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O Último Ano

Capítulo 10 – O Último Ano

O ÚLTIMO ANO

 

INCONDICIONAL

O sol já raiava quando Elis levantou para ir trabalhar, um tanto atrasada. A mudança de vida havia interferido também na rotina. Dormiu tarde e teve uma noite ruim de sono, acordando várias vezes.  Assim que ficou pronta para sair foi ao quarto de Elvis, pois como era de costume sempre lhe dava um beijo para se despedir. Mas quando entrou no quarto a cama estava feita e não havia sombra dele, o que era muito estranho. Ele não conhecia a cidade direito, não costuma sair sem avisar. Ela o procurou em outros cômodos do apartamento sem encontrar sequer rastros dele. Retornando ao quarto viu um bilhete caído no chão agitado pelo vento que entrava pela janela. Ela recolheu o papel e leu.

“MÃE, NÃO QUIS ACORDAR VOCÊ. TIVE QUE SAIR BEM CEDO, MAS EU VOLTO ANTES DO MEIO DIA. BEIJOS. EU TE AMO.”

Elis estava sentiu um inexplicável aperto no coração. Talvez fosse somente preocupação de mãe. Tentou ligar para Elvis, mas o celular só dava na caixa postal. Elis tinha o número de Eduarda e resolveu ligar para ela que atendeu prontamente.

ELIS: Duda?

EDUARDA: Oi… Dona Elis?

ELIS: Duda, bom dia meu amor. Me diz uma coisa, o Elvis está com você?

Eduarda silência no outro lado da linha.

EDUARDA: O Elvis?

ELIS: Já percebi que você está sabendo de algo. Eu acordei e não encontrei ele mais em casa. Saiu muito cedo, nem avisou, nem nada. E eu estou preocupada. Filha se você souber de alguma coisa, por favor, me diz.

EDUARDA: Então dona Elis eu vou lhe contar tudo. Porque eu também estou preocupada. Mas não briga com o Elvis, por favor.

ELIS: Conta logo Duda.

Eduarda começou a contar tudo que sabia para dona Elis.

 

Elvis já estava no Aeroporto Internacional de São Luís. Sentado próximo onde ficavam os banheiros, ele esperava apreensivo pelo momento que encontraria Diego. Nesse exato momento pelo saguão do outro lado do prédio, entravam Diego, Luciana e seus avós. Diego transparecia certa tranquilidade.

LUCIANA: Impressão minha ou você parece que se conformou com a ideia de ir embora de São Luís?

DIEGO: Estou calado porque estou analisando qual seria a melhor hora de detonar as dinamites dentro do avião.

LUCIANA: Sem graça.

ROSA: Meu filho não diga uma coisa dessas nem de brincadeira!

LUCIANA: Não liga para o que esse garoto fala mamãe.

DIEGO: Vocês vão ver. Até o meio dia esse atentado terrorista vai estar estampado em todos os jornais do mundo.

LUCIANA: Cala a boca e apresse o passo. O voo sairá daqui a pouco.

DIEGO: Antes quero ir ao banheiro.

LUCIANA: Logo agora? Porque não usou o banheiro quando saiu de casa.

DIEGO: Porque eu não programo a minha urina.

LUCIANA: Se voltar a me responder dessa maneira irei bater na sua boca!

Ivaldo então se aproximou.

IVALDO: Você não vai bater na boca de ninguém Luciana. Sua mãe e nem eu nunca batemos na sua!

LUCIANA: Esse garoto me tira do sério papai!

IVALDO: Já que você não sabe lidar com seu filho deveria deixar ele conosco aqui. Onde ele nasceu e cresceu. Eu não concordo que você leve o Diego para morar na Suíça. Você está sendo precipitada. O melhor seria deixa-lo aqui.

LUCIANA: Não mesmo. Para que? Para ficar se deitando com outros machos debaixo do nariz de vocês dois? Eu não criei o Diego para isso!

DIEGO: Você não me criou! Será que você não põe isso na cabeça?

