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Edição especial: Cantiga de Amor

CANTIGA DE AMOR: edição especial: capítulo 20

Cena 01: Região portuária. Em frente à Igreja del Mare.

Pero – Brás! Brás está vivo! Mas, mas, era para ele estar morto! O que será que aconteceu? Será que o confundiram com alguém quando ele estava partindo? Aliás, era para ele também estar em Jerusalém…

Mais à frente, Brás e Marlete começam a caminhar em direção ao porto.

Pero – (Grita) Brás! Brás, me espere aí!

No entanto, eles aceleram o passo. Pero decide segui-los. Em pouco tempo, eles desaparecem.

Pero – Para onde eles foram? Será que foram para onde estou pensando?…

Cena 02: Região portuária.

Brás e Marlete se encontram com Giancarlo e Cecília.

Cecília – Bem, então vamos, pai? Não é isso que o senhor quer? Vamos voltar logo para casa e acabar com toda a sua preocupação e inquietação com relação a mim. É só uma pena que, enquanto uma pessoa da família, tenhamos que continuar convivendo com Marlete. Eu estou muito decepcionada contigo, minha prima.

Marlete – Ah, então o senhor já contou sua história a Cecília, não foi? Olha, minha querida, eu sinceramente não me importo tanto com tua decepção, sabe? Acho; ou melhor, tenho certeza de que deverias me agradecer por estares agora livre daquele crápula do Gustavo. Mas isso é passado, não é? Vamos embora desse lugar.

Brás – Isso. Essa península não me traz boas lembranças.

Giancarlo – Eu sinto muito se irei desapontá-los, mas nós não iremos voltar para casa.

Marlete – Como? O senhor só pode estar maluco. Iremos morar aqui agora? E os teus negócios em Termes? E o tesouro?

Giancarlo – Sempre esse tesouro. Sempre esse tesouro! Esqueça-o, Marlete! E nós não iremos morar aqui; eu não sou louco. O que eu quero agora é ir até aquele senhor, pai de Gustavo, e tirar satisfação com ele sobre determinado assunto.

Cecília – É sobre… Gustavo?

Giancarlo – Claro que não! É outra coisa. Algo que me deixou intrigado.

Marlete – É sobre o colar, não é? O colar de Cecília, sobre o qual ele te interrogou. Porém eu pensei que isso não o tivesse incomodado tanto.

Giancarlo – Não fiquei incomodado. Porém admito que estou bastante curioso. O fato de ele me abordar para tratar do colar, e não do seu filho, é bastante estranho. E eu quero saber o motivo real de ele ter feito isso.

Cecília – Mas, meu pai, nós nem sabemos para onde ele foi. Como o alcançaremos?

Giancarlo olha para Brás.

Brás – O senhor quer que eu seja seu guia? Mas eu nem sei se conheço o caminho que eles estão tomando.

Giancarlo – Ah, por favor, não sejas hipócrita! Tu disseste que vieste do mesmo lugar de onde ele veio, e no qual ele se apaixonou por outra mulher. Nesse caso, tu conheces o caminho.

Brás – Mas como poderei ter certeza de que eles irão para o mesmo lugar?

Giancarlo – Certeza, nós não temos. Mas eu estou decidido a tentar. E quanto a ti, Cecília, nem te aproximes de Gustavo.

Cecília – Tudo bem, pai.

Brás puxa Marlete para o lado, e conversa baixo com ela.

Brás – Eu não posso voltar para o povoado. Isso seria suicídio! Eu preciso pegar a minha parte nesse tesouro antes disso!

Marlete – Presta mais atenção, e pensa! Se meu tio quer interrogar o pai de Gustavo por algum assunto relativo ao colar, é porque isso tem a ver com o tesouro! E tu também não podes dar espaço para desconfianças. Tu não conheces o lugar? Quando chegarmos lá, é só te esconderes. E eu espero que essa viagem não dure muito tempo.

Eles voltam a Giancarlo e Cecília.

Giancarlo – E então, Magno?

Brás – Tudo bem, senhor. Eu aceito guiá-lo até o destino que queres.

Giancarlo – O lugar de onde vieste.

