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Cantiga de Amor

Capítulo 18 – Cantiga de Amor

Cena 01: Igreja del Fiume. Manhã.

Gustavo sobe no cavalo, anda um pouco, mas para novamente e se vira, olhando em direção ao povoado. Fala consigo mesmo.

Gustavo – Até mais, Agnella. Podes ter certeza de que ainda voltarei para ficarmos juntos. E, dessa vez, será para sempre.

Então, ele se junta à comitiva. Eles partem, junto com um coro das famílias já saudosas.

Povo – Adeus! Boa viagem! Te cuida! Deus te proteja! Não te esqueças de mim!

Cena 02: Convento.

Após a primeira refeição, Valentina seguiu para o seu quarto. Ao chegar, encontrou a irmã Francisca.

Francisca – Irmã Valentina, apronte-se. Hoje tu limparás a igreja novamente.

Valentina – Mas eu já limpei duas vezes essa semana, e…

Francisca – Não importa. Deixe-me dizer uma coisa a ti: não penses que a vida no convento é fácil, porque não é. É preciso aprender a controlar os impulsos da carne, a vencer as tentações. E só consegue quem está realmente disposta. Eu pergunto: tu estás disposta, irmã Valentina?

Valentina – (Encarando-a) S-sim, irmã Francisca. Totalmente disposta.

Francisca – Pois bem. Baterei palmas, e, nesse exato momento, quero você lá fora. Entendeu?

Valentina – Perfeitamente.

A irmã Francisca sai.

Valentina – Ah, mas eu sairei daqui de um jeito ou de outro!

Cena 03: Igreja del Fiume.

A irmã Francisca chega à igreja com Valentina.

Francisca – (Empurrando Valentina) Vamos lá! Podes começar a limpar!

Valentina se ajoelha ao pé do altar, e passa a limpar sem vontade, de qualquer jeito.

Francisca – É para limpar direito! Eu quero toda essa igreja brilhando!

Valentina – Está certo, irmã Francisca. A igreja vai ficar exatamente como a senhora quer.

Francisca – Assim espero, irmã Valentina. Por que se não fizeres bem, já sabes: tua carga pode dobrar.

A freira se vira para a ala dos quartos.

Francisca – (Gritando) Gregório! Gregório, onde estás?

O seminarista aparece.

Gregório – Pois não, irmã Francisca.

Francisca – Eu gostaria que tu ficasses vigiando a irmã Valentina, enquanto eu irei lá fora. E tu, irmã, não penses que eu demorarei, porque em pouquíssimos instantes estarei de volta.

Gregório – Tudo bem, irmã, eu cuido dela. A senhora pode ir tranquila.

Francisca – Obrigada.

Francisca sai. Assim que deixam de vê-la ou de ver sua sombra, Gregório e Valentina se olham.

Gregório – (Gaguejando) Co-como e-estás?

Valentina – (Abaixando a cabeça) Estou bem, obrigada. E… E tu, estás bem?

Gregório – Sim… (Inspira profundamente) Creio que sim.

Os dois ficam em silêncio por um tempo. Gregório “contorna” Valentina, e começa a seguir para a sala do padre. Valentina se levanta. Até que, na mesma hora, os dois viram um para o outro.

Valentina e Gregório – (Quase em uníssono) Eu sonhei contigo!

Eles se espantam. Cada um dá um passo para se aproximarem. Valentina se ajoelha novamente. Gregório se ajoelha ao lado dela.

Gregório – Tu sonhaste comigo… Também?

Valentina – Sonhei, sim. Mas, mas foi coisa insignificante. Não foi nada.

Gregório – O meu sonho foi bem estranho. Porém eu também acho que não significou nada. Era só… Correria, precipício, nada que fizesse sentido.

Valentina – (Pensativa; fala baixo) Correria… Precipício… Floresta?

Gregório ouve.

Gregório – Como? Disseste algo?

Valentina – Não, absolutamente. Bem, eu preciso voltar ao trabalho. Daqui a pouco a irmã Francisca chega e nos vê assim. Não será bom para nós. Ela pode… Pensar algo de errado.