LUCIANA: Cala a boca e vai logo usar o banheiro garoto! Esse moleque me tira do sério.

Então Diego sai em à procura dos banheiros. Luciana fica olhando o filho se afastar, pois Diego parecia a procura de algo além dos banheiros.

LUCIANA: Alguma coisa aqui não está me cheirando nada bem.

ROSA: Do que você está falando filha?

LUCIANA: Acho que o Diego vai aprontar alguma coisa.

IVALDO: Ah me poupe Luciana minha filha!

LUCIANA: Se ele não voltar em cinco minutos eu vou atrás dele!

Elis já estava a caminho do Aeroporto de São Luís. Eduarda havia contado o plano de fuga de Elvis e Diego. Elis achava que isso não iria acabar bem.

 

Caminhando pelo saguão, assim que Diego avistou Elvis, lhe deu um sinal para seguir ele até o banheiro. Elvis saltou do banco onde estava sentado e entrou no banheiro como se nada estivesse acontecendo. Assim que se encontram dentro do banheiro, os dois se abraçaram.

DIEGO: A gente precisa ser rápido. Minha mãe é esperta, pode até ser que já esteja desconfiando de alguma coisa.

ELVIS: Só precisamos sair daqui discretamente e pegar um táxi.

DIEGO: Você deveria ter pensado nisso e chamado um táxi para nos esperar lá fora.

ELVIS: Eu estava tão apreensivo que nem pensei nisso. Mas o João Pedro já me ligou e disse que já está te esperando.

Elvis abraça Diego com força. Antes que pudesse beijá-lo um passageiro entrou no banheiro constrangendo-os. Assim os dois saíram do local. Enquanto caminhavam pelo saguão apressados…

ELVIS: Você tem dinheiro?

DIEGO: Tinha cem reais guardados e alguns outros trocados.

ELVIS: Tenho aqui mais cento e cinquenta para você.

DIEGO: Não precisa Elvis.

ELVIS: Como não precisa? Você vai precisar de dinheiro para se manter fora de casa esses dias!

DIEGO: Eu me viro. Me dá essa mochila. Parece que está pesada demais para você.

Diego pegou a mochila de Elvis.

DIEGO: Nossa! Você guardou quantos quilos de chumbo nessa mochila?

Elvis não riu da piada porque se ateve outro detalhe.

ELVIS: Diego!

Elvis mostrou para Diego quem estava mais à frente deles. Ambos detiveram os passos. Era Luciana jorrando ódio pelo olhar vindo em sua direção. Diego não pensou duas vezes. Agarrou a mão de Elvis e saíram correndo. Luciana correu atrás dos dois gritando com histeria. Um alarde no saguão entre passageiros, bagagens e funcionários. O tumulto chamou a atenção de todos que estavam presentes no Aeroporto.

LUCIANA: Alguém segura esses dois! Por favor, alguém me ajuda! É meu filho que está sendo sequestrado!

Havia policiais presentes no local e ao ouvir os gritos de Luciana logo se puseram a seguir o casal. Jovens, Diego e Elvis corriam mais rápidos. As portas automáticas se abriram diante deles, que saíram do saguão do aeroporto deixando o prédio para trás.

DIEGO: Corre Elvis!

ELVIS: Vamos para a avenida!

Os dois seguiram correndo pela avenida do aeroporto até chegarem na BR – 135, uma avenida com imenso fluxo de veículos que é o único acesso de entrada à capital São Luís. O percurso para chegar à BR era um tanto longo, mas os dois corriam o mais rápido que podiam.

Elis que chegava no aeroporto entrava na avenida quando viu Diego e Elvis correndo na direção contrária. Ela freou o veículo que saiu cantando pneu no asfalto e saltou do carro. Seu coração quase saiu pela boca quando viu os polícias e Luciana correndo atrás dos dois.

ELIS: Ah não meu Deus! O que é que tá acontecendo aqui?