Pero – O Povoado das Hortaliças.

Todos olham para Pero, que apareceu sem ser notado. Brás leva um susto, mas tenta disfarçar. No entanto, seus olhos permanecem alertas e ameaçadores para Pero.

Pero – Eu irei com vocês.

Cecília – Pero? Tu não disseste que ficarias aqui? Por que decidiste voltar?

Pero – Por que todos do povoado, em especial uma pessoa, precisam saber a verdade sobre esse homem. (Aponta para Brás.) Ele se chama como mesmo? Magno? Sinto muito, senhor, mas eu e sua mulher, Inês, que, ao que me parece, havia aportado no mesmo navio que o seu, o conhecemos por outro nome. Brás da Mata.

Brás – (Raivoso, mas um pouco desconcertado) Mas, mas, isso é uma mentira deslavada! Não acredites nesse homem, senhor! Ele está mentindo!

Giancarlo – Mesmo? Senhor… Pero, não é? O senhor tem certeza do que dizes?

Pero – Claro que sim! Qual não foi a minha surpresa agora há pouco, quando o vi saindo da igreja, acompanhado dessa mulher (aponta para Marlete)! Era ele! Brás! Esse homem saiu do povoado, assim como Gustavo, para lutar na Guerra Santa em Jerusalém. Só que depois o padre nos disse que ele havia morrido ainda no navio, e que o corpo tinha sido jogado ao mar! Mas ninguém nunca o viu realmente morto. Porque não era ele! Me diz, Brás! Por que isso?

Brás – Tu estás doido! Maluco! Nunca nessa vida eu o vi!

Cecília – Será mesmo? Estás muito nervoso, Magno.

Giancarlo – Ou Brás… Eu me lembrei de uma coisa. Me diz, homem, por que te trancaste no navio depois que Inês apareceu? Isso foi uma coincidência? Digo isso porque a história desse homem parece muito plausível. Tu sabias disso, Marlete?

Marlete – Não! Nunca soube! Confesso que a revelação que ele me fez, nos fez, sobre Gustavo, foi bastante importante, e que eu permiti sua companhia por causa disso. Mas eu nunca desconfiei dessa história!

Brás – Então é assim? Todos contra mim! Pois eu assumo! Eu assumo isso! Um homem morreu enquanto ainda estávamos próximo a esse porto! Porém o capitão jogou-o ao mar, sabe lá Deus como, achando que ele era eu. E quando eu soube, eu só decidi não desmentir isso porque eu não queria que ninguém soubesse que eu estava em busca desse tesouro, e assim eu poderia surpreender a minha mulher! Mas se tu estás pensando que eu contarei a Inês a verdade, estás enganado! Eu quero, antes, esse tesouro para mim!

Giancarlo – Tu não terás nada, entendeste? Chega de devaneios! Tu nos levarás até o teu povoado, mas terás que contar a verdade.

Brás – Eu ainda posso fugir.

Pero – Eu me encarrego de garantir que isso não aconteça. Encontrei algumas cordas no caminho para cá, e achei que elas seriam úteis.

Pero amarra as mãos e os pés de Brás.

Pero – Agora tu sentirás um pouco do que fizeste Inês passar. Quanto ao senhor, Giancarlo, pode ficar tranquilo. Eu o levo até o Povoado das Hortaliças.

Cena 03: Estrada.

Em uma carroça, na estrada que sai do porto, Edetto está guiando o cavalo. Valentina, com pés, mãos e bocas amarradas, vai deitada atrás dele. A uma distância considerável, andam outras duas carroças. Uma é guiada por Gustavo, que tem ao seu lado sua mãe, Izabella. A outra carroça é guiada por Adelmo, que leva com ele Inês, Agnella e Gregório.

Edetto – Agora eu quero ver se aquele seminarista conseguirá te libertar novamente, Valentina.

Izabella – Vamos, Gustavo, não fiques cabisbaixo. Será melhor para ti se ficares em casa, e casares com a mulher certa. Uma filha de senhores feudais.

Gustavo – Não sei, mãe. Não sei.

Adelmo – Agnella, eu não quero que fiques preocupada. Eu te amo de verdade. Um dia tu reconhecerás isso.

