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Cantiga de Amor

Capítulo 34 – Cantiga de Amor (O Reencontro)

Cena 01: Navio 2. Manhã.

Cecília – Eu preciso ser sincera. Gustavo, eu descobri que… Eu te amo. E eu não podia deixar de te falar isso.

Gustavo está paralisado.

Gustavo – Eu… Não… Sei o que te dizer… Eu… Preciso sair.

Ele se levanta e começa a sair.

Cecília – Gustavo, eu não quero te pedir, muito menos te obrigar a fazer nada. Eu sei que tu amas a outra mulher, mas eu não estava mais conseguindo reprimir esse amor. (Ela se vira e olha para cima) Eu só gostaria que tu pensasses no que eu te falei. (Se volta para ele) Não te esqueças de mim, por favor.

Gustavo – (Um pouco nervoso, inseguro) Eu confesso que estou surpreso com essa situação. Mas, por favor, me deixe sair. Tenho que ficar sozinho um pouco.

Gustavo sai. Cecília fica apreensiva.

Cena 02: Navio 1.

Gregório e Valentina conversam.

Gregório – Valentina, eu preciso te perguntar sobre uma coisa que vem me incomodando desde que nós embarcamos nesse navio. Na verdade, que vem povoando minhas noites… Será que tu…

Valentina – Oh, Deus… Sim… Então tu também tens sonhado de novo sonhos como aqueles?

Gregório – Pelo visto essa nossa ligação é bastante forte, porque sonhamos as mesmas coisas… Eu só não consegui entender o significado. Eu pensava que o sonho acabava ali, lembra? Quando conseguíamos nos livrar da sombra e cair no rio?

Valentina – Claro! Claro que me lembro. Mas parece que esse não era o fim.

– Flashback –

Sonho. Gregório e Valentina param em frente a um rio. Do outro lado, eles veem casas. Então, eles mergulham, sorrindo um ao outro. De repente, ouvem um barulho estranho, vindo do próprio rio. Olham ao redor, não vendo nada; decidem seguir, então. Até que, um pouco mais à frente, percebem uma mão fora da água. Alguém devia estar se afogando. Quando se aproximam, essa mão some, e reaparece atrás deles. A mão da suposta pessoa afogada começa, então, a recuar, sempre se debatendo como se pedisse ajuda.

– Fim do flashback –

Gregório – Mas o que significa isso, meu Deus? Quem seria essa pessoa?

Valentina – E por que ela estaria voltando para o lugar de antes?

Gregório – Acho que teremos que esperar mais. Deus há de nos mostrar o real significado.

Cena 03: Navio 1.

Pero está andando com Inês nas costas.

Pero – Ai, minha flor, tu és um pouquinho pesada, mas eu aguento tudo, se for para o teu bem!

Inês – Graças a Deus que posso contar com tua ajuda, camponês. Se não fosse tu e esse homem que aspira a se tornar ermitão, que eu conheci ainda no porto e que tem me ajudado a melhorar essa dor no pé, não sei o que seria de mim…

Pero – Só não entendo porque ainda não melhoraste, Inês.

Inês – (Passando a mão na cabeça dele) Ah, meu amor, o processo é longo… Bem longo…

Eles chegam a um pequeno compartimento do navio, onde o tal “ermitão” espera Inês.

Pero – Aqui está, meu caro. Minha Inês está sob os seus cuidados!

“Ermitão” – O senhor pode deixar, que com a graça de Deus, Inês estará em boas mãos.

Inês – Agora podes ir, Pero. Esse momento é exclusivo entre mim, esse homem e Deus.

Pero sai, sorrindo. No caminho se encontra com Valentina.

Valentina – Então Inês ainda não melhorou daquela queda simples que ela levou?

Pero – Pois é, Valentina. Mas ela está com um homem de Deus ali dentro. Logo, logo, eu tenho fé de que ela irá ficar boa.

Valentina – Amém.

Pero – Eu estou indo olhar o mar. Vens comigo?