Elis saiu também se pôs atrás dos dois gritando por Elvis.

Diego e Elvis procuravam o momento certo para atravessar a BR, mas tinham pressa ou seriam agarrados, porém havia um imenso fluxo de carros naquele horário da manhã. Diego, precipitado, se adiantou e entrou na pista se desviando dos carros. Pneus derraparam, motoristas xingaram, mas Diego não ligou. Acreditava que Elvis lhe seguia, mas quando chegou do outro lado da pista viu que ele ainda estava parado.

DIEGO: Corre pro sinal!

Mas Elvis não ouviu. E então correu para alcançar Diego. Elis já estava bem próxima de Elvis quando viu ele correr para pista sem se dar conta dos carros.

ELIS: Elvis cuidado!

Os policias pararam. Luciana também parou. Tudo ao redor pareceu ficar em câmera lenta diante da cena que se desenrolava. Sons de pneus derrapando no asfalto ecoaram como uma triste melodia. Mal dera tempo de Elvis discernir qualquer coisa. Um carro em alta velocidade bem que tentou frear, mas atingiu Elvis em cheio. O impacto arremessou o corpo para longe, contra o vidro traseiro de outro carro. O corpo voou como um boneco de pano, sem vida, sem chance. Diego ficou vendo aquilo acontecer completamente sem reação… O corpo de Elvis deslizou do vidro trincado para o chão como um peso morto. Elis soltou um grito tão alto que pareceu abafar todos os outros sons do trânsito. Tudo parou.

Diego correu até o corpo de Elvis, mas não mais viu o seu rosto que agora era uma massa deformada banhada em sangue. O tom vermelho se espalhou no asfalto.

O motorista do carro que o atingiu saiu do veículo para prestar socorro. Logo muitas pessoas se aproximaram. Mas Diego se afastou. Aos prantos. Em desespero absoluto. ELVIS ESTAVA MORTO? Ele não podia acreditar no que estava vendo. Ninguém podia acreditar.

 

 

No Hospital de Urgência e Emergência Elis chorava na sala de espera. Quando o médico apareceu…

ELIS: Onde está meu filho? Já levaram para a UTI?

MÉDICO: Senhora, as lesões foram graves, muito graves. Fizemos tudo que podíamos para reanima-lo, porém ele não resistiu. Eu lamento senhora.

ELIS: Meu filho…?

MÉDICA: Perdemos ele.

Elis não conseguiu nem pronunciar uma palavra de lamento. Desabou em lágrimas e gemidos sendo amparada por enfermeiras. Inconsolável. A dor grande, bem maior do que se tivessem arrancando todos seus membros de uma única vez.

Diego, contra a vontade da mãe, chegou ao hospital em um táxi. Estava cheio de medo. Recorreu ao pouco de fé que tinha para acreditar que Elvis sairia daquela. Mas quando entrou na área de Emergência e viu Elis daquela maneira ele já sabia que as notícias não eram boas. Ele se aproximou falando entre lágrimas…

DIEGO: Não dona Elis, não me diga que…

Elis lançou um olhar piedoso. A enfermeira falou por ela.

ENFERMEIRA: Lamento filho. Não pudemos fazer muita coisa.

A notícia anestesiou Diego por um instante deixando-o de pés cravados no lugar onde estava. Em seguida saiu correndo, desviando de pacientes e enfermeiros. A visão embasada pelas lágrimas, as pessoas eram só borrões. Ele só queria chegar lá fora. E então gritou. De dor. De tristeza. Diego chorou como nunca chorou antes na vida. Porque Diego nunca havia chorado por amor.

 

 

 

No dia seguinte houve o velório de Elvis. Ninguém podia acreditar que Elvis estava ali no caixão. Morto. Todos mergulhados no mesmo clima de profunda comoção. Samara, Daniela, João Pedro, Jeremias, Charles, Chaminé e todos os alunos do terceiro médio, e professores também. Até Jarbas estava presente. Eduarda era amparada por outras colegas e contava para elas repetidas vezes sobre a última conversa que tiveram ao telefone na noite anterior.

