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Herança do Passado

Herança do Passado – Capítulo 2: Não Posso Estar Grávida

CENA 1/ GRAMADO /PROPRIEDADE DOS HESSE-KASSEL/ CORREDOR/ MADRUGADA

Após passar a noite com Luís, Rose volta para sua casa com os sapatos na mão e o cuidado para não acordar ninguém da família, quando se assusta ao ouvir barulhos vindo do quarto da irmã. Curiosa, ela vai até a porta e olha pelo buraco da fechadura algo que jamais pensara que poderia ser real: a irmã deitada com o jardineiro da mansão. Atônita, ela corre para o seu quarto e tenta entender o que acabou de presenciar

CENA 2/ GRAMADO /HOSPITAL SANTA LUZIA/ MADRUGADA

Sentado em uma poltrona do quarto e olhando para a esposa adormecida, Antônio conversa com o médico que a atendeu e tenta entender toda a situação:

Antônio: Então doutor, o que a minha esposa tem?

Médico (surpreso): Dona Odessa ainda não contou pra a família?

Antônio (confuso): O que que ela não contou?

Médico: Já faz um mês que ela vem aqui no hospital com certa frequência. Eu mesmo dei a notícia pra ela.

Antônio: Noticia de que? Me desculpa, mas eu tô um pouco confuso…

Médico (surpreso): Antônio, o senhor não sabe mesmo?

Antônio: Claro que eu não sei! Fala logo!

Médico (sem jeito): A sua esposa… Ela foi diagnosticada com um câncer de mama em um estágio um tanto quanto avançado…

Antônio: Como assim câncer?! Isso é uma pegadinha né? Brincadeira de mau gosto?

Médico: Receio que não… Mas eu achei que ela tivesse dado a notícia, pelo ao menos aos familiares….

Antônio: Pelo que eu conheço dessa ai, ela não vai contar a ninguém tão cedo!

Médico: Ela também se recusa a fazer o tratamento… Quem sabe agora com o senhor sabendo, ela se convença que é o melhor a ser feito.

Antônio: Isso ela vai ter que fazer, não se preocupe que eu a convenço, não vai ser problema – ele suspira – Mas quais são as reais chances da minha mulher? Não me esconda nada.

Médico: Poucas… Mas existem.

*

ALGUMAS SEMANAS DEPOIS

CENA 3/ GRAMADO /PROPRIEDADE DOS HESSE-KASSEL/ JARDINS/ DIA

Debaixo do forte sol do verão, Leonardo cuida das estimadas rosas de Odessa e põe adubo na terra, preparando o jardim para a festa que ocorrerá hoje na mansão, quando de repente é surpreendido pela chegada de Leila:

Leila: Será que tem uma rosa pra mim hoje?

Leonardo (sorridente): Pra você tem o jardim inteiro!

De surpresa, Leila rouba um beijo do namorado e o deixa atônito com a situação

Leonardo (nervoso): Leila, você perdeu o juízo?! Sua mãe tá ai organizando a festa, ela pode chegar aqui no jardim a qualquer hora!

Leila: Quanto maior o risco, maior a recompensa! – ela ri – Te espero no meu quarto, depois da festa. Sem falta!

Ela sai do jardim e vai para o interior da mansão, quando é tomado de súbito por um enjoo e sobe até seu quarto para vomitar. Após o enjoo passar, ela é surpreendida pela entrada de Walter no quarto, em seu uniforme de motorista da casa:

Leila (desconversando): Waltinho, você não ia levar meu pai em Porto Alegre agora? Tá fazendo o que aqui?

Walter (firme): Ele cancelou… Você já contou pro Léo?

Leila: Contei o que?

Walter: Que ele vai ser pai!

Leila (com raiva): Walter, eu já lhe disse, eu não tô grávida!

Walter: É, mas vomita a cada cinco minutos! Além do mais você ganhou peso, tá com mudança de humor, daqui a pouco todos vão começar a estranhar. Olha, eu não sou médico, mas eu tenho certeza que isso não é virose!

