelo mal já outras pelo bem, sofrer e sorrir é uma bipolaridade da aprendizagem e às vezes sofrer é até bom para evoluir. Convenhamos, ser esperto e ágil são coisas que aprendemos a todo instante, confirmo dizendo que em meias palavras consegui falar da aprendizagem, de sofrer e sorrir e com toda agilidade já vos digo, não há aprendizagem maior do que os detalhes da vida, pois eles farão de você uma grande pessoa, e não falo das condições físicas mas sim das intelectuais. Mudando da água para o vinho, a história que redigirei não serviu de nenhuma aprendizagem, se servisse estaria eu vivo.
Todos cometem erros a todo instante, alguns visíveis e que eu vejo e outros invisíveis, mas que as pessoas apontam, mas tem um erro que fica entre o visível e o invisível que é o pior, o erro que os outros apontam e que você tem certeza que não tem e isso se torna uma guerra, quem está errado, eu ou ele? Ele, refiro-me ao novo vizinho que vestia roupas pretas, usava um chapéu e que tinha uma cicatriz enorme no olho. Não tinha como não reparar em seu estereótipo de assassino confesso, sua vigia diária em minha pessoa deixou tudo visível. Depois de algumas semanas de convívio com vizinhos, descobre eu que o nome dele era Clinton, surpreendentemente o mesmo nome que havia eu recebido de minha querida mãe, descoberto eu também tinha que o homem me espionava a cada passo dado e que de longe notara seu sorriso debochado, provocador e até ameaçador.
Certa noite de calor estava eu com minha mulher deitado na cama, o vento da janela aberta fazia a cortina bater no ar e revelar Clinton a nos observar com uma xícara na mão, me levanto e ponho-me a fechar a cortina. A noite passa como um vento de tempestade, a manhã logo bate à porta. Como se é de meu costume procuro dar de comer ao meu cachorro antes de ir para o trabalho, Rex não era daqueles cachorros amargurados, chatos, que choram do início da manhã ao final da noite, Rex era um pedaço de alma que vagou na penumbra do planeta até me encontrar, somos quase pai e filho e nos entendemos como irmãos e ele me reconhece a metros. Naquela manhã tudo estava estranho, a começar pelos urubus que sobrevoavam a casa de meu vizinho, cheguei próximo à casinha de Rex e o chamei, mas não obtive resposta alguma, fui então até ele, suas afeições não eram das mais contagiosas, seus olhos estavam atentos como se alguém algum mal teria feito a ele. Meu vizinho despojado sobre a cerca com algumas meias palavras mostra-se ironicamente preocupado.
– O que houve com seu cachorro?
– Não sei… Deve ser alguma virose! – Respondo.
– Os animais sentem quando há algo de errado, esse “errado” refiro-me aos donos! – Diz Clinton com um tom arrogante.
– Pois então continuo a pensar na teoria da virose!
– É difícil aceitar quando temos um erro cometido. – Diz Clinton demonstrando certeza em meias palavras.
– Me desculpe, mas não tenho tempo para conversas paralelas. – Digo eu, dando as costas ao vizinho.
Resolvi cortar a conversa que em meu ponto de vista não teria mais lógica. Parti ao meu trabalho, por azar o tempo estava contra mim a chuva era intensa um grande vendaval me atormentava. O dia de trabalho foi como qualquer outro, porém a volta para casa me reservou uma grande e ruim surpresa, Rex não havia resistido. Minha mulher até o havia levado ao veterinário, mas nada pode ser feito resolvemos o enterrar em nosso quintal e assim estaria ele perto de nós mesmo estando morto. Com um dia iniciando com anomalias, a noite não poderia ser diferente.
Estávamos dormindo, mas barulhos que pareciam socos nas paredes se ouvia da casa do meu vizinho, a cada pausa um novo estrondo ao ponto de me fazer levantar e ir em direção à casa de Clinton. Em frente aquela casa sombria e de cor esverdeada, tocava eu a campainha, batia na porta, mas ninguém atendia, vi que os socos haviam cessados e dei as costas, uma fração de segundos fez a porta abrir-se sozinha sem medo resolvi adentrar aquela casa sem luz alguma. A cada passo dado uma nova sensação, posso afirmar que meu medo foi de zero a mil, a casa parecia estar vazia até que uma porta abriu-se. Seu vapor fantasmagórico faziam-me aproximar-se dela, meu coração saltitava, era estranho, era um medo que nunca havia sentido antes, cheguei próximo à porta com os olhos vendados pela escuridão que me abatia passei a mão na parede, não sei se por causa da chuva da manhã a parede estava úmida.
Num entrelace de toques, sinto que alguém ou algo por mim havia passado, foi à gota da água, o fim do fio da meada e resolvi voltar para minha casa. Chegando em casa, me deparo com Clinton e minha mulher conversando, levei Ágata à cozinha e ela me diz que o homem estava a sofrer um assalto, com o revolver na cara, mas que o assalto não ocorreu em sua casa. Ágata então insinuou que o que ouvimos foi algo criado em nosso subconsciente e que deveríamos parar de julgar as pessoas antes de as conhecê-las, como se não bastasse Ágata ainda diz que Clinton era uma boa pessoa.
Voltamos à sala, o maldito vizinho que parecia me provocar a cada palavra que saía de sua boca ainda sentado a cadeira estava. Não demora muito e ele vai para sua casa, voltamos ao nosso quarto, à noite mesmo estando em sua metade para mim já havia acabada, ainda bem que o outro dia era sábado e não precisava me preocupar em acordar cedo. A manhã de sábado logo chega, sinto a falta de Ágata e ouço sua fala, resolvo então ir até a janela e ela estava a dar conversa ao vizinho maldito. Eles riam histericamente e talvez ironicamente, Clinton me olhava de canto já Ágata nem percebia minha presença e nem suspeitara que eu estivesse a os observar. Quando ela entrou novamente a nossa casa resolvi tomar alguns minutos de seu tempo.