Dona Elis estava do lado do caixão chorando bastante. Já Diego… Bom, Diego estava sentado em silêncio absoluto a certa distância do caixão. Não desgrudava os olhos de Elvis, olhos vermelhos e inchados, a ponta do nariz rubra. Todos o observaram quando se levantou e se pôs do lado do corpo. O caixão estava fechado. Olhou pelo vidro e fitou o rosto de Elvis, deformado, inchado e com escoriações. Nem de longe lembrava o rosto que encontrou todos os dias na escola e que amou como nunca amou ninguém. Desviou o olhar pretendendo não fixar aquela imagem na memória. Preferia o anjo que ele olhou pela primeira vez no segundo dia de aula do ano letivo.

Deitou uma flor sobre a tampa do caixão e desabou chorando por um instante, ali ficou até se recompor. Respirou fundo e falou sussurrando.

DIEGO: Eu te amo.

Alguns ficaram sem entender, outros já sabiam do romance dos dois por conta dos boatos que se seguiram após o acidente. João Pedro se levantou e aproximando-se de Diego, passou o braço por cima dos ombros do amigo e lhe deu apoio.

JOÃO PEDRO: Eu to aqui brother! Força.

Diego olhou para ele no fundo dos olhos. João Pedro assentiu com a cabeça. Diego baixou o olhar para o caixão e começou a falar depois de uns segundos de silêncio.

DIEGO: Pensem o que quiser, eu não vou ligar. Ninguém mais acreditava em mim. Eu próprio estava perdendo a fé em mim mesmo. Mas ele me ensinou que eu era bom e não sabia. Eu realmente não sabia se tinha algo bom dentro de mim. E não houve um dia sequer durante nosso… (Respirou fundo mais uma vez e falou a pleno pulmão) Namoro!… Não houve um dia sequer que eu não tenha sentido que ele acreditava em mim, que ele me amava e que eu deveria ser bom. Ele me fez conhecer um outro Diego. E não pensem que estou falando de sexualidade. Isso é o que menos importa. Mas estou falando de um Diego que estava aprisionado em mim debaixo de uma camada de egoísmo, arrogância e frustração. Eu deveria ter conhecido ele antes. Antes de cometer muitos erros. Mas foi no último ano que eu o conheci. O momento certo. Ainda há uma vida pela frente. Vida que ele não estará comigo. Mas tenho certeza que o sentirei todos os dias. Eu aprendi que não posso mais ter medo. Eu não era corajoso. Eu era valente, era diferente, eu aprendi.  No amor não pode existir medo. Eu perdi todo medo. Tanto que estou aqui falando tudo isso e pela primeira vez estou sendo corajoso. Eu não tenho mais medo. Eu tenho amor.

Alguém aplaudiu e outras palmas se seguiram a ela. Eduarda soluçava em meio ao choro. Diego caminhou até Elis e deu um forte abraço. Em seguida, voltou para onde estava sentado.

Naquela mesma manhã o corpo de Elvis seria levado para Brasília onde seria enterrado. Diego não poderia ir para o enterro. Elis, ao fim do velório, veio se despedir.

ELIS: Diego eu gostaria de lhe dizer uma coisa.

DIEGO: Pode falar dona Elis.

ELIS: Muito obrigado.

DIEGO: Não entendo.

ELIS: Porque meu filho morreu amando. Meu filho morreu amando você. Há gente que morre com ódio, raiva, mas o meu filho morreu no meio de uma atitude que representava o amor. Meio imprudente, mas quem nunca cometeu uma imprudência por amar? E eu fico grata por isso.

DIEGO: Não sei o que dizer dona Elis. Eu vou sentir tanta falta dele.

ELIS: Todos nós sentiremos filho.

DIEGO: Quero visitar você sempre que possível.

ELIS: Só se você for à Brasília.

