Herança do Passado: Capítulo 9 – Reunião de Família
CENA 1/ GRAMADO/ PROPRIEDADE HESSE-KASSEL/ SALÃO PRINCIPAL/ NOITE
Sentado em sua poltrona e bebendo um copo de whisky, Antônio se aquece perto do fogo da lareira e olha os álbuns da família Hesse-Kassel, ao lado da governanta Salete, e em clima de saudosismo:
Salete: Que álbum é esse Seu Antônio?
Antônio: 1988, o ultimo ano da minha esposa… Nessa festa aqui ela tava linda né?
Salete: Belíssima! Como sempre, aliás.
Antônio: Nessa época aqui ela já sabia da doença, mas queria provar pra todo mundo que tava bem… Deu no que deu né…
Salete olha com curiosidade uma foto de Odessa com Jeanne na festa e pergunta:
Salete: Quem é essa ai com Dona Odessa? Não lembro dessa criada…
Antônio: É Jeanne, ela era governanta aqui de casa antes de eu lhe contratar, sempre foi muito íntima da minha esposa… Morreu coitada, faz tempo isso já.
Salete: Morreu de que?
Antônio: Acidente na estrada de Gramado pra Porto Alegre, ela estava em um carro alugado e os freios não funcionaram, foi uma tragédia na época… Morreu grávida, 9 meses
Salete: Misericórdia – Salete faz o sinal da cruz – Continua olhando as suas fotos que eu vou ali na cozinha buscar o seu chazinho…
Antônio: Vê se eu quero merda de chá! Traz mais uma dose do meu whisky!
Salete: Velho rabugento! Eu vou trazer o chá, e você sossegue! Ordens médicas, você tem que maneirar no whisky!
Salete se levanta e vai para a cozinha buscar o chá, e enquanto isso, a porta principal da mansão se abre e Rose, Luís e seus filhos entram com várias e várias malas de viagem carregadas pelos funcionários da casa:
Antônio (exultante): Finalmente vocês chegaram! Me contem como foi lá em Viena! Eu quero saber de tudo que meus netos fizeram!
Sofia: Tô exausta Vovô!
Arthur: Exausta de tanto comprar né? A única coisa que você fez lá foi isso!
Sofia: Ai, cala a boca vai Arthur! Vai falar merda em outro lugar!
Arthur: Ah tá, eu que falo merda? Pelo ao menos eu tenho uma ocupação na vida!
Sofia: Eu também tenho uma ocupação!
Arthur: Desde quando ser blogueira de esmalte no snapchat é ocupação?
Sofia: Você tem inveja Arthur! Inveja porque eu sou uma pessoa que tem visibilidade, uma pessoa amada! E você é um zero, que ninguém nem lembra da existência, tanto que a mamãe já lhe esqueceu em 3 aniversários quando a gente era criança!
Rose (irritada): Cala a bocaaaaaaa!!! Cala a boca vocês dois! É a viagem inteira essa merda! Chega em casa é essa merda de novo! Eu vou subir pra tomar meu banho, e quando eu descer pra a gente jantar, eu não quero mais ouvir a voz de vocês!
Antônio bebe mais uma dose de whisky e se acalma para continuar a conversa com os netos:
Antônio: Pedro, meu neto sensato, me conta da viagem por favor. E vocês dois calem a boca! Não quero ouvir mais uma palavra!
Pedro: Então Vô, foi tudo bem, como sempre… A gente visitou a Tia Berta, fomos até o palácio de Schönbrunn, vimos a casa que era da Vovó, jantamos nos melhores restaurantes, tudo uma maravilha…
Antônio: Tia Berta continua horrorosa?
Sofia: Mais feia do que nunca. Eu até me ofereci pra ensinar ela uns truques de maquiagem, mas ela só fez me xingar em alemão, além de ficar repetindo o tempo todo que era uma duquesa….
Pedro: Enfim, foi uma viagem como todas as outras… Uma pena o senhor não ter ido com a gente.
Antônio: Para de bobagem Pedro, você sabe muito bem que daqui da minha casa eu só viajo se for pro cemitério! – ele ri – Agora me mostrem as fotos!
CENA 2/ GRAMADO/ PROPRIEDADE HESSE-KASSEL/ QUARTO DE ROSE E LUÍS/ NOITE
Rose deixa sua bolsa em cima de uma das poltronas do quarto, tira os sapatos de salto e se deita exausta na cama, enquanto o marido carrega o restante de suas malas para dentro do closet:
Rose: Você viu né? Viu que papai mal falou comigo!
