Capítulo 67 – Filho Amado
Filho Amado.
Capítulo 67.
Noronha tenta fugir do assunto: Olha Éssio, eu tenho que ir jantar, e estou faminto! Outra hora conversamos sobr…
Éssio o interrompe: Não tente ir embora e nem fingir que não ficou surpreso, eu sei que você está esperando esse momento por toda a sua vida, e acho que eu já o devia ter feito bem antes, mas não tive consciência disso e enfim…
Noronha está ofegante: Enfim o quê…
Éssio respira fundo: Eu queria saber se você me perdoa por tudo o que eu te fiz- Diz, objetivamente.
Noronha pensa um pouco: Eu poderia dizer que sim mas estaria sendo muito mentiroso…Você acha mesmo que depois de tudo o que aconteceu irá conseguir o meu perdão apenas com essa frase? E quando eu digo TUDO é pra não abranger muito, porque nesse tal de TUDO contém um bocado de coisa. E coisas que são parte da minha vida! Vida essa que foi destruída várias vezes e reconstruída e depois destruída e reconstruída como que se um menino estivesse fazendo castelos de areia na beira do mar e viesse uma onda e destruísse sua obra e ele tentasse recomeçar novamente, até um dia em que vencesse a água…Percebe como são as coisas, Éssio? Nada é tão simples pra ser apagado com um pedido de perdão.
Éssio começa a chorar: Eu sei disso…E eu não pretendo que “apague” nada, mas cheguei em um momento da minha vida que está sendo muito crítico…Literalmente o meu castelo de areia foi destruído e parece que não vou tentar reergue-lo…A minha cabeça tá me perturbando, não consigo mais ficar sossegado enquanto eu não conquistar o seu mais sincero perdão.
Noronha, frio: E porquê isso agora? Se você sempre foi relaxado quanto ao assunto da minha rejeição… É dela que estamos falando, né? Do quanto eu fui humilh…
Éssio o interrompe: Humilhado. Eu sei. Eu sei mais do que tudo agora como você se sentiu, porque estou na mesma situação e acho que era esse o seu objetivo…Mas quando você me trancou aqui no porão eu comecei refletir e percebi o quanto eu fui cruel…Passou um filme na minha cabeça, e eu era um vilão muito mal. Eu ainda não entendi como eu consegui ver você sofrendo sem fazer nada…Eu ria, Noronha…E não era o velho clichê da mãe que ama mais um filho do que o outro. Era maldade. Eu fui cruel, malvado, desumano- As lágrimas começam a cair em sua calça, ele está sentado já que não pode se levantar, enquanto Noronha o observa em pé- Eu condizia com cada ato perverso, eu colaborava…E me pergunto agora: porquê? Só que eu tive a resposta…Foi o carinho excessivo que me tornou essa pessoa tão estupida…O amor que a mãe me deu demais. Eu nunca estava errado. Tudo o que eu fazia era esplêndido, correto. E você sabe que não é assim.
Noronha, querendo chorar: O amor que eu nunca tive…Engraçado…Você com tanto amor não está sendo feliz, e eu que não tive nenhum também não fui feliz…FOI ELA, ÉSSIO! A MAMÃE NOS TRANSFORMOU NISSO QUE SOMOS AGORA!
Éssio roga: Eu sei disso, e agora, depois de tudo eu preciso do seu perdão pra ter a minha consciência limpa. Eu garanto que mudei…Essa minha derrota atual me fez outra pessoa e por isso te imploro, por cada riso debochado que lhe dei, por cada pequena maldade pra mim que foi grande pra você…Pelas minhas ações de superioridade, por quando eu te feria e te diminuía na frente dos outros, eu imploro, me perdoa agora. Se você não perdoar eu não sei o que vai ser de mim…Perdoa de coração, vamos limpar toda a sujeira do nosso passado e agora é o momento!