Agnella – Porém eu não te amo. Eu quero apenas distância de ti. Só não abandono essa carroça porque, se o fizer, nunca mais verei Gustavo.

Inês – Ah, Agnella, eu sinceramente já cansei de te ouvir falando nele! Ou tu reconheces e aceitas o amor de meu irmão, ou viverás amargurada para sempre! Esqueças Gustavo! Ele não te ama! Percebes o que aconteceu comigo? Menosprezei a Pero, e agora só me resta voltar para casa e viver a minha viuvez.

Gregório – E tudo o que eu preciso fazer é resgatar Valentina… E voltar à liberdade…

10 dias depois…

Cena 04: Igreja del Fiume. Final da tarde.

O padre Santorini está na nave, com a irmã Francisca, quando uma carroça para em frente à igreja. Um homem desce, trazendo uma mulher consigo.

Santorini – Edetto! Que bom vê-lo! Mas… Quem é essa?

Francisca – Valentina! Claro! Tu conseguiste trazer a fujona de volta! Muito bem!

Edetto – Olá, irmã. Olá padre! Sua bênção!

Santorini – Deus te abençoe!

Valentina se debate, mas não consegue nem falar.

Edetto – Por favor, irmã, eu gostaria que a senhora levasse Valentina para o seu convento, para que ela ficasse lá até amanhã. Nós pretendemos passar a noite aqui. Seria possível, padre?

Santorini – Claro que sim, meu filho! A irmã Francisca levará Valentina agora. Não é, irmã?

Francisca – Bem, está certo. Mas eu volto logo. Gostaria de saber como conseguiste trazê-la.

Valentina se debate ainda mais, porém as cordas não lhe permitem resistir contra Francisca. As duas saem.

Santorini – Mas, a propósito, onde está sua mulher?

Edetto – Ela deve estar chegando, junto com meu filho. Eu tive que vir na frente para que o seminarista não tentasse soltá-la.

Santorini – O senhor quer dizer que Gustavo está de volta? E Gregório está vindo? E outros? Adelmo, Inês, Agnella e Pero? Estão vindo, também?

Edetto – Acho que apenas o último não. Todos os outros devem chegar logo, logo.

Duas carroças param em frente à igreja. Os viajantes descem.

Santorini – Mas olha só! Estão quase todos aqui. Até quem eu não esperava que estivesse; não é mesmo, Gustavo?

Gustavo – Padre, eu…

Santorini – Calma, daqui a pouco tu me explicarás o que for preciso. Onde está Pero, Inês?

Inês – Ele resolveu ficar no porto. Me abandonou. Por isso eu voltei. Eu… Reconheço que errei, padre. Deveria ter ficado no povoado.

Santorini – E quanto ao romance com Pero? Não deverias estar arrependida também?

Inês – Sim, sim. Foi um grande erro ter feito isso.

Santorini – Que bom, minha filha. Esse é um grande passo para o perdão de Deus.

Adelmo – Padre, nós passamos aqui apenas para avisá-lo que voltamos, e para pedir a sua bênção. Mas nós queremos ir para nossas casas, enquanto ainda é claro.

Agnella – Fale por ti, Adelmo. Eu ficarei aqui, com Gustavo.

Izabella – Por favor, padre, não permitas essa insanidade. Deixe-a ir para sua casa. Se o senhor tiver algum assunto para resolver com essa moça, resolva amanhã, depois que formos embora.

Agnella – Não! Vocês não podem ir embora assim!

Santorini – Minha cara, ouça esse rapaz que te acompanhou até aqui, e vá para casa, para rever seus pais. É a atitude mais sábia. E quanto a ti, Inês, gostaria de vê-la amanhã.

Adelmo – Vamos, Agnella. Amanhã, eu ou minha mãe voltaremos com Inês, padre.

Adelmo puxa Agnella, que vai à força. Inês os acompanha.

Santorini – E tu, Gregório, não estás arrependido por ter largado a tua chamada, a chamada de Deus, para fugir com uma serva? O que fizeste foi muito grave, e me admira que o seu senhor não o tenha mandado prender…

Edetto – Ainda. Eu não fiz isso por causa do senhor, padre, porque sei que tens apreço por ele e sei que ele fugiu enquanto estava nessa igreja. Porém ai de ti, rapaz, se tentares fugir com Valentina novamente! Eu o prenderei na mesma hora!