Luís: Não vai me dizer que você tá com ciúmes dos seus próprios filhos… Já tá velha demais pra isso!
Rose: Claro que não, vê se eu ia me rebaixar a esse ponto! O que eu tô dizendo Luís, é que papai prefere qualquer pessoa a mim, isso é nítido! E você dobre essa sua língua imunda pra falar da minha idade, porque eu dou de dez a zero em qualquer uma dessas menininhas de 20 anos, e você sabe muito bem disso!
Luís: A única coisa nítida pra mim é a sua loucura…
Rose: Ai, cala a boca e vai guardar essas malas lá dentro Luís! Aproveita e prepara um bom banho pra mim na banheira, amanhã eu já tô vendo que o dia vai ser cheio na empresa, papai vai jogar todo o trabalho em cima de mim pra descontar os dias que eu fiquei fora, como sempre…
Luís: Que tal se, depois do banho, a gente revivesse uma daquelas noites de Viena? Pode ser até durante o banho se você quiser…
Rose: Depois do banho a gente vai descer pra ter uma porcaria de um jantar em família, e na volta, quem sabe, se você merecer, a gente possa até ter uma noite Vienense…
CENA 3/ NOVA YORK/ COBERTURA DE LUIZA/ SALA/ NOITE
Cansada após um longo dia de trabalho, Luiza entra em sua casa, retira os sapatos e acende a luz, o que a faz tomar um susto ao ver a sala toda decorada e a mesa posta com jantar e um bolo de aniversário:
Luiza (surpresa): Pai, o que é isso?!
Walter: Você não achou que esse velho pai aqui fosse esquecer o aniversário da princesinha dele né? Feliz 28 anos!
Luiza: Pai, o meu aniversário é só amanhã! Eu não acredito que você confundiu as datas!
Walter: Claro que eu não confundi as datas meu anjo, mas eu queria um jantarzinho só com você, pra a gente ficar juntos até a meia noite. Eu quero ser o primeiro a lhe dar parabéns, disso eu não abro mão!
Luiza: Paizinho, você não existe!
Luiza se senta a mesa com Walter e se assusta ao ver a grande porção de lagostas preparadas pelo pai:
Luiza: Receita nova?
Walter: Aprendi online, dificílima de fazer! Aprendi especialmente pra você, sei que adora frutos do mar…
Luiza: Pai, eu posso lhe fazer uma pergunta?
Walter: Depende… É coisa boa ou ruim?
Luiza: Boa. Pra mim pelo ao menos…
Walter: Depois do nosso jantar eu penso no caso… Agora por favor, fica caladinha e aproveita a lagosta, para de estragar o momento, se não eu não vou dar o seu presente!
Luiza: Pai, para com isso, não precisa de presente!
Walter: Claro que precisa de presente! Enquanto eu puder, eu vou lhe dar presente todo ano, ou quem sabe todos os dias de todos os anos! Quer saber? Eu não vou aguentar até amanhã, eu preciso lhe dar esse presente agora!
Walter tira do bolso uma caixinha de joia e entrega para a filha. Ela abre e fica surpresa ao ver que se trata de um pingente com um pequeno anjo:
Walter: Um anjo pro meu anjinho…
Luiza (surpresa): Paizinho, eu não tenho nem onde usar isso aqui, o que eu vou fazer com uma joia dessas?!
Walter: Como assim não tem lugar pra usar?! Você pode usar amanhã, na sua festa que eu vou organizar aqui em casa, ou no próximo encontro que você tiver, ou no trabalho, ou onde você quiser! Minha filha, como Marilyn já dizia: Diamonds are a girls best friend!