DIEGO: Não vai mais morar aqui em São Luís?

ELIS: Pedi a empresa uma licença e eles me vão me transferir. Entenderam que São Luís, apesar de linda, vai me trazer lembranças dolorosas por conta do que aconteceu aqui. Eu estou indo embora hoje mesmo para perto dos meus familiares, vai ser melhor para mim. Estou me despedindo de você. Também já falei com Duda.

DIEGO: Eu estive pensando em aceitar a proposta da minha mãe e ir embora para a Suíça.

ELIS: Falando nela…

Luciana acabava de entrar no velório. Se aproximou de Elis e estendeu a mão.

LUCIANA: Meus pêsames.

ELIS: Obrigada.

LUCIANA: Quero pedir que me desculpe por ter sido grosseira. Você pode achar que a culpa é minha…

ELIS: As coisas precisam acontecer. E não há ninguém que apresse ou retardem elas além de Deus. Você não tem culpa nenhuma.

Luciana ficou calada por um instante.

LUCIANA: Eu sou mãe, assim como você. O que aconteceu foi lamentável. Eu imagino a sua dor e confesso que estou com vergonha pela maneira como agi.

ELIS: De que serve a vergonha se não para nos ensinar como não repetir os erros?

Luciana engoliu a seco.

LUCIANA: Se eu puder fazer alguma coisa… Eu soube que você está indo embora, então…

ELIS: Pode fazer sim. Posso pedir uma coisa?

Luciana se contorceu, mas, ao fim, consentiu. Elis segurou seus ombros e olhou-a nos olhos.

ELIS: Apenas ame seu filho.

Elis traçou um riso gentil no rosto e dando dois tapinhas em um dos ombros de Luciana se afastou.

ELIS: Bom, agora preciso ir.

Elis abraça Diego e sai.

Na despedida Diego ficou vendo o caixão sendo transportado para o carro que levaria Elis até o Aeroporto. Diego voltou a chorar. A memória se encheu de lembranças e Clarice Falcão parecia tocar em sua mente. O carro partiu vagaroso levando Elvis para sempre.

 

Dois dias depois, as aulas retornaram e Diego foi até ao Instituto Daniel de La Touche onde seria realizado uma homenagem a Elvis. Na sala do terceiro médio todos estavam reunidos em silêncio, ainda consternados.  A cadeira onde Elvis sentava estava lá, vazia. Todos depositaram uma flor sobre ela. O diretor Heitor falava.

HEITOR: Foi uma fatalidade perder desta maneira um rapaz tão brilhante no último ano de vocês aqui. Daqui em diante vocês tomarão diferentes rumos na vida de vocês e é uma pena que esse direito o Elvis não gozará. Seu destino foi decido sem sua participação e de maneira dolorosa. Vocês sentirão saudades do colega de vocês. Os professores também. A nós o que resta é superar. Espero que sigam o exemplo dele que foi um aluno exemplar. Esta é uma maneira de ter ele vivo, como exemplo. Um minuto de silêncio é o que peço. E no seu íntimo, conforme a fé que possuem, orem a Elvis.

O silêncio se estende. Ao fim…

HEITOR: Alguém quer falar alguma coisa, dar uma palavra?

Todos olham para Diego, mas ele apenas meneia a cabeça. Eduarda toma a palavra e presta sua homenagem. Professores também falam. E segue assim até o fim do primeiro tempo de aula. Diego ainda conversou com alguns amigos, mas quando estava se despedindo Eduarda o chamou.

EDUARDA: Se é verdade que as pessoas tem missão a cumprir na terra, o meu amigo morreu feliz. Olha quem é o Diego agora.

DIEGO: Você vai me deixar sem graça.

EDUARDA: Até parece!

Os dois riem.

EDUARDA: Sério, estou triste, mas também feliz, sei lá, é eu sou confusa, admito. Vocês se fizeram um bem danado.

DIEGO: Obrigado, magricela!