Noronha se ajoelha: Pelo visto você mudou mesmo…
Éssio aperta a mão do irmão: Mudei, e muito. Não estou sendo falso, não quero te passar a perna porque eu mereço tudo o que tá acontecendo, eu não me orgulho do que eu fiz. Eu sinto nojo de mim. NOJO!- Grita, aos prantos- Por favor, eu não vou te desobedecer e nem nada, olha a minha condição…Só quero que você diga, olhando nos meus olhos, que está tudo limpo entre nós…
Noronha se senta ao seu lado: Você sabe que desde sempre eu te tratei como meu inimigo, nunca te vi como irmão, você mesmo já falou sobre tudo o que eu sofri, mas eu confesso que…Tudo o que eu queria naquela época era que a minha mãe me amasse…Amor de mãe não tem igual, receber um bom dia alegre, o sorriso, o beijo, os conselhos…E eu nunca tive isso…Talvez por isso eu sou assim, nunca soube administrar meus sentimentos, mas se tem uma coisa que eu sei é quando uma pessoa está mentindo…- Fica um silêncio por um tempo, os dois olhando pra frente- E você não está mentindo, Éssio…Eu…- Ele sorri- Eu te perdoo sim, entendi tudo o que você quis me dizer, e entendo de quem seja a culpa, portanto você tem o meu mais sincero perdão. Parece estranho vindo de uma pessoa como eu. Mas é isso…Perdoo você.
Éssio não resiste e abraça o irmão, que fica surpreso: AH OBRIGADO, MUITO OBRIGADO, NORONHA! EU JAMAIS VOU ME CANSAR DE TE PEDIR DESCULPAS! EU ACORDEI PRA VIDA, A VIDA REAL, E NÃO A QUE ERA GOVERNADA POR ANNA DÁVILA…
Noronha o abraça com toda a veracidade que poderia ser encontrada nele, os irmãos finalmente estavam em uma cena pura e pacifica, carregada de sentimentos do passado. que finalmente haviam sido resolvidos.
Noronha: É bom saber disso, Éssio, eu esperei a minha vida toda que um dia isso pudesse ser resolvido mas você também tem que me perdoar porque nada, absolutamente NADA, justifica meus atos. E eu me envergonho deles tanto quanto você. Eu tô tentando mostrar pra mamãe o meu poder, mas fiz isso desonestamente…Então eu sou tão errado quanto você. Eu agi por impulso, e aqui estamos nós agora…Por minha culpa, por sua culpa, pela culpa dela…Todo mundo tem culpa…
Éssio não consegue parar de chorar.
Anna escuta tudo atrás da porta, aos prantos: Isso não podia ter acontecido…Não, o meu Éssinho não deve perdão pra ninguém…NÃO DEVE!- Ela assoa o nariz, desolada com o que ouvira.
Noronha se levanta: Eu me sinto tão aliviado…Tudo preto-no-branco…Tô em paz, finalmente. Acho que essa conversa era tudo o que precisávamos ter pra conseguir fechar o maldito ciclo de ruína.
Éssio admite: Mas nós não tivemos por que eu era mimado…Mas aquele Éssio se foi junto com suas pernas, e o que restou de bom nele sou eu- Ele sorri.
Noronha abre um fraco sorriso: Bom, IRMÃO- Ele suspira- Acho que finalmente a alma do nosso pai pode descansar em paz…Vou providenciar pra que você saia daqui amanhã mesmo, e vamos iniciar o seu tratamento, você vai voltar a andar…
Éssio, preocupado: Mas e quanto a mamãe?
Noronha pensa um pouco: Depois decidiremos sobre ela…Coma, farei o mesmo e depois irei me deitar. Até amanhã, acho que pode esperar mais uma noite…
Éssio afirma com a cabeça e Noronha caminha rumo a saída, vagarosamente.
Éssio coloca a mão no coração: Finalmente…Eu me sinto bem.
Noronha faz o mesmo: O quanto angustiado eu estava por esses anos todos…E era apenas de uma conversa definitiva com o Éssio que eu precisava- Ele se emociona.