Walter pega uma champanhe no balde de gelo e estoura, rindo e comemorando com a filha
CENA 4/ INTERIOR DE GOIÁS/ CONVENTO/ NOITE
Enquanto as freiras do convento de Santa Rita se preparam para se recolherem e percorrem os imensos corredores em busca de seus quartos, Leila Hesse-Kassel caminha a passos largos até a capela. Ao chegar no local, ela acende uma vela e se ajoelha perante o altar para fazer suas orações, segurando uma foto sua na maternidade com sua filha recém-nascida nos braços:
Leila (em pensamentos): Misericordioso Deus, que as minhas preces sejam sempre capazes de chegar até a minha filha amada, e que ela saiba que eu jamais desisti dela. Amanhã ela completa 28 anos, 28 anos de um vazio que eu sinto aqui dentro do meu peito que só ela será capaz de um dia preencher. Eu sei que um dia eu vou achá-la, eu sinto isso, e eu jamais vou desistir, jamais… A noite é cada vez mais solitária e fria, meu Senhor, e cada vez mais eu preciso de ti para conseguir ir em frente. Dai-me forças na caminhada, jamais deixe-me estremecer…
CENA 5/ NOVA YORK/ COBERTURA DE LUIZA/ SALA/NOITE
Após o jantar, Walter olha a cidade de Nova York pela enorme janela do apartamento e reflete sobre seu passado e futuro, e sobre o que teve que fazer para chegar até onde está:
Walter (em pensamento): Eu queria um dia poder me explicar pra você minha amiga, será que um dia eu vou conseguir? Será que você vai conseguir entender que tudo o que eu fiz, fiz por amor a você e à nossa filha?! Como eu queria você aqui agora, pra fazer a nossa família ficar completa… Leila, será que um dia você poderá me ouvir?
CENA 6/ GRAMADO/ PROPRIEDADE HESSE-KASSEL/ SALA DE JANTAR/ NOITE
Com a família Hesse-Kassel reunida em torno da enorme mesa de jantar da mansão, os empregados servem o jantar enquanto as conversas seguem:
Rose: Papai, esse jogo de jantar é aquele que ficou da tia Alexandra né?
Antônio: É sim. Por que?
Rose: Por que você só manda Salete usar essa louça quando tem alguma coisa pra comemorar… O que a gente vai comemorar hoje?
Antônio: A volta da minha família ué. Não é coisa pra comemorar?
Rose: Até parece pai, a gente viaja todo mês praticamente e todo mundo sabe que você adora os dias que passa sozinho aqui. Fala logo o que a gente vai comemorar hoje…
Antônio (olhando para Pedro): Eu ia deixar pra contar na sobremesa, mas sua mãe meio que estragou meus planos meu neto. Eu tenho uma surpresa pra você!
Pedro (surpreso): Pra mim?!
Sofia: Pera ai! Se o Pedro ganhar alguma coisa eu quero também!
Antônio (radiante): Eu lhe inscrevi em um MBA em Londres, mexi uns pauzinhos e você foi aprovado meu neto!
Pedro (confuso): Como assim aprovado?! Você me inscreveu em um MBA sem eu saber?!
Antônio: Ué, eu não tô entendendo… Era pra você estar feliz, esse curso é um dos melhores do mundo! Vai ser ótimo pra quando você assumir o seu posto na Kassel!
Pedro: Não Vô! Eu não estou feliz! Você passou de todos os limites! Sabe por que?! Porque eu preciso tomar esse tipo de decisão, e não você! E eu não vou fazer MBA nenhum!
Antônio: Ma… ma… mas como assim não vai?!
Pedro: Tem uma coisa que eu preciso contar pra vocês – Pedro se levanta e joga seu guardanapo na mesa – Eu nunca cursei administração de empresas, nunca nem pensei em fazer isso! O tempo que eu passei em Nova York, eu cursei cinema. Isso mesmo: CI-NE-MA!
Antônio: Como assim cinema?! E aquele diploma que eu tenho pendurado lá, no meu escritório da Universidade de Columbia?! É falso?!
Pedro: Uma cópia barata! O meu diploma mesmo tá guardado, lá no meu quarto. Mas hoje mesmo eu vou expor ele, e vou começar a usar.
Antônio (furioso): NÃO VAI NÃO! – ele pega sua taça de vinho e joga na parede da sala de jantar, assustando toa a família – Eu não vou aceitar isso! Sobe pro seu quarto agora Pedro! Ou eu não respondo por mim!
Pedro: Não, eu não vou subir! Eu não sou seu boneco que faz o que você quiser, eu cansei disso! Cansei de ser um fantoche nessa casa!
Antônio começa a ficar vermelho com a raiva que está sentindo e suas mãos tremem. Sua visão começa a se apagar subitamente e ele tenta se apoiar na mesa, mas se desequilibra e cai no chão, desmaiado.
FIM DO CAPÍTULO
Ficou tenso agora essa última parte
Esse desmaio vai ser explicado no próximo capítulo, vem bomba por ai