Valentina – Obrigada pelo convite. Mas eu preciso… Eu lembrei que tenho que ir ao aposento em que durmo.

Pero – Tudo bem. Com sua licença.

Pero sai.

Valentina – Estranho essa demora toda em Inês se recuperar… Onde é esse lugar em que ela se encontra com o ermitão?

Valentina caminha pelo navio, até chegar ao lugar onde Inês está. Ela encosta o ouvido na porta. Começa a distinguir risadas. Ouve algumas frases um pouco incompletas.

“Ermitão” – Vamos… Esse pé… Hum… Beleza…

Inês – Bom… Cócegas, cócegas. Pare…

“Ermitão” – Não… Fazer… Até… Permitir… Beijo…

Valentina – (Boquiaberta) Beijo?

Ela continua ouvindo, até que eles param de falar. O som muda.

Valentina – Meu Deus, Pero precisa saber disso. Acho que eu devo isso a ele.

Cena 04: Navio 1. Popa.

Pero, Gregório e Agnella estão de pé, olhando para o mar.

Pero – Que belo mar estamos deixando para trás.

Gregório – Fico me perguntando: o que nos espera mais à frente?

Agnella – O amor… Gustavo…

Pero – Agnella, minha querida, ele está falando do resto. Será que estaremos em segurança?

Agnella – Eu sei que eu estarei. Ao lado de Gustavo…

Gregório – (Cochicha a Pero) Posso estar errado, mas esse desejo de Agnella me preocupa…

Pero consente com a cabeça. Valentina aparece.

Valentina – Pero, vem comigo, agora. É urgente.

Pero – O que houve? (Se alarma) É alguma coisa com minha Inês?

Valentina – Sim. Mas eu não sei como tu reagirás.

Pero – Oh, Valentina, não me assustes.

Valentina – Lembra que eu te disse que pagaria o favor que me fizeste? Por favor, não te enraiveças comigo. Tome isso como uma pequena retribuição.

Pero – Mas o que é que está acontecendo? Eu posso saber?

Valentina – Sim, mas eu prefiro que tu mesmo vejas.

Valentina puxa Pero pelo braço, que cede e vai com ela. Gregório e Agnella os seguem.

Cena 05: Interior do navio 1.

Valentina chega com Pero, Gregório e Agnella. Eles vêm em um silêncio forçado, para não chamarem a atenção. Param em frente à porta. Valentina a abre. Quando Pero entra, encontra Inês e o “ermitão” se beijando.

Pero – Meu Deus, o que é isso que eu estou vendo? É verdade isso, meu Deus?

Pegos de surpresa, Inês e o “ermitão” param de se beijar. Se viram para Pero.

Pero – (Com raiva, mas “respirando”) Inês, por que estavas beijando esse homem? Não devias estar melhorando essa tua dor no pé?

Inês – Tu… Tu entendeste errado, meu amor. Tu viste errado. Era… era…

“Ermitão” – Era uma maneira diferente de rezar. Era uma maneira… Compartilhada que eu aprendi com alguns ermitãos. Os discípulos de Jesus faziam isso!

Gregório – Me perdoe intrometer, Pero, mas isso é uma grande blasfêmia! Uma mentira! Não acredites no que esse homem diz!

Valentina – Eu falei que era importante, não falei? Tu precisavas ver isso.

Inês – Então foi tu, sua intrometida! Eu sabia que não eras de confiança! Olha, Pero, eu te falei que não podias acreditar nela, não podias ajudá-la! Ela prejudicou meu casamento com o Brás e agora quer me afastar de ti!

Pero – Não sejas tola, Inês! Eu vejo que não posso mesmo acreditar em ti!

Inês – Não, meu amor! Eu… Eu errei, mas só tenho olhos para ti…

Pero – Não me chames de amor! Nunca me amaste!

Enquanto eles discutem, Agnella vai saindo do lugar.

Agnella – Briguem sozinhos! Eu só quero olhar para a frente… Pensar no futuro…

Ela sai. A discussão continua.

