Capítulo 23 – Cantiga de Amor
Cena 01: Convento. Antessala da sala da irmã Francisca. Tarde.
Quando Valentina entrou no espaço aberto na parede, carregando um dos lampiões, notou que ele não era um simples buraco. Dava para andar nele. Ela então, andou um pouquinho, quando visualizou uma escada, para baixo. Desceu.
Valentina – Isso… É um corredor subterrâneo! Mas onde fica o final dele?
Valentina andou um pouco, até encontrar uma porta. No momento em que ia abri-la, a luz do lampião se apagou.
Valentina – Que raiva! Preciso voltar agora.
Ela segue o mesmo caminho que tomou, até chegar novamente à antessala. Ia pegar o outro lampião, mas teve a impressão de ouvir passos.
Valentina – Preciso sair daqui. Mas como fechar isso? Será que é assim?
Ela trocou os lampiões de lugar mais uma vez. Então, os blocos de pedra se reorganizaram e a parede voltou ao normal. Então, saiu da antessala, mas não viu ninguém.
Valentina – Ufa! Não foi dessa vez. Mas eu prometo a mim mesma que ainda descobrirei aonde vai dar esse corredor.
Cena 02: Povoado das Hortaliças. Casa de Pero. Tarde.
Pero havia voltado mais cedo das terras.
Pero – É hora de ver a minha Inês!
Então, ele sai, e vai em direção a um ponto da floresta próximo de sua casa, mas escondido da vista do povoado. Lá, espera um pouco, até que Inês chega.
Inês – Camponês!
Pero – Minha flor do campo! Como estás bela hoje!
Inês – Obrigada, Pero. Demorei muito para chegar?
Pero – Não. Eu espero o tempo que for necessário quando se trata de estar contigo.
Inês – Que bom. Assim, poderemos tornar esse lugar nosso ponto de encontro, até eu findar meu luto.
Pero – E eu pedir a tua mão em casamento.
Inês – Isso mesmo.
Eles sorriem um ao outro. Se abraçam, e então, dão um beijo.
Cena 03: Convento. Tarde.
Valentina estava saindo para seu quarto, quando foi interpelada pela irmã Francisca.
Francisca – Olá, irmã Valentina!
Valentina – Oi, irmã Francisca.
Francisca – Percebo que estavas limpando o convento.
Valentina – Sim, senhora. Mas, graças a Deus, já terminei.
Francisca – Muito bem. Não fazes mais que tua obrigação, claro. Aliás, irmã Valentina, estive pensando sobre certas coisas que vi, e decidi que não precisarás mais realizar a limpeza, nem da igreja, nem do convento.
Valentina – (Fica alarmada) Mas… Por quê? Estive limpando mal, foi isso? Eu prometo que me esforçarei e…
Francisca – Não. Está decidido assim. Confesso até que me surpreendo com tua reação, irmã Valentina. Sabe, pensei que foste achar essa uma decisão boa. Menos trabalho, não é mesmo?
Valentina – Não… Sim… Mas…
Francisca – Mas já que estás tão disposta, colocarei a irmã para limpar o convento duas vezes ao dia aos sábados e domingos. Bem, preciso ir. Tenha uma boa tarde. E até daqui a pouco.
Valentina – Até…
Valentina, então continuou o caminho até seu quarto. Ao chegar lá, encontrou Agnella inquieta, caminhando de um lado para o outro.
Valentina – Algum problema? Estás agitada.
Agnella – Ah, é verdade. Sabe, eu tinha ouvido a freira mandar meus pais conversarem com o padre, quando ele chegasse de viagem. E hoje foi a missa oficial de minha apresentação, e isso me deixou mais aflita ainda. Porque eu não quero ficar… Eu preciso sair. Eu preciso encontrar Gustavo!
Valentina – Calma, minha querida. Precisas ficar calma. (Ela pega Agnella pelo braço e as duas sentam em sua cama.) A propósito, tu não me falaste quase nada sobre ti, sobre ele. Apesar, é claro, de eu ter uma ideia.
Agnella – Eu… Sempre fui uma camponesa, nada além. Mas Gustavo, um filho de senhores feudais. Um homem belo… Nós nos amávamos, nós nos… Bem, mas ele foi embora. (Uma lágrima cai do olho.) Porém eu tenho certeza de que ele me ama. Ele deve ter tido que resolver algum problema, mas ele vai voltar. (Categórica) Eu sei. Mas… E se ele voltar, e eu estiver aqui? (Outra lágrima cai. Ela suspira) Aliás, tu também não me falaste nada sobre ti. Vamos, diga-me. Até hoje, só sei teu nome.