Logo, Noronha chega na cozinha onde todos jantam, Anna está servindo o suco, ainda muito chorosa.
Caio nota: Você tá chorando, papai?
Jasmine se levanta: Acho que já é hora de eu voltar pro porão…- Ela pega o prato, envergonhada, e vai saindo quando Noronha a para.
Noronha: Pode ficar aqui, Jasmine…Ema, arrume um quarto de hóspede pra ela mais tarde…
Jasmine fica surpresa: Nossa…Muito obrigado, Noronha.
Caio comenta: Que bom que eu pude ver a mamãe novamente!
Bruno ri: Como assim novamente?
Anna grita: BOM…Digo, Bom…Espero que tenham gostado do suco que eu preparei, só falta você tomar Noronha- Diz, furiosa ao olha-lo.
Noronha pega um copo e um prato, e se serve: Eu vou comer no meu quarto…Com licença- Ele sai, abatido.
Bruno nota: Nossa…O que será que aconteceu com ele?
Anna, furiosa: Ele conseguiu enlouquecer o Éssinho…
Ema: O que disse?
Anna suspira: Nada, alguém quer mais suco?- Fala, descaradamente lembrando-se do remédio que havia colocado.
Em seu quarto, Noronha fica pensativo na cama.
Noronha, triste: É uma pena que o papai não viveu pra ver a minha reconciliação, mas espero que fique feliz, da onde quer que esteja…- Ele começa a comer, e vai beber o suco quando desiste- Não confio em nada que ela faz- E o joga em uma planta.
Mansão de José do Gado/ Noite.
José está triste em seu quarto, quando Conceição chega aflita.
Conceição, tensa: Tem dois policiais querendo falar contigo, tão lá embaixo…
José, intrigado: Policiais? Será que eles descobriram…- Ele trata de se calar- Deixe me ver o que querem.
Na sala…
Adams conta: Sei que é tarde mas viemos colher o seu depoimento sobre um caso muito antigo, o da morte de Chico Branco.
José se espanta: Ora ora então resolveram mexer no caso! Pois bem, colocarei um casaco e irei agora mesmo.
Na delegacia…
José relata tudo para a delegada Mafalda: E depois que eu sai com a minha mulher e a minha filha, nunca mais o vi! Estava furioso na noite pois Aurora estava armando um noivado com um rapaz que apoiava o outro partido, Noronha, o assassino!
Mafalda o observa: Bem, ele mesmo mandou que reabríssemos o caso, mas de qualquer forma muito obrigado pelo depoimento, foi bem útil- Ela fica séria o tempo todo.
José se levanta: Disponha- E sai.
Casa de Noronha/ Noite.
Bruno e Ema terminam de lavar e secar a louça.
Bruno boceja: Nossa, ainda não são nem nove da noite e eu tô morrendo de sono.
Anna observa, está limpando o chão: Deve ser o suco de maracujá e seu efeito de calmante…- E ri.
Ema também boceja: Você ficou muito feliz com esse suco que fui eu quem fiz…Credo! Mas também tô muito sonolenta, vamos dormir, filho.
Helder palita os dentes: Eu também vou, acho que tinha remédio nesse seu suco…- Ele coloca a chave do carro no balcão, Anna olha fixamente.
Anna disfarça: Remédio? E onde eu ia comprar se nem posso sair daqui? Pense antes de falar, Pino de Boliche- Ofende.
Ema e a família saem: Vamos dormir que ganhamos mais, vai ficar aí Anna?
Anna, irritada: Se estou sentada na mesa é porque vou, que pergunta tola! Já irei dormir, não se preocupe que eu não vou tentar fugir…
Helder pega a chave do carro e pendura na calça: Vai saber…- Ele vai andando mas a chave novamente cai, para a alegria de Anna.
Ela espera todos saírem, pega a chave rapidamente, e a coloca no bolso: Agora só falta a do escritório…
Quarto do detetive Américo/ Noite.