Pero – Tu nunca me valorizaste, nunca reconheceste meu amor e minha entrega a ti! E depois que descobriste estar livre do crápula do Brás da Mata, vieste me propor casamento, e eu, iludido, aceitei, achando que me amavas. Como não percebi que querias apenas alguém com quem ficar teus dias, querias um homem que fosse burro o suficiente para te aceitar, e pra te sustentar também. Como diz mesmo o ditado? Mais vale um asno que te carregue do que um cavalo que te derrube, não é? Pois esse asno aqui está cansado de te levar nas costas! Fiques aí com esse ermitão fajuto, com essa perna que não está doendo coisa nenhuma, e não me procures mais!

Inês – Não, Pero! Não me deixes! Me perdoa!

Pero – Não sei como, Inês, mas eu te esquecerei. E faça o favor de fingir que não me conheces enquanto estivermos nesse navio.

Pero sai. Gregório e Valentina vão saindo.

Inês – E tu, Valentina, estás satisfeita, feliz, não estás? Agora tu tens como te ofertar a ele assim como fizeste com Brás, não é?

Valentina – Como és boba, garota. Boba e superficial. Tenho muito mais o que fazer do que ficar discutindo contigo. E eu só digo uma coisa: foi um grande feito para Pero se livrar de ti. Ele merece uma outra mulher que saiba valorizá-lo.

Inês – Você, então?

Gregório – Chega! Pare de falar essas besteiras! Vamos sair daqui, Valentina. Essa mulher já mentiu e nos insultou demais por hoje.

Eles saem. Quando dobram o corredor, Inês tenta se separar do “ermitão”.

Inês – Eu não posso permitir que Pero me esqueça. E eu ainda não dei a surra que essa noviça merece. Preciso ir. Foram bons esses dias, mas eu não posso deixá-lo escapar assim.

“Ermitão” – Não sairás não. Nossa sessão ainda não acabou.

O “ermitão” fecha a porta, prendendo Inês.

Cena 06: Barco.

Edetto, Izabella e Adelmo estão no barco que alugaram.

Edetto – E então, comandante? Será que conseguiremos chegar mais perto desse navio?

Comandante – Talvez, senhor. Mas teremos que dar muito mais de nós, e isso pode ser ruim. E se nos faltar para completar a viagem?

Izabella – Ele tem razão. Essa distância é segura para não perdermos o navio de vista.

Adelmo – E quando ele aportar, teremos tempo para alcançá-lo.

Edetto – Assim seja.

Cena 07: Igreja del Fiume.

O bispo Ricardo está na nave da igreja. Ottavio também está, porém rezando, ajoelhado em frente a várias velas. Simone e Leonor chegam.

Ricardo – Bom dia, senhoras.

Leonor – Bom dia, bispo. Viemos rezar pelas vidas dessas pessoas que estão em viagem.

Simone – Especialmente pelos meus filhos.

Ricardo – Claro, claro.

Leonor – Vamos, Simone. Olha, o senhor Ottavio está ali. Vamos até ele.

Elas se ajoelham ao lado de Ottavio. Leonor à direita, Simone à esquerda.

Leonor – Com licença. Estás rezando por teu filho, Ottavio?

Ottavio – Sim, sim. E as senhoras?

Simone – Também. Viemos acompanhar o senhor, se o senhor nos permite…

Eles começam a rezar. O bispo Ricardo vê duas pessoas chegando à igreja.

Ricardo – Padre! Irmã Francisca! Que bom vê-los de volta! E então? Onde estão os outros?

Cena 08: Navio 2.

Gustavo está caminhando pelas laterais do navio. Seu pensamento viaja pelo passado.

– Flashback –

Gustavo – És linda. Eu te amo muito. De verdade.

Agnella – Eu também te amo. Muito.

Agnella e Gustavo, no calor do momento, não resistem aos impulsos. Começam a se beijar, e, aos poucos, se rendem, amando-se ali mesmo, embaixo da frondosa árvore e à beira do rio.

– Fim do flashback –

Gustavo – O que está acontecendo comigo, meu Deus? Por que tudo isso?