Valentina – (Fica séria) Agnella, não fiques zangada, mas eu te garanto que, sobre mim, só precisas saber meu nome mesmo. Minha história não é muito interessante. Não como a tua. Nunca tive um amor… (Em pensamento) Amar… (Em voz alta, novamente) Mas continue o que estavas falando.
Agnella – Então, é por isso que eu estava pensando. Deve haver um modo de fugir, não é? Se a gente seguir pelo corredor principal, e chegar até a primeira sala, a gente pode pegar o outro corredor e chegar à porta de entrada. Daí…
Valentina – Não! Não, não! Não é tão fácil! Esse caminho, por onde viemos, está sempre vigiado. Não dá para fugir por aí. Mas não te preocupes. Nós encontraremos outro modo. (Pensando) Eu só consigo pensar em um único jeito, ainda que, agora, sem a desculpa da limpeza, eu não possa andar mais com certa liberdade. Mas aquela porta… Ela dá em algum lugar, e eu vou descobrir!
Cena 04: Povoado das Hortaliças. Casa de Simone. Tarde.
Adelmo estava sentado com sua mãe na sala.
Adelmo – Eu não posso ficar assim, desmemoriado. Mãe, diga para mim o que aconteceu depois do casamento de Inês. Eu quero ouvir. Eu preciso me lembrar de tudo.
Simone – Eu não sei, meu filho. Tenho medo dessa tua dor de cabeça.
Adelmo – Não precisas. Ela já está melhorando. Vamos, eu quero saber.
Simone – Tudo bem. Olha, Inês e Brás se casaram e se mudaram para a casa de Brás, que fica em frente à casa de Enzo…
Adelmo – (Levando a mão à cabeça) Ai!
Simone – Eu não te falei, filho! Eu te falei que seria ruim.
Adelmo – Continue, mãe, por favor… Pelo menos me diga sobre Agnella. (Sente a dor novamente) Ai!
Simone – Não. Tu lembrarás sozinho. O padre nos garantiu que é só rezarmos. E conversa acabada.
Simone sai, deixando Adelmo insatisfeito.
Cena 05: Navio. Popa. Tarde.
Gustavo está sentado. Lembra de Agnella, e, então, alguns versos saem de sua boca.
Gustavo –
Donzela de lindos olhos
Não posso te ter aqui
Nem ver-te bela a sorrir
Por isso eu quase choro.
À espera de ti estou
Esperando que o destino
Te traga a mim, e sorrindo
Dar-te um beijo eu vou.
Ele se levanta, e olha para o mar.
Gustavo –
O mar separa mi amor
O mar aumenta mia dor
O mar…
Gustavo – Não, esses versos não estão bons! Pelo menos não estão como os de Marconi! Mas são para ti, Agnella. Para ti.
Ele se senta novamente. Pega o colar.
Gustavo – Esse colar… O que será que me aguarda nessa tal cidade? (Gustavo divaga.) Esse Giancarlo, um comerciante… Meu avô nunca confiou em comerciantes, sempre me aconselhou a nunca confiar neles… Mas se bem que ele ficou louco com isso, coitado. Porém eu cumprirei o que prometi a Marconi. Mas eu só espero poder voltar para Agnella depois. Nada mais me importa, nada mais me importará.
9 dias depois…
Cena 06: Povoado de Buon Terreno. Manhã.
Gregório estava na casa de seu pai. O povoado fica próximo à Igreja del Fiume.
Ottavio – Meu filho! Há quanto tempo não nos vemos! E olha que há meses tu estás bem perto! Mas, mesmo assim, não vieste me ver! Sabes como me é difícil viver nessa casa sem tua mãe…
Gregório – Eu também sofro com a falta dela, pai. Mas precisamos ser sempre fortes, não é? O senhor mesmo me ensinou isso. E o senhor sabe que eu não posso deixar a Igreja. Só vim aqui para lembrar ao senhor da minha ordenação.
Ottavio – (Abre um sorriso) Ora, mas se tu pensas que me esqueci disso, estás muito enganado! Pelo contrário, todos os nossos vizinhos já sabem desse tão lindo acontecimento. Meu filho, padre! Sabe, Gregório, faz tanto tempo desde que partiste para o seminário, que até pareceu que esse dia nunca chegaria. E já é amanhã!
