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Cantiga de Amor

Capítulo 39 – Cantiga de Amor

Cena 01: Região portuária. Em frente à Igreja del Mare.

Pero – Brás! Brás está vivo! Mas, mas, era para ele estar morto! O que será que aconteceu? Será que o confundiram com alguém quando ele estava partindo? Aliás, era para ele também estar em Jerusalém…

Mais à frente, Brás e Marlete começam a caminhar em direção ao porto.

Pero – (Grita) Brás! Brás, me espere aí!

No entanto, eles aceleram o passo. Pero decide segui-los. Em pouco tempo, eles desaparecem.

Pero – Para onde eles foram? Será que foram para onde estou pensando?…

Cena 02: Região portuária.

Brás e Marlete se encontram com Giancarlo e Cecília.

Cecília – Bem, então vamos, pai? Não é isso que o senhor quer? Vamos voltar logo para casa e acabar com toda a sua preocupação e inquietação com relação a mim. É só uma pena que, enquanto uma pessoa da família, tenhamos que continuar convivendo com Marlete. Eu estou muito decepcionada contigo, minha prima.

Marlete – Ah, então o senhor já contou sua história a Cecília, não foi? Olha, minha querida, eu sinceramente não me importo tanto com tua decepção, sabe? Acho; ou melhor, tenho certeza de que deverias me agradecer por estares agora livre daquele crápula do Gustavo. Mas isso é passado, não é? Vamos embora desse lugar.

Brás – Isso. Essa península não me traz boas lembranças.

Giancarlo – Eu sinto muito se irei desapontá-los, mas nós não iremos voltar para casa.

Marlete – Como? O senhor só pode estar maluco. Iremos morar aqui agora? E os teus negócios em Termes? E o tesouro?

Giancarlo – Sempre esse tesouro. Sempre esse tesouro! Esqueça-o, Marlete! E nós não iremos morar aqui; eu não sou louco. O que eu quero agora é ir até aquele senhor, pai de Gustavo, e tirar satisfação com ele sobre determinado assunto.

Cecília – É sobre… Gustavo?

Giancarlo – Claro que não! É outra coisa. Algo que me deixou intrigado.

Marlete – É sobre o colar, não é? O colar de Cecília, sobre o qual ele te interrogou. Porém eu pensei que isso não o tivesse incomodado tanto.

Giancarlo – Não fiquei incomodado. Porém admito que estou bastante curioso. O fato de ele me abordar para tratar do colar, e não do seu filho, é bastante estranho. E eu quero saber o motivo real de ele ter feito isso.

Cecília – Mas, meu pai, nós nem sabemos para onde ele foi. Como o alcançaremos?

Giancarlo olha para Brás.

Brás – O senhor quer que eu seja seu guia? Mas eu nem sei se conheço o caminho que eles estão tomando.

Giancarlo – Ah, por favor, não sejas hipócrita! Tu disseste que vieste do mesmo lugar de onde ele veio, e no qual ele se apaixonou por outra mulher. Nesse caso, tu conheces o caminho.

Brás – Mas como poderei ter certeza de que eles irão para o mesmo lugar?

Giancarlo – Certeza, nós não temos. Mas eu estou decidido a tentar. E quanto a ti, Cecília, nem te aproximes de Gustavo.

Cecília – Tudo bem, pai.

Brás puxa Marlete para o lado, e conversa baixo com ela.

Brás – Eu não posso voltar para o povoado. Isso seria suicídio! Eu preciso pegar a minha parte nesse tesouro antes disso!

Marlete – Presta mais atenção, e pensa! Se meu tio quer interrogar o pai de Gustavo por algum assunto relativo ao colar, é porque isso tem a ver com o tesouro! E tu também não podes dar espaço para desconfianças. Tu não conheces o lugar? Quando chegarmos lá, é só te esconderes. E eu espero que essa viagem não dure muito tempo.

Eles voltam a Giancarlo e Cecília.

Giancarlo – E então, Magno?

Brás – Tudo bem, senhor. Eu aceito guiá-lo até o destino que queres.

Giancarlo – O lugar de onde vieste.

Pero – O Povoado das Hortaliças.

Todos olham para Pero, que apareceu sem ser notado. Brás leva um susto, mas tenta disfarçar. No entanto, seus olhos permanecem alertas e ameaçadores para Pero.

Pero – Eu irei com vocês.

Cecília – Pero? Tu não disseste que ficarias aqui? Por que decidiste voltar?

Pero – Por que todos do povoado, em especial uma pessoa, precisam saber a verdade sobre esse homem. (Aponta para Brás.) Ele se chama como mesmo? Magno? Sinto muito, senhor, mas eu e sua mulher, Inês, que, ao que me parece, havia aportado no mesmo navio que o seu, o conhecemos por outro nome. Brás da Mata.