– Porque conversa tanto com aquele cara?
– Clinton, não seja ciumento! – Responde Ágata.
– Não são ciúmes, é cisma… Eu tenho certeza que ele esconde alguma coisa dentro daquela casa.
– Por quê?
– Na noite passada que estive em sua casa, algo me deixou com medo. – Digo eu.
– Você sentindo medo? – Pergunta Ágata.
– Eu não consegui ver nada porque a casa estava sem luz, mas eu senti a presença de alguém.
– Amor, isso é coisa fantasiada da sua cabeça. – Diz Ágata que dá as costas para mim.
Nunca discuti com minha mulher, nunca nos olhamos atravessado por motivos fúteis, mas isso estava começando a mudar não sei o motivo, mas sei que o novo vizinho tem uma porcentagem de culpa. Com a noite chegando uma horrível tempestade se aproximava, a luz acaba por faltar e sem nada para fazer vamos dormir. Ao meio da noite algo me deixa inquieto, breves arranhões nas paredes do quarto ao lado do nosso me fazem ficar com os olhos abertos como faróis, os arranhões cessaram mas algo parecia puxar minha coberta, eu puxava de volta e ela era novamente puxada, resolvi então me levantar e beber água.
Na cozinha dava para ver relâmpagos contínuos, alguns até mostravam as sombras de vultos negros. Os relâmpagos param e começam os trovões assombrosos, num desses ouço uma voz atordoante que falava em outra língua, pareciam chiados, essa voz vinha de trás parecia vir da parede, resolvi aproximar-me e colocar o ouvido. As palavras pararam de serem ouvidas, uma forte pancada me assusta e faz com que o copo de minha mão caia, tento ajuntar seus cacos e acabo por cortar meu dedo, ao me levantar a porta do banheiro se abre e movido pela curiosidade sigo até ela e quando vou fecha-la a luz retorna e campainha em um único som é tocada até estourar. Direciono-me até a porta a abro e o que vejo me deixa com repulsa, era Rex estirado em estado de decomposição, mas quem seria tão repugnante quanto aquela cena ao ponto de desenterrar meu cachorro e colocá-lo em minha porta?
No outro dia aquela cena macabra ainda não havia saído de minha cabeça, aliás, minha cabeça latejava como um segundo coração prestes a enfartar. Com muita dor em pleno domingo sai à procura de uma farmácia. Após comprar o remédio retorno para casa, o meu sexto sentido queria dizer que havia algo de errado acontecendo e ao adentrar a casa começo a escutar risos, subi as escadas e cheguei ao quarto, abri lentamente a porta e descubro, Ágata estava a me trair com meu vizinho Clinton.
– O que está acontecendo aqui?
– Clinton! – Diz Ágata espantada.
– Eu sabia que isso iria acontecer, esse desgraçado me paga! – Digo eu pulando em cima do vizinho.
Não foi uma briga qualquer, eu o acertava e ele me acertava novamente, quebramos quase todo quarto, e ao final da briga o que restava eram pedaços de móveis, hematomas e um sentimento horrível de traição. Ágata resolve por juntar seus trapos e sair de casa e como sempre desde minha infância fico eu sozinho, mas eu não sou de deixar barato e ele não iria entrar na minha casa, transar com mulher e ficar por isso mesmo, pensando assim peguei um machado e fui em direção à casa de Clinton. Ao invés de ser convencional e bater na porta, a arrebentei com o machado, fui logo chamando por seu nome e quebrando tudo, parecia que estava escondido, revirei toda a casa mas faltava um local, o porão onde adentrei.
O porão era gelado e escuro, estava pronto, se eu sentisse qualquer movimento brusco atacaria, com um golpe de covardia sou atingido e caio desmaiado. Com um olhar embaralhado e com uma dor na nuca começo acordar, a primeira coisa que sinto é minhas mãos amarradas, logo em seguida vejo Clinton.
– Quem é e o que quer você?
-Tu não me reconheces porque nunca tive a oportunidade de aparecer para você e os outros! – Diz o vizinho.
– O que dizes?
– Não lembras… Não lembras aquela noite em que você e seus amigos jogaram aquele jogo dos espíritos? – Pergunta Clinton.
– Porque essa pergunta agora?
– Deves lembrar-se da primeira pergunta… Se existia alguém lá presente… Pois existia… Eu! – Diz Clinton.
– Você é o que? – Pergunto assustado.
– Apenas um alguém que vai levar a sua alma para a profunda escuridão! – Diz Clinton com dois pequenos ratos em mãos.
– O que pensa em fazer com esses ratos? – Pergunto.
– Calma, só vai doer… Muito!
O demoníaco homem de roupas pretas com um rato se aproximou de minha boca, ordenou que eu a abrisse, mas continuei com ela fechada ele teve mais força e a abriu. Com a boca aberta o homem colocou o rato dentro, comecei a chorar e a tentar fazer com que o camundongo saísse, mas horrivelmente ele adentra minha garganta, começo a me afogar e o rato a caminhar. Sinto seus dentes roendo minha faringe até chegar a um pulmão, meus pés e mãos se contorcem demonstrando a forte dor interna, de meu nariz o sangue começa a escorrer, porém isso não serviu para saciar a sede por dor e sofrimento e ele coloca o segundo rato em minha boca. O segundo causa mais dor, pois ultrapassa o estomago e come uma parte do fígado. Um dos ratos consegue fazer um buraco na barriga e sai do meu corpo, não consigo resistir a profunda dor e morro.