Gregório – Mas onde está ela agora? Para onde o senhor levou Valentina?

Cena 05: Convento. Quarto escuro.

Francisca jogou Valentina no chão do quarto, e tirou sua mordaça.

Francisca – Muito bem, (fala em tom jocoso) irmã Valentina. Agora que tu foste presa por teu senhor, não precisas mais fingir ser uma noviça. (Fala com um tom altivo) Mas deixa-me te confessar uma coisa. Desde o dia em que apareceste aqui, eu desconfiei que não querias ser freira. Que havia algo errado em tua entrada para esse convento. Até… Mexi em tua comida para justificar o castigo que te impus. E aí, depois, tu fugiste. E agora eu tenho a chance de te castigar de verdade pela tua fuga. Porém não posso fazer isso, afinal tu és serva de Edetto, e ele pode se enfurecer comigo. Ah, mas que eu tenho vontade de te castigar com cera de vela ou com um cipó, eu tenho. Porém prefiro que o Senhor trabalhe em tua mente aí, nesse chão sujo, cheio de ratazanas e baratas, e te faça refletir sobre tua verdadeira escolha. Amanhã, tu irás embora, e então te verás longe de mim. Queres falar alguma coisa?

Valentina – Não tenho nada para falar para a senhora, irmã Francisca. A não ser que eu sempre tive repulsa a esse lugar. A essa prisão. E que eu não me importo com nada que for feito comigo. Já suportei muita coisa, e nada mais me assusta. Tenho certeza de que Deus sempre esteve ao meu lado.

Francisca – Não blasfemes! Porque Deus te ouve, e irás te castigar severamente por isso! E agora, eu preciso voltar à igreja. (Fala ironicamente) Passar bem.

Ela sai rindo. Dentro do quarto, Valentina cospe no chão.

Cena 06: Igreja del Fiume.

Edetto – Agora, tu não poderás mais tocar em um fio de cabelo de minha serva. E eu espero que isso tenha ficado bem claro!

Santorini – Eu acho que ele entendeu. Não é, Gregório?

Gregório – Sim. Eu entendi.

Ele vai saindo. O padre o segura.

Santorini – Ainda não me explicou por que fugiu da sua ordenação.

Gregório – O senhor não entendeu? Eu descobri que amo Valentina, que o meu lugar não é tomando conta uma igreja!

Santorini – Meu filho, esse assunto é muito sério. E eu quero conversar contigo longe dessas pessoas. Vá para o seu quarto. Depois falarei com você.

Ele sai. Santorini se aproxima de Gustavo.

Santorini – Pois bem, Gustavo. Eu não o esperava por aqui. Achei que, nesse momento, estaria ajudando nossos irmãos a vencer os mouros. O que, aliás, pelas primeiras notícias que nos chegaram, está sendo bastante difícil.

Gustavo – Mas isso com certeza não é pela falta de um único homem.

Edetto – Filho! Respeite o padre!

Santorini – O que eu quero saber é por que você já voltou. Aconteceu alguma coisa que o fez desviar a rota e voltar. O que foi? E por que apareceu aqui junto com os outros?

Cena 06: Povoado das Hortaliças. Casa de Enzo.

Enzo, Prudência, Agnella, Adelmo e Inês estão na sala.

Enzo – Muito obrigado por ter trazido nossa filha de volta, rapaz. Podes ter certeza de que tu terás a tua recompensa.

Agnella – Como assim, recompensa? O que o senhor quer dizer com isso, meu pai?

Enzo – Ora, minha filha. Eu quis dizer que eu te casarei com Adelmo! Quer seja a tua vontade, quer não!

Adelmo – Não é uma ótima notícia, cara donzela?

Agnella – Não! Nunca será!

Agnella corre para o quarto.

Prudência – Me desculpe, Adelmo. Eu vou trazê-la de volta para cá.

