Capítulo 03 – Cantiga de Amor
Cena 01: Povoado das Hortaliças. Cozinha da casa de Enzo.
Enzo, sua mulher e sua filha se dirigem à cozinha. Ao chegarem lá, Agnella coloca o balde de água em seu lugar e os pães sobre a mesa. Então, seu pai notou algo de estranho na sacola de pães.
Enzo – Agnella, por que trouxestes mais pães do que os que o dinheiro que te dei permitia comprar? Onde arranjaste mais dinheiro, hein? Onde?
Agnella – (Gaguejando) Meu pai, eu… Eu…
Prudência – Fui eu, meu marido. Fui eu que dei mais dinheiro a ela.
Enzo – (Enfurecido) Estás maluca, mulher? Como podes ter feito algo assim sem nem ter me consultado? Sabes que as nossas finanças são rigidamente controladas, e que cada moedinha pode valer muito!
Prudência – Me perdoe, meu marido. Pensei que o dinheiro que deste não seria suficiente. Agora vejo que era.
Enzo – Pensarei se a perdoarei. Mas, até lá, as duas estão de castigo! Ficarão confinadas até o dia em que eu quiser e achar que devem sair!
Prudência – Não culpe a menina! Fui eu que errei. Ela não merece ser castigada!
Enzo – As duas erraram! E eu não quero conversa! Agora, já para os quartos, e não me saiam de lá sem serem chamadas!
Prudência – E a tua comida, meu marido?
Enzo – Não sei. Arranjarei alimento por aí. Mas uma coisa é certa: pelo menos hoje vocês duas passarão o dia inteiro nos quartos pensando nos seus erros! E vão logo!
Elas saem e são trancadas nos quartos.
Enzo – Que coisa! Só me faltava essa!
Ele volta e come. Logo após, pega suas coisas e sai em direção ao trabalho no campo.
Cena 02: Igreja. Sala do padre.
Francisca – E então? Ainda não me explicaste o motivo de tal invasão. Vamos, fale-me.
Gustavo – Perdoe-me. Entrei aqui por engano. Só não entendo por que não posso ficar aqui.
Francisca – Porque não podes. Deus com certeza não se agrada disso. E saia imediatamente daqui. O padre está na nave da igreja e te espera.
Gustavo – Tudo bem. Com licença.
Gustavo sai.
Francisca – Aliás, seminarista, por que desobedeceste deixando-o entrar na sala do padre?
Gregório – Eu não o vi entrando! Porém, assim que percebi sua presença, ordenei a ele que saísse. Nesse exato momento, a irmã chegou.
Francisca – Não estou gostando em nada dessa história. E, agora, gostaria que tusaíste daqui. Preciso fazer algumas tarefas importantes.
Gregório – Mas quando terminarei meu trabalho?
Francisca – Em outro dia, outro momento. (Taxativa) Agora me deixe sozinha.
Gregório também sai.
Cena 03: Nave da igreja.
O padre Santorini estava observando a igreja, quando Gustavo chegou à nave central.
Santorini – Meu filho, que bom que chegou. Onde estava?
Gustavo – Eu estava… Eu estava nos meus aposentos.
Santorini – Mas eles não ficam do outro lado da igreja?
Gustavo – Na verdade… Eu não sabia que era proibido e entrei na sua sala, padre.
Santorini – Que feio, rapaz! Nunca mais repita isso! Mas, antes que eu perca minha paz, eu gostaria de pedir a sua ajuda. Será que poderia ajudar esse velho padre?
Gustavo – Claro, se estiver ao meu alcance.
Santorini – Pois bem. Tive que cancelar a missa no convento, e estou indo agora ao povoado visitar algumas pessoas, e levar algumas caridades para os mais pobres. Só que não posso fazer isso sozinho. Você vem comigo?
Gustavo – Claro, padre. Até porque eu nem cheguei a visitar o povoado… Tive imprevistos no meio do caminho.
Santorini – Então aproveite esta oportunidade que lhe dou. Na sala ao lado da nave da igreja, há alguns alimentos e roupas. Por favor, pegue-os e traga para fora.
Cena 04: Povoado das Hortaliças. Casa de Simone.
Simone – Como assim, minha filha? O que há de errado com teu marido? Ele não está gostando de ti?
Inês – Creio que ele até esteja, mamãe. Porém, eu não estou gostando muito dele. Principalmente depois que eu descobri algo.
Simone – O que, minha filha?
Inês – Eu descobri que a história de que ele tem muito dinheiro é mentira, mamãe. Ele é pobre!
Simone – (Boquiaberta) Não acredito, minha filha! Como descobriste isso?
Inês – Eu ouvi uma conversa dele com um amigo seu. Eles comemoravam por terem me enganado!
Simone – Ah, mas eles não enganaram apenas a ti, como a mim também. E a Leonor! Ah, mas ele vai se ver conosco!
Inês – O que pensas em fazer, mamãe?
Simone – Não sei exatamente, minha filha. Conversarei com Leonor, e então veremos o que será feito.
Inês – Nesse caso, tenho que voltar para casa.
Simone – (Segurando a filha pelo braço) Fique mais um pouco com sua mãe! Vamos conversar sobre outras coisas.
Inês – Tudo bem. Mas só mais um pouquinho.
Cena 05: Povoado das Hortaliças.
Valentina chega ao povoado e pensa em procurar uma estalagem. Porém, como não possui dinheiro, desiste da ideia. Anda um pouco, e acaba chegando ao meio do povoado, tendo suscitado curiosidades nas pessoas. Para em frente a uma casa. Bate na porta. Depois de um tempo, ela é aberta.