EDUARDA: Ah já vai me ofender? Estava bom demais para ser verdade. Desse modo não vou te mostrar uma coisa.

DIEGO: Ok, desculpa.

Eduarda tira da mochila um caderno pequeno de capa preta.

EDUARDA: Depois que liberaram o corpo do Elvis para o velório eu fui até o apartamento dele com a dona Elis. Pedi para entrar no quarto dele e pegar alguns cadernos e livros que havia deixado lá. Recolhi com rapidez, queria sair do quarto o quanto antes, não podia suportar a dor que era estar ali sem ele. Somente esta noite em casa foi que notei que peguei algo por engano. Esse caderno não era meu. Era o diário dele.

Os olhos de Diego brilham.

EDUARDA: Não se preocupe, eu não li nada. Quando percebi logo fechei. Pensei em ligar para dona Elis e enviar para ela. Mas acho que seria mais justo entregar para você. Sabe porque? Elvis não se desgrudava desse diário e eu sei que tudo sobre vocês ele escrevia aqui. Tudo que passaram e tudo que ele sentia. Agora que ele não está mais conosco esse diário só pode ficar com uma pessoa: você.

Diego segura o diário fazendo esforço para não desabar em lágrimas.

EDUARDA: Cuida dele. Aqui está um pouquinho do meu amigo.

DIEGO: Cara, você é demais. Eu só posso agradecer. Valeu Duda.

Após um abraço eles se despedem.

O sinal tocou anunciando o segundo tempo. Dali em diante eles teriam aula. Mas Diego se retirou para ir embora. Andando pelos corredores ele foleou o caderno e distraído tropeçou em uma lata de lixo. Quando levantou a vista mirou diretamente o muro da quadra da escola. Um turbilhão de lembranças lhe invadiu a mente. Não podia ir embora sem dar uma passadinha ali onde tudo começou. Para lá caminhou e se sentou na mureta da quadra, encarando o muro. Nos fones de ouvido tocava Macaé de Clarice Falcão. Ficou olhando e imaginando os dois ali quando pintaram juntos o muro, quase podia ver. Pegou o diário e foi lendo alguns trechos rapidamente. A última folha escrita tinha a data anterior ao dia do acidente. Diego leu mesmo com a vista embaçada de lágrimas.

“Neste último ano do ensino médio, de todas as coisas que eu poderia aprender a mais importante foi que eu aprendi amá-lo. E o que a gente aprender de verdade, a gente nunca esquece. É por isso que vou amar Diego para sempre!”

 

 

FIM… OU RECOMEÇO?

 

 

 

2 comentários sobre “Capítulo 10 – O Último Ano

  • Então @wandersonmota, li ‘O Último Ano’ num único dia hehe. A minha ansiedade e o texto fluído me fizeram ler 10 capítulos em menos de uma hora e tenho muitos elogios à sua web história. Lá no primeiro capítulo o Elvis falar que gosta de escrever web novelas – intertextualidade maravilhosa; a cena em que o Diego desabafa para o Elvis sobre as dificuldades dele com a família; a sabedoria das palavras da Elis. Enfim, o texto que é muito bom.
    É perceptível o amadurecimento da sua escrita quando comparamos o primeiro capítulo com os demais, principalmente entre o 6º e 9º que foram, em minha opinião, os mais claros, objetivos e bem escritos. Parabéns pela sua história.

    E sobre este último capítulo, não me conformo com a tragédia. Não que você devesse fazer diferente, mas me parece muito cliché este tipo de final para as tramas LGBT. Enfim, é uma ótima história e espero que hajam muitas outras para você publicar. Serei um leitor cativo 🙂

  • Parabéns pela web, acompanhei do começo ao fim. Muito triste como terminou esse romance tão lindo e apaixonante que eu tenho certeza que prendeu todos os leitores que leram a web. Mas como na vida, a web nos deixa um ensinamento que vai de cada um interpretar, aguardo sua próxima web. Abraço, e foi uma honra realizar a abertura dessa incrível web série!

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