Adelmo – Não se preocupe, senhora. Eu e Inês já estamos indo para casa. Passamos apenas para trazer Agnella. Vamos, minha irmã, Nossa mãe nos espera.

Inês – Vamos. Vamos para a casa de nossa mãe. Não quero voltar para a minha casa hoje.

Adelmo – Passar bem, senhores. Até mais.

Ele sai. Prudência vai até o quarto de Agnella.

Prudência – Agnella, tu não achas que tens de parar de correr para o teu quarto sempre que fores contrariada? Precisas aprender a aceitar nossas decisões, minha filha!

Agnella – Mas eu não aceito me casar com Adelmo!

Prudência – Ele é um rapaz tão bom. Ele é íntegro! Apesar de algumas coisas que ele possa ter feito, como praticamente nos chantagear para propor esse casamento. Mas de qualquer modo, ele te ama!

Agnella – Mas eu amo Gustavo! E a senhora, a senhora deveria ter me ajudado, a senhora prometeu me ajudar a casar com Gustavo! Lembra do dia em que eu contei à senhora sobre o motivo da outra visita de Adelmo, e que eu só poderia me casar com Gustavo por causa do que nós fizemos? A senhora prometeu me ajudar! Mas o que a senhora fez? Me internou no convento, e agora está querendo me casar com Adelmo!

Prudência – Mas eu fiz o que pude! Quando fui à igreja, Gustavo já havia ido embora! E Adelmo parecia estar morto! Eu tive que convencer seu pai a inscrevê-la no convento, porque, caso contrário, nenhum homem aceitaria se casar contigo! E agora, Adelmo se dispôs a ser teu marido, mesmo depois do que fizeste com Gustavo. Percebes, minha filha, que eu só fiz o que era melhor para ti, para evitar problemas por causa do teu erro com esse rapaz?

Enzo entra no quarto.

Enzo – (Enfurecido) Eu ouvi mal ou tu já sabias, Prudência? Já sabias do pecado que aquele rapaz cometeu com Agnella, e não me contaste nada? Preferiste agir no silêncio? Foste conivente com o erro de nossa filha! Foi isso, mulher, não foi? Vamos, não mintas mais para mim!

Cena 01: Casa de Enzo. Quarto de Agnella. Final da tarde.

Enzo – (Enfurecido) Vamos, não mintas mais para mim! Admite que sabias de tudo!

Prudência se levanta da cama.

Prudência – Meu senhor, eu confesso que já tinha conhecimento desse fato, sim. Peço-lhe perdão por não ter lhe contado… E peço que compreendas que tudo o que fiz acabou sendo para o bem de nossa filha.

Enzo – Para o bem de nossa filha? Quer dizer que o fato de Agnella ter fugido e ter quase chegado a Jerusalém foi o melhor para ela? Se ela tivesse permanecido em casa, se tivéssemos tido paciência até que Adelmo se recuperasse do acidente, Agnella nunca teria entrado nessa aventura maluca em que embarcou!

Prudência – Mas nós não sabíamos nem se Adelmo voltaria a acordar! E se ele não tivesse…

Enzo – Chega de conjecturas e de ações impensadas, Prudência! Aliás, tu não tens honrado o teu nome como deverias fazer.

Prudência – Não, meu senhor, tu não entendeste o real sentido do que fiz…

Agnella – Meu pai, perdoe minha mãe. Ela apenas…

Enzo – Basta! Vocês duas erraram bastante ao não envolver em suas atitudes o homem responsável por ambas. E se foram tão levianas assim, terei que impedi-las de cometer quaisquer novos erros. Tu, Prudência, não tomarás mais parte de nenhuma decisão com relação ao futuro de Agnella. E eu também não quero mais que as duas conversem enquanto eu não estiver por perto. Por isso, Agnella, tu estás de castigo, até que tudo sobre o teu casamento se resolva. Vamos, Prudência, saias desse quarto e vá para o teu. Agora!

Prudência – Tudo bem, Enzo. Eu confio nas suas determinações.

Eles saem.

Agnella – E agora… Eu não posso mais contar com minha mãe… O que faço para ter Gustavo?

Cena 02: Nave da Igreja del Fiume.

Gustavo – É isso, padre. Foi por isso que eu não fui até Jerusalém.

