Capítulo 15 – Ela Veste Preto, Mas o Baile é Cor de Rosa

Após ter recolocado o quadro no lugar, Dora foi ao banheiro buscar alguns materiais de primeiros socorros para limpar os ferimentos da cabeça e braço de Alonso. Quando voltou, ele ainda dormia estirado no sofá-cama e ela pode notar o quanto era serena sua expressão.

– Como esse intrometido é bonito! – pensa abrindo o mercúrio para passar no braço ralado.

Começou em seguida a espalhar o remédio com algodão, no começo rápida e ríspida, provocando uma raiva sem razão que se não sentisse acabaria revelando outro sentimento. Alonso então começou a mostrar feições de dor e a se revirar no sofá-cama. Dora percebeu seu sofrimento e culpada, parou imediatamente, recomeçando bem devagar o trabalho.

– Garota você precisa se controlar! Não pode trai-lo! – repetia para si enquanto continuava.

Após passar o mercúrio, enfaixou o braço e repetiu o mesmo procedimento na cabeça, que na opinião dela, precisaria ser olhada com maior cuidado depois.

Terminado o trabalho, foi buscar um cobertor e ao cobri-lo, olhou vagarosamente para seu rosto, percebendo em detalhes os olhos amendoados e doces, a pele morena cobrindo uma boca carnuda e cabelos lisos e negros que caiam até a orelha. Não resistiu em chegar mais perto para sentir a respiração, e atraída por seus encantos foi se aproximando devagar a ponto de acariciar-lhe o rosto e imperceptivelmente tocar seus lábios com os dele.

Ao perceber que Alonso ficou inquieto, Dora saiu em pânico, dando um pulo que a deixou em pé inexplicavelmente.

– O que aconteceu? – pergunta ele resmungando.

– Nada! – ela responde paralisada no lugar. – Você devia dormir pra amanhã estar curado e aprontar mais por aí. Mas em vez disso, fica fazendo essas perguntas estúpidas! – termina o cobrindo mais nervosa ainda.

– Mas eu senti uma coisa estranha!

– Meu querido, você é estranho! Sentir alguma coisa normal é que seria diferente pra você! E agora boa noite, bom descanso, adeus! – cumprimenta saindo da sala.

– Até que você não é tão má assim irritadinha! Boa noite! – diz acomodando-se.

Dora parou ao ouvir a confissão de Alonso, tremendo toda, com medo do que estaria acontecendo.

– Só pode ser alguma coisa estragada que eu comi e com efeitos alucinógenos, amanhã há de passar! Tomara!

De manhãzinha, Dora deixou a porta da entrada entreaberta e uma visita chegou de surpresa vendo Alonso dormindo.

– Minha filha! – grita Lara. – O que é isso! Esse elemento te seduziu a tal ponto de já dormir aqui?

– Mãe, foi a primeira vez e tem um motivo completamente explicável pra isso. – Dora responde vindo da cozinha ao seu encontro.

– Eu sei! Esses caras de bairros perdidos são espertos… Ele está tentando fazer com você como o Juan na novela “Marcas de um Usurpador”. – diz diminuindo a voz para não acordá-lo.

– Como? Me poupe! – ri Dora.

– É sim! Lá o pobretão do Juan engravidou a inocente Mercedita, que era rica e se achava abandonada como você. Aí ele se aproveitou disso e usou o filho pra chantagear a moça e ficar no luxo, aproveitando de tudo que era dela. – dramatiza.

– Ai Meu Deus! Às vezes eu fico pensando se você faz de propósito ou se essa é realmente você. – sussurra ela voltando para a cozinha.

Nesse momento, Alonso abriu os olhos e se levantou parecendo ter ouvido tudo, só esperando sua deixa.

– Olá, senhora! É um prazer revê-la, como vai?

– Poderia estar melhor!

– Não liga pra ela… Esse é um ótimo plano! Não tinha pensado nisso ainda, mas agora que a senhora falou… As novelas são mesmo uma fonte inesgotável de conhecimento público. – termina ele ironizando com um largo sorriso.

Lara se sentiu ofendida com a brincadeira de Alonso, mas Dora chegou antes que ela pudesse responder à altura.

– Que bom! Você já acordou, machucadinho! Como se sente?

– Bem melhor, depois da enfermeira que eu tive!

Lara ouviu tudo parecendo que ia explodir e quanto mais percebiam isso mais melosos ficavam.

– Agora eu já vou, obrigado por tudo. – agradece o rapaz.

– Não, obrigada você! Não sei como seria se você não tivesse aparecido.

– Você é esperta e louca, pra não dizer mais! Sério, você teria dado um jeito.

Alonso já estava na porta quando Dora gritou.

– Espera! Eu tenho umas coisas pra você.

Ela correu até a cozinha e voltou com uma sacola que entregou para ele.

– Toma! É a sua jaqueta, limpa das manchinhas de sangue de ontem, uns mercúrios e faixas pra trocar mais tarde e um lanchinho pro café da manhã. Não quer ficar e tomar aqui?

Alonso olhou para Lara e respondeu.

– Não, obrigado! Mas deixa pra outro dia menos agitado.

– Não quer que eu te leve então pra casa, ou pra algum outro lugar?

– Não, pode deixar! Só vou avisar meu patrão que não irei trabalhar hoje e corro embora descansar.

– Tem certeza? – Dora pergunta se aproximando dele.

– Minha filha, ele já disse não. Não é não! Então senhor Manolo passar bem! – cumprimenta a mulher afastando a filha e fechando a porta bruscamente.

Alonso saiu rindo abertamente.

– Mãe, o que foi isso? Como você é grossa! E é Alonso!

– Eu não tô gostando nada do que tá acontecendo aqui! – grita Lara.

– Não tá acontecendo nada… A senhora é que é exagerada! – Dora revida.

– Ah, é! Então por que você tá assim?

Dora olhou para o espelho e então percebeu sua revolta, com os olhos vermelhos e lacrimejados de quem se importou em ser separada do insultado, o rosto corado e quente…

– Não pode ser! Eu estou apaixonada! – sussurra para si.

 

Música: Pete Yorn – Ever Fallen In Love

Você já se apaixonou por alguém?

Você já se apaixonou?

Se apaixonou por alguém?

Você já se apaixonou?

Se apaixonou por alguém?

Você não deveria ter se apaixonado.