Brás – (Raivoso, mas um pouco desconcertado) Mas, mas, isso é uma mentira deslavada! Não acredites nesse homem, senhor! Ele está mentindo!

Giancarlo – Mesmo? Senhor… Pero, não é? O senhor tem certeza do que dizes?

Pero – Claro que sim! Qual não foi a minha surpresa agora há pouco, quando o vi saindo da igreja, acompanhado dessa mulher (aponta para Marlete)! Era ele! Brás! Esse homem saiu do povoado, assim como Gustavo, para lutar na Guerra Santa em Jerusalém. Só que depois o padre nos disse que ele havia morrido ainda no navio, e que o corpo tinha sido jogado ao mar! Mas ninguém nunca o viu realmente morto. Porque não era ele! Me diz, Brás! Por que isso?

Brás – Tu estás doido! Maluco! Nunca nessa vida eu o vi!

Cecília – Será mesmo? Estás muito nervoso, Magno.

Giancarlo – Ou Brás… Eu me lembrei de uma coisa. Me diz, homem, por que te trancaste no navio depois que Inês apareceu? Isso foi uma coincidência? Digo isso porque a história desse homem parece muito plausível. Tu sabias disso, Marlete?

Marlete – Não! Nunca soube! Confesso que a revelação que ele me fez, nos fez, sobre Gustavo, foi bastante importante, e que eu permiti sua companhia por causa disso. Mas eu nunca desconfiei dessa história!

Brás – Então é assim? Todos contra mim! Pois eu assumo! Eu assumo isso! Um homem morreu enquanto ainda estávamos próximo a esse porto! Porém o capitão jogou-o ao mar, sabe lá Deus como, achando que ele era eu. E quando eu soube, eu só decidi não desmentir isso porque eu não queria que ninguém soubesse que eu estava em busca desse tesouro, e assim eu poderia surpreender a minha mulher! Mas se tu estás pensando que eu contarei a Inês a verdade, estás enganado! Eu quero, antes, esse tesouro para mim!

Giancarlo – Tu não terás nada, entendeste? Chega de devaneios! Tu nos levarás até o teu povoado, mas terás que contar a verdade.

Brás – Eu ainda posso fugir.

Pero – Eu me encarrego de garantir que isso não aconteça. Encontrei algumas cordas no caminho para cá, e achei que elas seriam úteis.

Pero amarra as mãos e os pés de Brás.

Pero – Agora tu sentirás um pouco do que fizeste Inês passar. Quanto ao senhor, Giancarlo, pode ficar tranquilo. Eu o levo até o Povoado das Hortaliças.

Cena 03: Estrada.

Em uma carroça, na estrada que sai do porto, Edetto está guiando o cavalo. Valentina, com pés, mãos e bocas amarradas, vai deitada atrás dele. A uma distância considerável, andam outras duas carroças. Uma é guiada por Gustavo, que tem ao seu lado sua mãe, Izabella. A outra carroça é guiada por Adelmo, que leva com ele Inês, Agnella e Gregório.

Edetto – Agora eu quero ver se aquele seminarista conseguirá te libertar novamente, Valentina.

Izabella – Vamos, Gustavo, não fiques cabisbaixo. Será melhor para ti se ficares em casa, e casares com a mulher certa. Uma filha de senhores feudais.

Gustavo – Não sei, mãe. Não sei.

Adelmo – Agnella, eu não quero que fiques preocupada. Eu te amo de verdade. Um dia tu reconhecerás isso.

Agnella – Porém eu não te amo. Eu quero apenas distância de ti. Só não abandono essa carroça porque, se o fizer, nunca mais verei Gustavo.

Inês – Ah, Agnella, eu sinceramente já cansei de te ouvir falando nele! Ou tu reconheces e aceitas o amor de meu irmão, ou viverás amargurada para sempre! Esqueças Gustavo! Ele não te ama! Percebes o que aconteceu comigo? Menosprezei a Pero, e agora só me resta voltar para casa e viver a minha viuvez.

Gregório – E tudo o que eu preciso fazer é resgatar Valentina… E voltar à liberdade…

10 dias depois…

Cena 04: Igreja del Fiume. Final da tarde.

O padre Santorini está na nave, com a irmã Francisca, quando uma carroça para em frente à igreja. Um homem desce, trazendo uma mulher consigo.

Santorini – Edetto! Que bom vê-lo! Mas… Quem é essa?

Francisca – Valentina! Claro! Tu conseguiste trazer a fujona de volta! Muito bem!