Santorini – Por pura ambição? Eu não sabia que você tinha pensamentos tão ambiciosos, meu filho. Fingir ser outro homem para conseguir algo que não é seu?

Gustavo – Mas, padre, eu não queria ter feito isso… Digo, mentir sobre mim. Eu só aceitei procurar essa família por causa de Marconi, como realização do último desejo de um falecido…

Santorini – Todavia você mentiu. Sabe, meu rapaz, eu poderia repreendê-lo severamente por isso, mas parece que sua própria experiência já lhe rendeu o bastante para você entender que isso é algo que nunca pode ser feito.

Gustavo – O senhor pode ter certeza de que eu nunca mais tomarei esse tipo de atitude.

Francisca – Será que podemos ter certeza? Parece-me que tu tens um histórico que nos recomenda a ficar de sobreaviso…

Izabella – O meu filho, irmã Francisca, é em geral muito obediente.

Edetto – E nós esperamos que ele não nos decepcione novamente.

Cena 03: Povoado das Hortaliças. Casa de Simone.

Simone está abraçando Inês. Adelmo também está na sala.

Simone – Minha filha! Quanta saudade! Eu… Eu estive tão aflita esses dias todos… Olhe bem para mim, Inês. Aquilo que tu disseste para mim antes de fugir foi muito duro. E eu fiquei muito magoada contigo. Tudo o que eu queria agora era ouvir de ti um pedido de perdão.

Inês – Minha mãe, eu percebo agora. Fui uma tola, todo esse tempo. A senhora é a melhor mãe que existe nesse mundo. Me perdoa?

Simone – Sim, Inês. Eu a perdoo. (Ela beija o rosto da filha) E tu, meu querido Adelmo, conseguiste trazer Agnella?

Adelmo – Sim, mãe. Se Deus quiser, nos casaremos em breve.

Simone – E Ele há de querer, meu filho. Ele sabe o quanto a amas.

Cena 04: Igreja del Fiume. Quarto de Gregório.

Gregório – Padre, o senhor precisa me compreender… Eu sei que o senhor é capaz! Sabe, Deus, Deus nos uniu…

Santorini – Eu estou bastante triste, Gregório… Deus não seria conivente com um seminarista e com uma serva fugidos. Como você pode colocar o nome do Senhor nessa história?

Gregório – Os sonhos que nós tivemos, ao mesmo tempo, sem nem termos conhecimento do que se passava com o outro… Eles não são prova suficiente de que a vontade de Deus para nós…

Santorini – Mas por que você não conversou comigo e com seu pai antes? Por que teve que fugir?

Gregório – Era o único jeito! Se não fugíssemos, Valentina seria presa novamente!

Santorini – Por favor, Gregório, você já me disse coisas demais. Eu preciso pensar em todos esses sonhos e acontecimentos. Amanhã eu quero conversar com você de modo definitivo. Tenha uma boa noite, meu filho.

Gregório – Boa noite, padre.

O padre sai do quarto.

Gregório – Se eu ao menos pudesse ir até o convento… A única maneira seria, claro, pela sala do padre. Mas eu não tenho a chave… E eu não tenho como pegá-la…

Gustavo entra.

Gustavo – Será que eu não poderia ajudá-lo com isso, meu amigo?

Gregório – Mas tu, Gustavo? Eu realmente te agradeço por tua disposição, mas eu não vejo como podes me ajudar.

Gustavo – Talvez… Eu possa tentar pegar a chave da sala do padre por ti. Basta que me digas onde a posso encontrar.

Gregório – No quarto do padre Santorini, é claro. Mas isso é muito arriscado. Como devolveríamos a chave sem que ele desconfiasse?

Gustavo – Posso dar um jeito de fazer isso amanhã de manhã, assim que ele acordar… O que importa é que tu te encontres com Valentina e os dois saiam daqui o mais rápido possível. É só tu me dares os detalhes de como conseguir a chave. E aí, mais tarde, quando todos dormirem, nós dois iremos até o convento.

Cena 05: Igreja del Fiume. Quarto de Gregório. Noite.