Valentina – Será que eu poderia me abrigar em sua casa?
Brás – (Assustado) Quem é você, menina? Não a conheço.
Valentina – Não importa quem eu sou. Apenas gostaria de saber se posso me abrigar em sua casa.
Brás – Não sou um maluco. Já que não sei quem és, e a senhorita não me diz, não posso abrigá-la.
Brás bate a porta na cara dela. Ela sai, e vai se dirigindo ao outro lado da rua, quando a porta atrás de si é aberta.
Brás – Pensando bem, acho que vou abrigá-la aqui.
Valentina sorri. Brás a conduz e ela entra na casa dele. Ao entrar, ele a pega em seu braço e a arrasta em direção a um quarto.
Valentina – O senhor está doido? O que está fazendo?
Brás – Cala a boca, garota! (Ele a joga no quarto) Agora fica aí nesse quarto! Você queria abrigo, não é? (Sorrindo sarcasticamente) Pois então: vai dormir aí.
Valentina – Eu não quero mais ficar aqui! Vou sair, agora! Com licença.
Brás – (Negando com a cabeça) Nem pense nisso.
Ele sai e tranca a porta do quarto.
Brás – Até porque você ainda vai ter que me pagar essa estada.
Cena 06: Povoado das Hortaliças. Parte oeste.
No caminho para as terras coletivas, lá vai Enzo com sua carroça. Ele está ainda enfurecido por causa de sua filha e de sua mulher. Devido à sua distração, o cavalo acaba se atrapalhando em uma ladeira, provocando uma capotagem da carroça, e fazendo com que Enzo acabe ficando preso e não consiga sair.
Cena 07: Povoado das Hortaliças. Parte oeste.
Gustavo e o padre Santorini chegaram ao povoado, e estavam visitando algumas casas na parte oeste, próximo às terras coletivas. Ao entrarem em uma rua, eles acabam se deparando com Enzo, preso sob a carroça, e se debatendo para tentar sair. Gustavo, então, corre para ajudá-lo.
Enzo – Socorro, padre! Estou preso! Ajude-me aqui!
Santorini – Meu filho, o que aconteceu? Como você foi parar aí embaixo?
Enzo – Meu cavalo, padre, se atrapalhou. Mas eu preciso sair debaixo dessa carroça!
Gustavo – Não precisa se preocupar, senhor. Já estou tirando-a.
Gustavo, depois de um tremendo esforço digno de um herói romântico, consegue levantar a carroça e tirar Enzo. Este, por sua vez, fica admirado.
Enzo – Gostei de ver a sua força, meu rapaz. Pelo visto tem muita coragem.
Gustavo – Obrigado. Na verdade, sempre precisei de muita força e de muita coragem.
Enzo começa a acalmar o cavalo.
Enzo – Hum… Interessante. Quero conhecer melhor a sua história depois. Muito obrigado por ter me salvado. Agora, padre, desculpe-me, mas tenho que seguir para as terras. Com licença.
Enzo ajeita a carroça rapidamente e parte.
Santorini – Que estranho… Ele parecia preocupado demais. Aliás, rapaz, de onde tirou tanta força?
Gustavo – Como disse, padre: sempre precisei de força e de coragem nas minhas andanças. Dessa vez, eu pude ajudar alguém com ela.
Santorini – E isso foi uma boa atitude. Pode ter certeza de que Deus está se agradando muito de você hoje.
Gustavo – Que bom. Que bom…
Santorini – Agora, vamos continuar as nossas visitas.
Cena 08: Povoado das Hortaliças. Parte central.
Após algumas horas de visitas e conversas, Gustavo e o padre Santorini entram na rua em que Enzo e sua família moram. Depois de visitarem algumas casas, o padre se dirige à casa de Agnella. Bate na porta.
Santorini – Prudência!! Você poderia vir abrir a porta para mim?
Nenhuma resposta.
Santorini – Prudência? Agnella? (Se dirige para Gustavo) Onde será que elas estão? Mãe e filha, ao mesmo tempo fora de casa… Que estranho, não acha?
Gustavo não responde. Parece estar pensando em outra coisa.
Santorini – Não acha, rapaz? (Percebe a desatenção dele) Vou chamá-las novamente.
O padre Santorini chama-as várias vezes, porém ninguém o atende. Então, desiste.
Santorini – Ah, elas parecem não estar em casa. Vamos, rapaz. Vamos!
Gustavo não responde. Em seu pensamento, apenas um nome surge. O mesmo nome que ele ouvira mais cedo na floresta, dito por Adelmo, e que agora o padre repetira: Agnella.
A misteriosa Valentina me agrada, espero ver seu crescimento na história. A web segue muito bacana, vou pro 4 capitulo. Abração!!!
Obrigado! Valentina é uma mulher misteriosa, mas que vai mostrar sua face mais de garra. Espero que você continue gostando dela! Um abraço!
Gostei muito do capítulo! E é engraçado ver como as pessoas agiam e pensavam na Idade Média. Hoje um homem colocar a mulher e a filha de castigo por conta de pães a mais seria um tanto quanto estranho. E o que será que Brás fará com a Valentina? Ela parecia bem perdida! Vou continuar acompanhando ” Cantiga de Amor” 😀
Pois é! A Idade Média tinha suas peculiaridades, mas algumas coisas continuam desses tempos para cá. Conto com você!!!