Edetto – Olá, irmã. Olá padre! Sua bênção!

Santorini – Deus te abençoe!

Valentina se debate, mas não consegue nem falar.

Edetto – Por favor, irmã, eu gostaria que a senhora levasse Valentina para o seu convento, para que ela ficasse lá até amanhã. Nós pretendemos passar a noite aqui. Seria possível, padre?

Santorini – Claro que sim, meu filho! A irmã Francisca levará Valentina agora. Não é, irmã?

Francisca – Bem, está certo. Mas eu volto logo. Gostaria de saber como conseguiste trazê-la.

Valentina se debate ainda mais, porém as cordas não lhe permitem resistir contra Francisca. As duas saem.

Santorini – Mas, a propósito, onde está sua mulher?

Edetto – Ela deve estar chegando, junto com meu filho. Eu tive que vir na frente para que o seminarista não tentasse soltá-la.

Santorini – O senhor quer dizer que Gustavo está de volta? E Gregório está vindo? E outros? Adelmo, Inês, Agnella e Pero? Estão vindo, também?

Edetto – Acho que apenas o último não. Todos os outros devem chegar logo, logo.

Duas carroças param em frente à igreja. Os viajantes descem.

Santorini – Mas olha só! Estão quase todos aqui. Até quem eu não esperava que estivesse; não é mesmo, Gustavo?

Gustavo – Padre, eu…

Santorini – Calma, daqui a pouco tu me explicarás o que for preciso. Onde está Pero, Inês?

Inês – Ele resolveu ficar no porto. Me abandonou. Por isso eu voltei. Eu… Reconheço que errei, padre. Deveria ter ficado no povoado.

Santorini – E quanto ao romance com Pero? Não deverias estar arrependida também?

Inês – Sim, sim. Foi um grande erro ter feito isso.

Santorini – Que bom, minha filha. Esse é um grande passo para o perdão de Deus.

Adelmo – Padre, nós passamos aqui apenas para avisá-lo que voltamos, e para pedir a sua bênção. Mas nós queremos ir para nossas casas, enquanto ainda é claro.

Agnella – Fale por ti, Adelmo. Eu ficarei aqui, com Gustavo.

Izabella – Por favor, padre, não permitas essa insanidade. Deixe-a ir para sua casa. Se o senhor tiver algum assunto para resolver com essa moça, resolva amanhã, depois que formos embora.

Agnella – Não! Vocês não podem ir embora assim!

Santorini – Minha cara, ouça esse rapaz que te acompanhou até aqui, e vá para casa, para rever seus pais. É a atitude mais sábia. E quanto a ti, Inês, gostaria de vê-la amanhã.

Adelmo – Vamos, Agnella. Amanhã, eu ou minha mãe voltaremos com Inês, padre.

Adelmo puxa Agnella, que vai à força. Inês os acompanha.

Santorini – E tu, Gregório, não estás arrependido por ter largado a tua chamada, a chamada de Deus, para fugir com uma serva? O que fizeste foi muito grave, e me admira que o seu senhor não o tenha mandado prender…

Edetto – Ainda. Eu não fiz isso por causa do senhor, padre, porque sei que tens apreço por ele e sei que ele fugiu enquanto estava nessa igreja. Porém ai de ti, rapaz, se tentares fugir com Valentina novamente! Eu o prenderei na mesma hora!

Gregório – Mas onde está ela agora? Para onde o senhor levou Valentina?

Cena 05: Convento. Quarto escuro.

Francisca jogou Valentina no chão do quarto, e tirou sua mordaça.

Francisca – Muito bem, (fala em tom jocoso) irmã Valentina. Agora que tu foste presa por teu senhor, não precisas mais fingir ser uma noviça. (Fala com um tom altivo) Mas deixa-me te confessar uma coisa. Desde o dia em que apareceste aqui, eu desconfiei que não querias ser freira. Que havia algo errado em tua entrada para esse convento. Até… Mexi em tua comida para justificar o castigo que te impus. E aí, depois, tu fugiste. E agora eu tenho a chance de te castigar de verdade pela tua fuga. Porém não posso fazer isso, afinal tu és serva de Edetto, e ele pode se enfurecer comigo. Ah, mas que eu tenho vontade de te castigar com cera de vela ou com um cipó, eu tenho. Porém prefiro que o Senhor trabalhe em tua mente aí, nesse chão sujo, cheio de ratazanas e baratas, e te faça refletir sobre tua verdadeira escolha. Amanhã, tu irás embora, e então te verás longe de mim. Queres falar alguma coisa?