Leila (desesperada): Eu não posso estar grávida Walter! Eu não quero estar grávida!

Walter: Talvez não esteja, o que eu espero muito que seja verdade… Mas não adianta ignorar a realidade, pois ela vai continuar existindo e crescendo ai dentro de você! – ele tira do bolso um teste de farmácia e entrega para nas mãos da amiga – Comprei pra você. Faz pelo ao menos o teste.

Assustada, Leila pega o teste e guarda em uma das gavetas de sua penteadeira

Leila: Ok, mais tarde eu faço… Satisfeito?

Walter: Nem um pouco…

CENA 4/ GRAMADO /PROPRIEDADE DOS HESSE-KASSEL/ COZINHA/ DIA

Irritado, Walter desce as escadarias e segue para a cozinha da mansão, onde encontra sua irmã Jeanne limpando o chão:

Jeanne: Conversando com sua amiguinha de novo?

Walter: Não é nada disso, a Leila só tá com um probleminha…

Jeanne: Meu irmão, eu já te falei pra se afastar dessa menina, isso ainda vai lhe trazer problema! As pessoas falam dessas coisas, ainda mais sendo a filha de Antônio e o motorista da casa!

Walter: Para de falar bobagem Jeanne, você sabe que eu e Leila jamais ficaríamos juntos desse jeito! Eu não acho que seja é nem possível…

Jeanne: Eu sei disso, você sabe disso! Mas e os outros?! Ninguém sabe que você é… – ela para e reflete um pouco – Ninguém sabe que você é desse jeito, e nem pode saber! Não por agora!

Walter: Pode ficar tranquila, ninguém vai saber aquele assunto nosso, nem vai ficar falando que eu e Leila temos um caso. Isso seria ridículo…

Jeanne: Eu sei que é ridículo, até porque ela tem o jardineiro gostoso, mil vezes melhor que você, mas isso não vai impedir os outros de falar sobre o assunto! As pessoas inventam coisa como bem querem meu irmão!

Walter (confuso): Espera ai, como você sabe da Leila e do Leonardo?

Jeanne: Pelo amor de Deus Walter, eu tenho olhos! E se o pessoal dessa casa não fosse tão centrado no próprio umbigo, já teria visto também! Mas o que eu posso fazer se alguma de nós mulheres têm mais sorte que as outras?

Walter: Vamos ver por quanto tempo essa sorte dura…

CENA 5/ GRAMADO /PROPRIEDADE DOS HESSE-KASSEL/ QUARTO DE ODESSA E ANTÔNIO/ DIA

Deitada em sua cama, Odessa repousa para a grande noite enquanto revisa o mapa de convidados minunciosamente, até ser atrapalhada por sua filha Rose com uma bandeja cheia de remédios:

Rose: Mamãe, hora do remedinho!

Odessa: De novo essa tortura! Culpa do seu pai que me faz tomar essa medicação ridícula! Ai como eu odeio aquele homem, só serve pra se intrometer na minha vida!

Rose: Mamãe não fica assim… Ok, tudo bem que o seu cabelo tá caindo, que você tá ficando mais magra do que de costume, mas pensa que é tudo por uma boa causa! As suas filhas precisam de você, você tem que lutar! Eu preciso da minha mãe aqui, viva!

Odessa: Eu sei, eu sei… É só por isso que eu aguento essa tortura! E eu posso até estar mais magra, mais careca, mais feia, mais tudo! Mas eu vou ser a mais bonita dessa festa hoje, isso eu garanto! – ela suspira – Me dê esses remédios minha filha, nada derruba Odessa Hesse-Kassel assim! Nada!

Rose (animada): Essa é a Odessa que eu conheço!