Gregório – (Se levanta) Isso. Isso mesmo. Mas não há nada de errado para se pensar…

Cena 04: Igreja del Fiume.

A irmã Francisca está ao lado da porta da igreja, de onde pode observar tudo o que acontece na nave.

Francisca – O que esses dois estão fazendo ajoelhados? Aí tem algo de errado, e eu ainda irei descobrir… Ah, se não!

Neste momento, ela toma um susto com alguém a chamando.

Prudência – Irmã Francisca? O que a senhora faz aí?

Francisca – Ah, olá, Prudência! Eu não estava fazendo nada de importante. Aliás, nada que pudesse ser do teu interesse. Mas, afinal de contas, o que fazes aqui? Hoje não temos missa.

Prudência – Não é necessário haver missa para que eu venha à igreja; ou é? Onde está o padre?

Francisca – Sinto informar, mas o padre não se encontra no momento. Ele teve que viajar.

Prudência – Viajar?? Bem, mas eu creio que a senhora mesmo pode me informar algo. Irmã Francisca, onde está aquele rapaz que iria casar com minha filha? O nome dele é Gustavo. Ele se encontra no momento?

Francisca – (Sorri) Esse daí também viajou.

Prudência – E a senhora sabe quando ele volta?

Francisca – Ele não volta. Eu posso te garantir, Prudência, que ele nunca mais voltará.

Prudência – (Espantada) Nunca? Então, nesse caso, as coisas mudam…

Francisca – O que muda?

Prudência – Nada de importante, ou que seja de interesse da senhora. Muito obrigada, irmã Francisca. Tenha um bom dia.

Prudência sai.

Francisca – O que será que está acontecendo para ela vir aqui saber desse rapaz? Pensei que aquela família nunca mais cogitaria pensar nele. Isso é, no mínimo, estranho… Algo de errado ocorreu ali. Disso eu tenho certeza!

Cena 05: Povoado das Hortaliças. Casa de Enzo.

Prudência chegou a sua casa. Enzo já tinha ido trabalhar. Ela senta na sala e começa a pensar, até que alguém bate na porta e ela vai abrir.

Prudência – Olá, Simone! A que devo a honra da tua visita?

Simone – Bem, Prudência, eu vim aqui para falar do meu filho Adelmo. Tu já deves saber o que aconteceu com ele, claro.

Prudência – Na verdade não… Foi algo ruim? Notícias ruins correm rápido.

Simone – E correm mesmo, mas pelo visto essa não chegou ainda aos teus ouvidos. Serei direta. Adelmo sofreu um acidente.

Prudência – Como? Um acidente? Quando foi isso, Simone? Ele está bem, neste momento?

Simone – Não. Ele continua a aparentar estar morto, sabe? Não nos ouve, não nos responde, não abre os olhos. (Uma lágrima desce) O padre até rezou por ele, só que até agora nada do meu filhinho acordar. (Outra lágrima) Entretanto, ninguém sabe de que forma ele se acidentou. Só sabemos que foi entre ontem de manhã e o final da tarde de anteontem.

Prudência –(Fica um pouco assustada) Anteontem? Mas foi anteontem…

Simone – Que ele veio a tua casa, não foi? Ele quis vir, mesmo contra a minha vontade, porque era naquele dia que Agnella estava noivando. Mas eu estou aqui agora porque eu gostaria de saber o que se sucedeu. Quem sabe não entendemos alguma coisa desse acidente.

Prudência se lembra de Agnella, do tropeço e da jarra de água, mas não fala nada.

Prudência – Bem, Simone, o que eu sei é que ele veio conversar algo com meu marido. Só que ele nem teve tempo de fazer isso, porque Agnella foi lhe oferecer água, e sem querer o molhou. Então, ele disse que iria para casa, mas que depois voltaria para terminar a conversa com Enzo.

Simone – Foi somente isso? Tu não lembras se ele estava estranho, ou passando mal, por exemplo? Não te lembras de nada que chamou tua atenção?

Prudência – Nada. Absolutamente nada.

Simone – Sendo assim, esse acidente permanece um mistério para mim. De qualquer forma, obrigada, querida.