Gregório está andando de um lado para o outro do quarto. Até que ele ouve leves batidas na porta. Ao abri-la, vê Gustavo, que segura uma lamparina.

Gregório – Estive tão ansioso que pareceu que nunca chegarias.

Gustavo – Mas agora eu cheguei. E estou com a chave. Vamos, meu amigo. Não podemos chamar a atenção de ninguém.

Cena 06: Convento. Quarto provisório de Valentina.

Valentina está dormindo. Ela se revira, de um lado para o outro do chão. Um sonho a incomoda.

Ela e Gregório estão dentro de um rio. Em uma margem, se avistam casas. Na outra, se avista, ao longe, paredes de um grande precipício. Eles estão olhando para o leito do rio, um pouco apreensivos. De repente, porém, não estão mais no rio. Reaparecem, cada um encostado em uma árvore, à beira de um precipício. Eles olham para a frente, e veem uma igreja, e sobre ela a sombra de uma grande mão. Tentam sair, mas parecem estar presos, ainda que não estejam amarrados. Ao mirarem o fundo do abismo, veem, ao longe, um pequeno brilho. Subitamente, tudo escurece.

Cena 07: Igreja del Fiume. Sala do padre.

Gregório e Gustavo entram na sala de Santorini e trancam a porta. Gregório aponta para a mesa do padre.

Gregório – Ali, embaixo do tapete. Há um alçapão que deve nos levar ao convento.

Eles afastam mesa, cadeira e tapete, e levantam o alçapão. Descem as escadas.

Gustavo – Isso tudo são… Livros…

Gregório – Vê bem, Gustavo, tu não podes dizer em nenhum momento que estiveste, ou melhor, que estivemos aqui. Senão, nossa punição pode ser efetuada pelas supremas cortes papais.

Gustavo – Tudo bem, tudo bem. Eu prometo ficar quieto.

Gregório – Porém eu confesso que nem mesmo eu sei para onde ir. Na verdade, eu nunca estive nesse lugar…

Gustavo começa a andar em determinada direção. Gregório o segue. Eles chegam a uma porta.

Gregório – Como… Como soubeste que o caminho certo era esse? Pareceste tão decidido, Gustavo.

Gustavo – Eu… Foi apenas uma tentativa. Que deu certo de primeira. Mas onde está a chave?

Gregório – Tenta usar a chave da sala do padre. Quem sabe não encaixa?

Gustavo tenta, porém a chave nem gira. Ele começa a tatear a parede, quando encosta na porta e ela se abre.

Gustavo – Mas olha só… Estava aberta o tempo todo.

Eles atravessam a porta. Sem querer, Gustavo chuta algo no chão. Quando se abaixa para ver o que era, encontra uma chave.

Gustavo – Só pode ser a chave dessa porta. Mas por que está no chão?

Gregório – Não sei… Mas quem quer que tenha vindo aqui por último a deixou cair sem perceber. (Ele olha para a frente) Veja, Gustavo, um corredor. Vamos ver até onde ele vai.

Eles atravessam o corredor subterrâneo e chegam à cavidade na parede do convento, onde só podem andar de lado. Ao final, uma surpresa. A porta secreta está aberta.

Gregório – Isso é muito estranho… Por que a porta que leva a um lugar tão bem guardado pela Igreja estaria aberta?

Gustavo – Olha só: tem um lampião no chão… Está apagado… Mas esse lampião não deveria estar na parede?

Gustavo pega o lampião e o coloca em seu apoio na parede. Insatisfeito com a posição do objeto, ele o troca com o lampião menor. Então, a porta se fecha. Gregório se lembra de algo.

– Flashback –

Dia da fuga de Gregório. Ele, Valentina e Agnella estão no quarto do padre.

Valentina –Estes lampiões à tua frente. Troque-os de lugar, colocando-os sobre seu apoio, ao mesmo tempo.

Agnella – Claro!

Gregório – Bem, se é assim que queres…

Gregório faz a troca. Blocos de pedra que estão na parede se movem, abrindo um estreito corredor dentro da grossa parede.