Rose entrega a bandeja e Odessa toma toda a medicação, que a faz dormir após alguns minutos:

Rose (em pensamento): Depois eu tenho que agradecer o Luís por essas pílulas pra insônia, elas são uma mão na roda. Agora é só me livrar dos remédios de verdade, e eu não dou mais um mês pra ela…

CENA 6/ GRAMADO /CAFÉ COLONIAL/ TARDE

Sentados em uma mesa discreta no fundo do café, Rose e Luís trocam ideias e ela lhe conta seus planos:

Rose: Então Luís, eu andei pensando e decidi. Você vai na festa da minha mãe hoje, como meu convidado!

Luís (desconfiado): E o que lhe fez tomar essa decisão? O que você quer de mim Rose?

Rose: Um pequeno favorzinho, coisa boba. E em troca eu lhe apresento pro meu pai como o melhor administrador e…

Luís (seco): Contador. Eu sou formado em contabilidade.

Rose: Então, contador… Eu lhe apresento como o melhor contador da cidade e lhe consigo um emprego na Kassel. O que você acha?

Luís: Depende de qual for o favor…

Rose: Eu preciso expor o caso da minha irmã com o jardineiro, e precisa ser hoje, na frente de todos. Alguma ideia?

Luís (confuso): E por que você faria isso com sua própria irmã?

Rose: Nas últimas semanas, eu andei procurando pelo testamento de mamãe, revirei a casa toda e nada! Então eu decidi mudar a estratégia e cortar os possíveis nomes da lista, um por um – ela bebe um gole de café – Não tem muitas possibilidades, além de Leila e meu pai há apenas a irmã dela, que eu nunca conheci aliás, só em fotos…

Luís: E por ande anda essa mulher?

Rose: Ninguém sabe… Mamãe disse que perdeu contato com ela depois do acidente, quando ela foi internada em um manicômio desses por ai. Não vai causar nenhum problema.

Luís: Que acidente?

Rose: Coisa da família, nada importante…

Rose abre sua bolsa de grife e tira um maço com notas para entregar para Luís

Rose: Compra um terno bom pra você vestir hoje, por minha conta. Já que eu vou lhe apresentar pra minha família, apareça pelo ao menos decente!

Ela se levanta e sai do café, deixando Luís impressionado e ao mesmo tempo completamente espantado

*

CENA 7/ GRAMADO /PROPRIEDADE DOS HESSE-KASSEL/ SALÃO PRINCIPAL/ NOITE

Ansiosa, Odessa acerta com Jeanne os últimos detalhes da festa, desde a banda até as bebidas, para que tudo esteja na mais perfeita ordem. Ela faz as correções de última hora quando de repente é atrapalhada pelo marido:

Antônio (preocupado): Odessa, você tem certeza que está pronta pra isso? Você ta se sentindo bem? Ainda dá tempo de cancelar…

Odessa: Vê se eu sou mulher de cancelar festa! Eu estou ótima, pronta pra me acabar de dançar hoje! Mande chamar as meninas pra cá, os convidados já estão chegando e eu preciso da minha família toda aqui!

Antônio: Eu vou chamar. Mas lembra que você não pode beber nada com álcool hoje!

Odessa: Claro que eu não vou beber, eu não vou arriscar meu tratamento…

CENA 8/ GRAMADO /PROPRIEDADE DOS HESSE-KASSEL/ QUARTO DE LEILA/ NOITE

Walter entra no quarto da amiga e a vê vestindo o seu vestido de festa, mas com uma certa dificuldade de fechar o zíper e ficar pronta. Ele tenta ajudá-la, mas não consegue também fechar o zíper do vestido:

Leila: Eu não entendo, esse vestido cabia em mim faz pouco tempo…

Walter: Há pouco você não estava grávida né…

Leila (irritada): Eu já disse que eu não tô grávida!

Walter: Eu vi o teste…

Leila: Como você viu, eu joguei ele no…

Walter (ríspido): No lixo lá dos fundos. Eu vi na hora Leila, eu sabia que você ia fazer alguma coisa desse tipo. Mas eu já lhe falei que ignorar a realidade só vai fazer as coisas piorarem pra você.