– Flashback –

Cecília – Tua presença naquela casa me fez ver que a felicidade não depende da riqueza. A maneira como tu falas de teu avô me mostrou que tu és, sim, uma pessoa boa. Por tua causa, eu vi que os sentimentos precisam ser levados em conta também…

Gustavo – Que curioso… Já eu estava começando a me questionar sobre eles…

Cecília – Todos esses dias em que convivi contigo… Todo esse tempo foi muito importante para mim. E por mais que eu tenha pensado em negar isso, eu preciso ser sincera. Gustavo, eu descobri que… Eu te amo.

– Fim do flashback –

Gustavo – O que eu vou fazer, agora?

Começa a ensaiar uma cantiga.

Gustavo –        Oh, senhora minha

Que devo fazer?

Se já não a vejo

E o meu desejo

Quer se desfazer?

Oh, nova senhora

O que eu te direi?

Se olhas pra mim

Esperando um sim,

Porém nem eu sei?

Gustavo – Nem eu sei… Eu não sei, Deus. Eu não sei.

Gustavo se dirige à proa do navio. Ao chegar, para e passa a mirar fixamente o horizonte. Cecília aparece ao fundo.

Gustavo – Meu Deus, eu preciso de uma resposta. O que devo fazer?

Cena 09: Navio 1.

Agnella caminha rapidamente em direção à proa do navio.

Agnella – Preciso olhar para a frente, para a frente. Ah, se eu pudesse, eu faria esse navio andar mais e mais rápido, até chegarmos a Jerusalém. Até eu me encontrar com meu amor…

Agnella passa a olhar para cima. A luz do sol a incomoda. Ela abaixa a cabeça, protegendo os olhos da luz ao máximo com a mão.

Agnella – Ai, esse sol deve estar me fazendo ver coisas. Aquilo ali é um navio?

Gregório, Valentina e Pero vêm chegando.

Valentina – Um navio? Olha, que interessante. Esse mar tem andado bastante movimentado.

Gregório – Pois não é? Nesse mundo em que as pessoas se enclausuram nos feudos e nos povoados, esses navios se cruzando só pode ser uma grande coincidência.

Pero – Vai saber. Quem sabe não foi Deus quem o mandou ao meu encontro, para que eu me livrasse de vez de Inês…

Agnella – O navio está se aproximando… De onde será que ele vem?

Agnella aperta a visão. O sol ainda a incomoda um pouco, mas ela começa a enxergar melhor o navio. De repente, seu coração começa a palpitar.

Agnella – (Começando a ficar eufórica) Meu Deus, eu estou vendo coisas em excesso… Isso seria uma verdade boa demais…

No outro navio, outra pessoa começa a ficar agitada.

Gustavo – Será, meu Deus? Nossa Senhora, eu não estou louco. Eu estou vendo Agnella!

Agnella – Gustavo… Meu amor… (Grita) Até que enfim eu te achei, Gustavo!! Me espera, meu amor! Eu estou indo ao teu encontro!

4 comentários sobre “Capítulo 34 – Cantiga de Amor (O Reencontro)

  • Todos a seus navios, rs. Parece que Gustavo realmente ficou mexido com a confissão da Cecília…. mas e o amor dele pela Agnella
    Inês maltratando o coração de Pero? 😮 nossa que mulher insensível, coitado do camponês 🙁 ainda bem que a Valentina abriu-lhe os olhos. Inês agora que se cuide sozinha.
    E agora que Gustavo e Agnella se encontraram de novo que amor, veremos o que sucede!!!! 😀

    • Sim, Gustavo ficou mexido por causa dessa confissão. Afinal, ele possuiu uma convivência muito estrita com Cecília esses dias todos.
      Inês é meio insensível mesmo. Ela é aquela coisa: só dá valor quando perde. Mas às vezes é tarde demais.
      Mas esse reencontro de Agnella e Gustavo veio em momentos distintos para eles. De forma inesperada, sem prevenção, de surpresa, sem haver tempo para se prepararem um para o outro. Será que essa era a melhor hora para se reencontrarem?

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