Valentina – Não tenho nada para falar para a senhora, irmã Francisca. A não ser que eu sempre tive repulsa a esse lugar. A essa prisão. E que eu não me importo com nada que for feito comigo. Já suportei muita coisa, e nada mais me assusta. Tenho certeza de que Deus sempre esteve ao meu lado.

Francisca – Não blasfemes! Porque Deus te ouve, e irás te castigar severamente por isso! E agora, eu preciso voltar à igreja. (Fala ironicamente) Passar bem.

Ela sai rindo. Dentro do quarto, Valentina cospe no chão.

Cena 06: Igreja del Fiume.

Edetto – Agora, tu não poderás mais tocar em um fio de cabelo de minha serva. E eu espero que isso tenha ficado bem claro!

Santorini – Eu acho que ele entendeu. Não é, Gregório?

Gregório – Sim. Eu entendi.

Ele vai saindo. O padre o segura.

Santorini – Ainda não me explicou por que fugiu da sua ordenação.

Gregório – O senhor não entendeu? Eu descobri que amo Valentina, que o meu lugar não é tomando conta uma igreja!

Santorini – Meu filho, esse assunto é muito sério. E eu quero conversar contigo longe dessas pessoas. Vá para o seu quarto. Depois falarei com você.

Ele sai. Santorini se aproxima de Gustavo.

Santorini – Pois bem, Gustavo. Eu não o esperava por aqui. Achei que, nesse momento, estaria ajudando nossos irmãos a vencer os mouros. O que, aliás, pelas primeiras notícias que nos chegaram, está sendo bastante difícil.

Gustavo – Mas isso com certeza não é pela falta de um único homem.

Edetto – Filho! Respeite o padre!

Santorini – O que eu quero saber é por que você já voltou. Aconteceu alguma coisa que o fez desviar a rota e voltar. O que foi? E por que apareceu aqui junto com os outros?

Cena 06: Povoado das Hortaliças. Casa de Enzo.

Enzo, Prudência, Agnella, Adelmo e Inês estão na sala.

Enzo – Muito obrigado por ter trazido nossa filha de volta, rapaz. Podes ter certeza de que tu terás a tua recompensa.

Agnella – Como assim, recompensa? O que o senhor quer dizer com isso, meu pai?

Enzo – Ora, minha filha. Eu quis dizer que eu te casarei com Adelmo! Quer seja a tua vontade, quer não!

Adelmo – Não é uma ótima notícia, cara donzela?

Agnella – Não! Nunca será!

Agnella corre para o quarto.

Prudência – Me desculpe, Adelmo. Eu vou trazê-la de volta para cá.

Adelmo – Não se preocupe, senhora. Eu e Inês já estamos indo para casa. Passamos apenas para trazer Agnella. Vamos, minha irmã, Nossa mãe nos espera.

Inês – Vamos. Vamos para a casa de nossa mãe. Não quero voltar para a minha casa hoje.

Adelmo – Passar bem, senhores. Até mais.

Ele sai. Prudência vai até o quarto de Agnella.

Prudência – Agnella, tu não achas que tens de parar de correr para o teu quarto sempre que fores contrariada? Precisas aprender a aceitar nossas decisões, minha filha!

Agnella – Mas eu não aceito me casar com Adelmo!

Prudência – Ele é um rapaz tão bom. Ele é íntegro! Apesar de algumas coisas que ele possa ter feito, como praticamente nos chantagear para propor esse casamento. Mas de qualquer modo, ele te ama!

Agnella – Mas eu amo Gustavo! E a senhora, a senhora deveria ter me ajudado, a senhora prometeu me ajudar a casar com Gustavo! Lembra do dia em que eu contei à senhora sobre o motivo da outra visita de Adelmo, e que eu só poderia me casar com Gustavo por causa do que nós fizemos? A senhora prometeu me ajudar! Mas o que a senhora fez? Me internou no convento, e agora está querendo me casar com Adelmo!

Prudência – Mas eu fiz o que pude! Quando fui à igreja, Gustavo já havia ido embora! E Adelmo parecia estar morto! Eu tive que convencer seu pai a inscrevê-la no convento, porque, caso contrário, nenhum homem aceitaria se casar contigo! E agora, Adelmo se dispôs a ser teu marido, mesmo depois do que fizeste com Gustavo. Percebes, minha filha, que eu só fiz o que era melhor para ti, para evitar problemas por causa do teu erro com esse rapaz?

Enzo entra no quarto.

Enzo – (Enfurecido) Eu ouvi mal ou tu já sabias, Prudência? Já sabias do pecado que aquele rapaz cometeu com Agnella, e não me contaste nada? Preferiste agir no silêncio? Foste conivente com o erro de nossa filha! Foi isso, mulher, não foi? Vamos, não mintas mais para mim!

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