De súbito, a ficha de Leila finalmente começa a cair. Desesperada, ela retira o vestido e se deita na cama, com os olhos vermelhos e prontos para chorarem todas as lágrimas que ela estava segurando desde que desconfiara da gravidez:

Leila (desesperada): O que eu faço?! Walter, o que eu faço?!?

Walter: Conta pro pai da criança ué! Você não fez um filho sozinha, agora não tem mais jeito!

Leila: Meu pai vai me matar! Ele não vai aceitar essa criança!

Walter: Isso ai é verdade, o seu pai realmente não pode saber… Eu tenho uma ideia!

Leila: Qual???

Walter: Eu vou trazer o Léo aqui pra vocês terem uma conversa de adultos, e enquanto isso você faça suas malas.

Leila (confusa): Pra que malas?

Walter: Você não vai mais poder continuar aqui nessa casa se quiser ter esse filho! Leva pouca coisa que eu arrumo o carro, mas pega bastante coisa de valor, você vai precisar de dinheiro…

Leila (assustada): Walter, você tá louco?! Eu não tenho coragem de fugir de casa!

Walter: Não se trata de coragem minha amiga, você não tem outra opção! Esse é um daqueles momentos da vida em que você tem que escolher um caminho, um caminho que vai mudar sua vida de uma maneira que você não pode nem imaginar… É agora ou nunca minha amiga: ou dá ou desce!

Leila: Eu vou fazer as malas!

Se sentindo confortada, ela abraça o melhor amigo, sem nem desconfiar que por trás da porta sua irmã escutou toda a sua conversa e já sabe da gravidez e do plano de fuga. Atônita, Rose sai apressada em seu longo vestido preto e desce as escadarias direto para a cozinha da mansão

CENA 9/ GRAMADO /PROPRIEDADE DOS HESSE-KASSEL/ COZINHA/ NOITE

Rose chega na cozinha e dá de cara com Leonardo carregando um engradado de bebidas com a ajuda de um dos garçons da festa, quando resolve colocar seu plano em ação contra a própria irmã:

Rose: Léo, justamente a pessoa que eu precisava encontrar!

Leonardo (surpreso): Dona Rose? Eu tô surpreso que a senhora saiba meu nome… O que quer comigo?

Rose: Como assim? Eu sei o nome de todos os meus funcionários! Especialmente os bons!

Leonardo: Com todo o respeito, mas a senhora chama todos os funcionários da mansão de Raimundo ou Severina, e acha que todos são nordestinos…

Rose (confusa): E não são??

Leonardo (ríspido): Eu sou de Porto Alegre…. Mas o que a senhora quer comigo?

Rose: Sabe dirigir né?

Léo: Sim.

Rose: Ótimo, pode pegar um dos carros e ir lá na empresa pegar uns documentos na sala do meu pai. Um secretário vai estar lhe esperando…

Léo: Por que eu? Cadê o Walter?

Rose: Walter tá ocupado, tem que ser você! Encare isso como um teste…

Léo (confuso): Teste de que??

Rose: Pra uma promoção bobo, você não pode mais ser só jardineiro aqui em casa!

Léo (confuso): Por que não?

Rose: Ué, agora que você vai ser pai precisa ganhar bem! Criar um filho nos dias de hoje com essa inflação é uma missão quase impossível!

Léo: Desculpa, mas a senhora se enganou… Eu não vou ser pai tão cedo…

Rose (fingindo-se confusa): Ué, então será que minha irmã me contou errado?! Ela me disse que tava grávida do namoradinho secreto dela, o jardineiro… Deve ser brincadeira dela então… Esquece!

Léo (chocado): Ela te disse isso? Grávida?!?!

Rose: Com todas as letras! Grávida!

FIM DO CAPÍTULO

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