– Fim do flashback –

Gregório – Gustavo, esses lampiões são uma espécie de chave para essa passagem… E se um deles estava no chão, com a passagem ainda aberta, isso significa…

Gustavo – Que quem quer que tenha deixado esse lampião no chão, deve ter saído daqui com pressa. Talvez até tenha sido agora, ao perceber nossa presença… Gregório, eu acho que precisamos investigar melhor isso.

Gregório – Mas e Valentina? Eu vim aqui para resgatá-la e fugir com ela!

Gustavo – Amanhã, antes de irmos embora, eu te ajudo com isso. Agora, se tu quiseres, podes ficar aí me esperando. Eu quero ver se descubro quem esteve aqui.

Gregório – Mas isso é muito perigoso, Gustavo! Ninguém pode saber que estamos aqui!

Gustavo – Não importa. Eu irei arriscar.

Gregório – Então eu irei contigo.

Pé ante pé, eles saem da antessala da irmã Francisca. O silêncio domina o local. Um som longínquo de passos chama sua atenção. Eles decidem segui-lo. Com dificuldades, chegam até a sala de entrada do convento. A porta está fechada. Eles tentam abri-la, e depois procuram sua chave, mas sem sucesso.

Gregório – Eu confesso que eu não entendi essa tua vontade repentina de seguir esses passos. Afinal, qual a importância disso tudo?

Gustavo – Eu estou um pouco confuso ainda com relação ao que eu vi hoje, mas acredito que eu sei, sim, quem era essa pessoa. Tu também sabes, não é? Só pode ser a única pessoa que deve ter acesso àquele recinto subterrâneo. Quer dizer, se alguma outra freira ou noviça não já o tiver descoberto, como nós fizemos.

Gregório – Não acredito que… Quer dizer, é possibilidade mais provável. (Surpreso) Irmã Francisca? Mas o que ela fazia a essa hora ali? E para onde ela estava indo que nós não a podíamos ver? Não teria que sermos nós a fugir dela? Por acaso tu tens essas respostas, Gustavo?

Gustavo – Eu… Não sei… Vamos, temos que voltar. Talvez com o tempo nós descobriremos o que aconteceu aqui.

Cena 08: Nave da Igreja del Fiume. Dia seguinte. Manhã.

Edetto, Izabella e Santorini estão no local.

Izabella – Mas onde está Gustavo? (Fala alto) Filho, precisamos ir embora!

Edetto – Padre, mais uma vez agradeço ao Senhor por ter sido tão cordial conosco, e ter nos abrigado aqui por essa noite. Precisamos voltar agora, porque já faz muito tempo que deixamos nossas terras.

Santorini – Meu filho, você sabe que a casa de Deus sempre está aberta para seus servos. Eu espero vê-los de volta outras vezes.

Edetto – Talvez, padre. Só Deus sabe o que pode acontecer, não é?

Francisca entra na igreja, trazendo Valentina amarrada.

Francisca – E aqui está a tua serva. Pronta para retornar às terras de tua família, onde foi criada e de onde nunca deveria ter saído.

Valentina – Para voltar à prisão por impostos; à prisão da terra!

Edetto – Calada, Valentina! Irmã, por favor, recoloque o pano que servia de mordaça a Valentina. Fará bem a ela evitar que diga coisas erradas.

Izabella – Bem, agora só falta encontrarmos Gustavo para irmos embora, não é?

Giancarlo entra na igreja. Todos ficam surpresos.

Giancarlo – Errado. Antes, eu gostaria de conversar com o senhor, senhor Edetto.

Edetto – Comigo? O que o senhor quer comigo? Me perdoe, mas eu preciso prosseguir a viagem para meu feudo.

Giancarlo mostra algo a Edetto.

Giancarlo – Não sem antes me explicar o motivo do seu interesse, naquele dia, por esse colar. O senhor chegou a questionar a origem dele. De um colar de família, que nunca havia sido visto pelo senhor antes. E então?

Edetto – Eu já lhe disse. Eu apenas o achei bonito, pensei em adquirir um desses…

Giancarlo – Não… Deve existir algo além disso para o senhor ter me perguntado de quem meu pai o ganhou. E eu sugiro que esteja disposto a terminar logo essa conversa, porque o senhor e sua família não sairão daqui até que a verdade seja dita.

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