Américo está zonzo, na cama: Eu preciso ir falar com o senhor Noronha- Ele boceja- Ah, que tont…- Ele acaba caindo no chão e dorme lá mesmo.
No corredor de baixo, Anna certifica-se que todos já foram dormir e acende uma vela, vira uma xícara ao contrário e cola a vela lá, depois sai andando pelos cômodos escuros até chegar no porão. Em silêncio, abre a porta e desce as escadas com a vela em mão. Éssio está dormindo sozinho, encolhido.
Anna coloca a vela perto do rosto: Coitado…Sofrendo tanto e ainda se humilha pedindo perdão a um nojento…Mas o sofrimento vai acabar essa noite- Promete- Acho que vou dar mais uma dose do remedinho pra garantir que ele não acorde- Ela abre a boca do filho e coloca mais alguns comprimidos, depois fecha e o induz a engolir.
Um pouco depois…
Anna está no corredor de cima, ela abre lentamente a porta do quarto de Noronha e percebe que ele está em sono profundo: Ótimo- Sussurra.
Ela vai até a gaveta dele e procura pelas chaves, tentando não fazer barulho nenhum, logo acaba achando todas, e se dá por satisfeita.
Quando vai saindo acaba tropeçando em um dos tapetes e escorrega, mas consegue se segurar no criado-mudo. Assustada, tapa a própria boca com uma mão, e com a outra permanece com a vela equilibrada.
Logo ela chega até a garagem, onde estão dois carros: Meu Deus, quando eu apertar vai fazer muito barulho…Mas acho que tinha remédio demais no suco, o suficiente pra todos os idiotas dessa casa dormirem por uma noite inteira!- Ela pega a chave e aperta no botão, o carro faz o barulho que costumava fazer, mas nada muito alto- Agora eu preciso pegar a cadeira de rodas e depois o Éssinho, a parte mais difícil…Depois vou no escritório tentar achar dinheiro ou algo do tipo…- Ela deixa a porta aberta e sai andando.
Mostra a imagem de todos da casa dormindo profundamente: Jasmine, Caio, Bruno, Helder, Ema, Éssio e Noronha, que se remexe um pouco.
Anna pega a cadeira de rodas que havia sido deixada em uma sala escura: Mas quanta poeira…- Ela pega um pano do avental e limpa um pouco, depois a carrega até a entrada do porão, sem tentar fazer qualquer tipo de ruído.
Depois, Anna vai até o porão e puxa o filho pela perna, mas ele nem ao menos dá sinal de vida, ela sofre com o peso de Éssio. Após muito tempo consegue coloca-lo na cadeira de rodas, ainda desacordado.
Anna o deixa lá, tranca o porão, vai até o escritório de Noronha e demora um pouco lá, mas depois sai com algum dinheiro e cartões de crédito em mãos: Acho que dá tempo de usa-los antes que Noronha acorde e os cancele- Sussurra- Quero ver qual vai ser a reação do idiota quando acordar e não nos ver mais aqui…Eu o venci…- Vibra.
Anna empurra a cadeira de rodas com o filho dormindo, fazendo leve barulho, ela para em frente a porta e observa a sala: Adeus, vida de lixo!- E sai, fechando a porta e indo em direção ao carro.
Instantes depois, ouve-se o barulho do carro andando lá fora.
Porém também se ouve os passos de uma pessoa descendo a escada: Quem tá usando o carro no meio da noite?- Ela desce, determinada a saber quem é.
Anna acelera com o carro e aperta o botão que faz o portão automático se abrir, Éssio está ao seu lado, ainda dormindo, e a cadeira de rodas havia sido guardada no grande porta-mala da 4×4 de Noronha: Faz tempo que não dirijo…Me ajude, Senhor!
Ela acaba pisando na ré ao invés do acelerador, e faz o carro bater.
Éssio acaba acordando, lentamente: Mãe…Onde estamos?
Anna gela.
Termina o capítulo 67.