Gregório – (Tentando demonstrar felicidade) Sim, pai, é verdade. Tantas lutas, sofrimentos, mas chegou o dia…
Ottavio – (Olha para o lado) O dia mais feliz da minha vida, desde que perdi a Susana. (Vira o rosto abruptamente) Não te preocupes, eu estarei na igreja. Ela fica perto, o que torna tudo mais fácil. Aliás, mais perto até que a outra para a qual eu vou; mas, cá pra nós, as freiras que a frequentam são mais simpáticas. Mas eu irei, bem cedo, para prestigiar esse teu momento.
Gregório – Então, pai, adeus. Amanhã nos vemos.
Ottavio – Adeus, meu filho. E reze por mim!
Eles se beijam, e Gregório sai em direção à igreja. Em dado momento do caminho, passa por um trovador sentado à porta de uma casa.
Trovador –
“Senhora minha, desde que vos vi,
lutei para ocultar esta paixão
que me tomou inteiro o coração;
mas não o posso mais e decidi
que saibam todos o meu grande amor,
a tristeza que tenho, a imensa dor
que sofro desde o dia em que vos vi.”
Gregório apressa o passo.
Gregório – Por que fui ouvir esse homem? Agora pensamentos querem vir, querem me dizer coisas… Preciso afugentá-los.
Nessa intenção, ele passa o caminho todo até chegar à Igreja del Fiume, e passa pelo padre, sem perceber que ele estava lá.
Santorini – Meu Deus, e Nossa Senhora, sua mãe, que esse rapaz seja um bom padre! Que ele possa ficar firme nesse propósito!
Cena 07: Navio. Manhã.
Gustavo ainda não tinha saído do navio. Ouviu alguém gritar algo, do lado de fora, que o fez sair.
Gustavo – Acho que chegamos…
Ao sair, viu o navio se aproximar de uma praia. Um pouco próxima a ela, havia um muro, extenso, com um portão ao meio. Ele estava aberto, e havia pessoas indo e vindo. Dentro, podiam ser vistas casas. Alguém, próximo a Gustavo, repetiu o que ele havia ouvido antes.
Homem 1 – Chegamos a Termes!
Homem 2 – Uma cidade, até exótica em um mundo rural como esse. Nossa primeira parada. Alguns homens irão descer num bote para abastecer o navio para a viagem.
Gustavo aproveitou que todos tinham saído para ver a cidade, entrou no navio e se dirigiu ao seu “quarto”. Amarrou as suas coisas em um saco praticamente impermeável que achou na despensa do navio, e saiu por outra porta, se escondendo em um lugar vazio na lateral da embarcação. Esperou o navio ancorar mais perto da praia. Então, inspirou profundamente, para se encorajar. Pulou na água e nadou um pouco, o mais perto possível do navio, até poder ficar em pé, sempre tomando cuidado para não molhar muito suas coisas. Então, correu, e, para que não fosse visto, se misturou às pessoas que entravam e saiam de Termes. Atravessou o portão. Quando julgou estar seguro, pôde suspirar.
Gustavo – Então essa é a cidade onde deve estar o tesouro que Marconi me confiou… O que encontrarei aqui? Sinceramente, não sei. Mas que Deus me ajude a partir de agora.
Bem que você me disse para não por tá.tantas expectativas nessa guerra, então é nesta cidade que Gustavo ficará e não mais partirá para a Guerra, acho que mesmo aqui ele vai passar por muita coisa.
Agnella também está passando por um turbilhão de coisas, está querendo fugir de sua missa de apresentação.Outra que também não está satisfeita em está ali é Valentina que acha está naquela porta secreta sua chance de sair.
Já Gregório vive sendo atormentado pelos seus pensamentos, o que será que tanto lhe aflige? Está ligado a Valentina?
Adelmo está lutando para recuperar a memória, mas pelo visto de Agnella ele nunca esqueceu, quero ver o que fará quando souber que ela entrou pro convento!!!
😀
São tantas pessoas passando por coisas diferentes… Enquanto Gustavo e até mesmo Valentina e Gregório enfrentarão o desconhecido, Agnella e Adelmo estarão em busca de algo que querem e que lhes foi tomado. Os próximos capítulos serão bastante importantes. Não perca!
Está aí o vigésimo terceiro capítulo de Cantiga de Amor. O que será que Gustavo terá pela frente?
O próximo capítulo traz uma parte dessa resposta. Mas traz um acontecimento importante: a ordenação de Gregório. O que esse dia reserva para ele? Não percam!
P.S: A cantiga ouvida por Gregório no povoado de Buon Terreno é de autoria de Afonso Fernandes e foi retirada do seguinte link: http://www.colegioweb.com.br/trabalhos-escolares/literatura/trovadorismo/as-cantigas-de-amor.html