Prudência – De nada, minha amiga. Eu rezarei por Adelmo. Tenho certeza de que Deus há de querer, há de permitir que ele viva.

Simone – Obrigada, mais uma vez.

Simone vai embora.

Prudência – Meu Deus, um acidente…

Cena 06: Povoado das Hortaliças. Casa de Enzo. Quarto de Agnella.

Prudência abre a porta do quarto e entra.

Agnella – Já vieste me trazer comida, mãe? Eu falei que só comerei se Gustavo estiver comigo…

Prudência – Tua comida só virá mais tarde, minha filha. E quanto ao tal rapaz, ainda estou pensando. Eu vim aqui por causa de anteontem.

Agnella – Por que ficar lembrando aquele triste dia? Nada deu certo.

Prudência – Nada mesmo. Minha filha, a mãe de Adelmo veio me perguntar o que aconteceu com o filho dela quando ele veio aqui anteontem.

Agnella – Por que ela teve que vir aqui? Não podia perguntar a ele?

Prudência – Definitivamente não podia. Porque ele sofreu um acidente logo depois que saiu.

Agnella – Acidente? E como a senhora sabe que foi anteontem, depois que ele saiu daqui?

Prudência – Ora, Agnella, só pode ter sido por causa daquela jarra de água que tu quebraste em sua cabeça. E o pior, minha filha, é que foi muito sério. Simone me disse que ele não responde, nem abre os olhos; enfim, que parece estar morto.

Agnella – (começa a sentir culpa) Morto? Eu não o matei! Eu… Não matei! Não matei!

Prudência – Ele não morreu. Mas, por Deus, filha, por que fizeste aquilo?

Agnella – Por que ele viu, mãe! Ele me viu com Gustavo, no dia em que nós… Nos deitamos. E ele ia contar a meu pai!

Prudência – Meu Deus! E por isso tu provocaste um acidente! E agora já não sabemos se ele irá acordar. Eu só te dou um conselho, minha filha: reze, mas reze muito, tanto por ti quanto por ele. Se ele não acordar, minha filha, a culpa será tua.

Prudência sai do quarto. Agnella começa a bater na parede.

Agnella – Eu não sou uma assassina! Não! Nããão!

Ela desliza, e deita na cama, chorando.

10 dias depois…

Cena 07: Litoral italiano. Região portuária. Início da manhã.

Foi preciso uma semana e meia andando a cavalo para que o padre e sua comitiva chegassem ao local de onde os homens partiriam para lutar em nome de Deus. Era uma região portuária, um pequeno povoado, onde, também, havia uma igreja, ainda maior que a Igreja del Fiume. Era a Igreja del Mare.

Santorini –Meus irmãos, meus filhos! Prestem atenção! Estamos no lugar de onde vocês e vários outros homens seguirão para Jerusalém!

As pessoas começam a conversar entre si.

Edetto – É, meu filho, acho que essa será a nossa despedida mais dolorosa.

Izabella – Será tão difícil, Gustavo, saber que tu poderás deixar essa vida a qualquer instante!

Gustavo – Eu não morrerei, mãe. Eu não morrerei.

Santorini – Silêncio, pessoal, por favor! (As pessoas obedecem.) Obrigado. Fomos a última comitiva a chegar aqui, e, por isso, não teremos tempo de dormir. O navio partirá ainda hoje! (A multidão volta a se alvoroçar.) Calma, calma! Nesse momento, teremos uma missa que será rezada pelo arcebispo, assessor do papa, o qual não pôde vir. Logo depois, vocês terão um tempo para se despedir, ou não, caso estejam sozinhos, e para se instalarem no navio. Então, partirão. O que temos que fazer agora é entrar na igreja. A missa irá começar.

Cena 08: Povoado das Hortaliças. Casa de Enzo.

Enzo e Prudência terminaram de fazer a primeira refeição, e estão na sala.

Prudência – Meu senhor, eu estou preocupada com Agnella.

Enzo – Por que, Prudência? Por acaso ela passou mal ontem à noite?

Prudência – Não é disso que falo. Nossa filha está perfeitamente bem de saúde. Eu falo do futuro dela.

Enzo – Mas isso nós já decidimos, não foi? Ela irá se casar com Adelmo.

Prudência – Sim, eu também pensava ser essa a melhor atitude a tomar. Porém, ele sofreu aquele grave acidente, e até agora não acordou! Então, eu comecei a me perguntar sobre as possibilidades de esse casamento realmente ocorrer.

Enzo – Mas ele irá acordar, mulher. Além disso, esse não é o momento certo para sermos pessimistas. Pelo bem de Agnella, temos que torcer para que ele viva.

Prudência– Mas é pelo bem dela que eu prefiro não arriscar.

Enzo – E o que tu queres dizer com isso?

Prudência – Nossa filha não pode mais ficar naquele quarto, à espera de um casamento que talvez nem chegue. E ela ainda está pensando naquele rapaz, o Gustavo, porém sabemos que ele não voltará. Precisamos fazer algo para que Agnella não tenha o tempo ocioso pelo resto da vida. E, se não podemos casá-la…

Enzo – Tu dizes que não podemos. Eu ainda prefiro esperar.

Prudência – Não, marido! Esperar só irá aumentar a dor de nossa filha. O melhor para ela, agora, é dedicar sua vida a Deus. Se tu concordares, Agnella irá para o convento.

8 comentários sobre “Capítulo 18 – Cantiga de Amor

  • Agnella no convento, espero que ela fique amiga da Valentina. mas prevejo que, se isso ocorrer, Agnella será a mais nova ” vítima” de Irmã Francisca.
    Aliás tinha uma novela, Páginas da Vida, que mostrava uma freira que todos chamavam de ” Irmã MÁ”( seu nome era Maria) e a Francisca me lembra muito ela, por sua rigidez, nesse capítulo mesmo ela fez a Valentina sofrer um bocado, ainda bem que ela tem a companhia de Gregório.
    Gustavo e os outros indo pra guerra, quero ver onde isso vai dar. Acho que será uma saga muito emocionante!

    • Sabe que se eu fosse escolher um elenco para meus personagens, a Marly Bueno, atriz já falecida que fez a irmã Má, seria minha escolhida? Ela se encaixa bem nesse perfil de freira rígida.
      Bem, e Agnella e Valentina se tornarão mais do que amigas. Elas serão aliadas para seus futuros incertos.
      Enquanto isso, Gustavo parte rumo ao inesperado, até mesmo porque os seus planos deverão sofrer mudanças. Obrigado por comentar! 😀

  • Fico só imaginando a Agnella em um convento. Por um lado é por pq mesmo que o Adelmo sobreviva, ela não precisará casar com ele, mas por outro lado, e quando o Gustavo voltar da Cruzada? (esperamos q volte). Enfim, parece q as coisas ainda vão se complicar e muito. 🙂

    • A ida de Agnella ao convento, além de impedir que ela se case com Adelmo, impede que ela se case com qualquer outra pessoa – o que é bom para ela, uma vez que ela não é mais virgem. Mas, realmente, isso a afasta de Gustavo. Ao menos em teoria. Conto com você nos próximos acontecimentos “complicados”! 😀

  • O quê? Agnella num convento? My God, quando penso que não tem com ficar pior, ainda mais se for pra ficar com aquela tal irmã FRANCISCA, coitada da nossa protagonista, além do que ela já sofre com e perda do amado, e agora com a culpa pelo acidente do Adelmo, e ir ao convento….
    Gustavo está rumando a guerra, o que será que ela trará para nosso protagonista? Prevejo uma semana de ótimos capítulos pela frente. Que venha estou aqui para sasciar minha CURIOSIDADE hehe, 😉

    • Sabe que Agnella e Francisca nem vão se estranhar tanto? Não como Valentina, por exemplo. Mas é claro que em nenhum dos sonhos ruins de Agnella ela contava com essa reviravolta.
      Os capítulos da próxima semana estão convidativos, digamos. Novos personagens virão, e eu conto com você lá!
      Obrigado por comentar mais uma vez! 🙂

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