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Batalha Espiritual

Batalha Espiritual – Capítulo 6

Escape

Num dos quartos do castelo, Francine se encontra rodeada de anjos que se disponibilizaram a trabalhar como alfaiates, prontos para tirar-lhe a medida. Ela estava feliz, porque, diferente de sua antiga morada, possuía serventes.

Lucian adentrou, observando como a garota estava impressionada com todos aqueles cuidados.

– Quais são tuas opiniões sobre tudo isto?

– Ótimo! Tudo ótimo! Nunca tive tanta atenção!… – rapidamente, o entusiasmo se foi. – Encontraste Serena?

– Sim.

– E onde ela está?

– No lugar que merece estar.

– Poderias ser direto, meu senhor?

– Está sendo repreendida por ter desaforado a mim.

– Contudo… Tu não disseste que abandonara os Céus por Micael ser tirano e não permitir que ninguém opinasse?

– Estás se queixando da maneira que administro meu império?! Agora temos liberdade! Preciso disciplinar àqueles que cometem falhas graves contra a nossa supremacia! Querer ver a teu amo perdendo o poder que alcançara?! – o tom de voz do arcanjo foi elevado.

– Não, mestre…

– Ah… Francine… Não se preocupe com tua irmã. Tu tens conhecimento de que ela é desobediente, correto?

– Correto…

– Não tenha medo de questionar-me. Responderei-lhe sempre de uma maneira satisfatória… – disse Draco, tentando discretamente copiar o estilo de comando da deidade a quem se opôs. – Não se preocupe… Faça o que eu disser e nenhum revés virá sobre ti. Tu e tua irmã precisam manter o padrão. São da realeza agora. – deu um sorriso cínico.

O que fora regente do coro celestial era dono de um incansável desejo de ser como seu criador. Tempo se passara desde a expulsão, todavia, a inveja permanecera…

– Sabe, amo… – Francine o chamou. – Não gostei muito ser abandonada para que tu a procurasses…

A vontade de Lucian era responder “Tu não tem obrigação de gostar de nada, apenas de me servir.”. Contudo, segurou estas palavras em sua boca e disse tranquilamente:

– Não há razões para ter ciúmes. Sabes que tenho um enorme apreço por ti… Tua personalidade é promissora.

Cinco dias depois da conversa, dentro do calabouço, Serena ainda debatia-se e executava tentativas de soltar-se. Porém não eram eficazes… As únicas coisas que conquistava com seus esforços solitários eram marcas doloridas em seus pulsos, que começavam a sangrar. A dor fazia com que gemesse baixo. Ela nunca sentira isso antes. Seus joelhos e braços estavam ralados de tanto desabar no chão por excesso de labuta. Tinha fome e sede, suas vestiduras tornaram-se trapos. Ninguém a visitara desde que fora colocada ali… Nem mesmo sua irmã. Algumas vezes, a própria Serena espancava-se, por estar com ódio do que fez. Confiou naquela que sequer a visitou quando estava em cárcere e traiu àquele que a tratava melhor do que merecia.

Com a voz rouca, clamou, usando o vigor que lhe restava:

– Micael… – lágrimas escorreram pelo seu rosto e pequenos flashes do passado a atormentaram. – Amenize minha agonia, por favor… Mate-me agora se necessário, mas livre-me! Livre-me de mim… Olhe para isto… Eu mesma me mutilei… Não há culpado senão eu! Necessito da tua ajuda… Senhor, és a minha única saída… Tens misericórdia de mim! Não mereço que tu me escutes… Mas tu a sempre estás a me escutar… Perdão… Tornei-me um caos e não posso escapar disso… Destruí a tudo que podia chamar de felicidade… Estou quebrada nesta bagunça que fiz… E preciso de você para me restaurar… Precisei engolir o meu orgulho para não morrer sufocada, contudo eu vejo que merecia mesmo morrer… Mas… Continuo tentando segurar a minha vida com estas mãos desajeitadas… Por favor, por favor… Pegue-a e faça o que for bem visto aos teus olhos com ela… Por favor… Eu não aguento mais… Eu não aguento… Tua presença em mim é toda a força que eu preciso… Nada mais… Nada mais… – ela contorcia-se no chão, parecia estar tendo um surto.

– Por que precisaste estar no fundo do poço para me chamar? – ela ouviu uma voz, mas não via ninguém ao seu redor.

– Porque sou incapaz até mesmo de discernir o que deveria ou não fazer sem o teu conselho! Minha função é atrapalhar-te! Senhor… Extermine-me! Tu nunca me deixaste, nunca desististe… Entretanto, não valorizei nada disso! Não mereço viver!

– Não farei isto. Teu destino é outro.

– Então… Permita-me que eu te veja… Fale comigo, face a face, nem que seja para dizer “Eu te avisei”! Por favor, atenda este meu pedido… Por favor… Mostre tua longanimidade a mim… Por uma última vez…

Assim o fez. Serena havia percebido que nem as barreiras do pecado a impediriam de Micael de aproximar-se dela, a menos que essa fosse a sua vontade e escolha. Em comparação a ele, a donzela estava com um aspecto deplorável. Não passava de uma pobre coitada… A potestade, levantando apenas uma das mãos fez com que as cadeias se rompessem. A jovem olhou-o como quem não compreendia.

– Servirás a mim a partir de agora? – ele fez aquele mesmo olhar amável de quando viviam juntos.

– Não sou digna disso.

– A minha pergunta não foi esta. – apesar da resposta rígida, a sua voz permaneceu mansa.

– Faço o que quiseres…

– Viveremos juntos muito em breve. Ficarás nessas terras por pouco tempo… Estarei contigo, não importa o que aconteça e não importa onde esteja. Nada e nem ninguém irá interromper-nos, pois tenho uma missão para ti.

– Está bem, meu senhor… Perdão…

– Já te perdoei… Eu te amo. – dobrou seus joelhos e suas vestes tocaram aquele lugar imundo e áspero. – Estas lesões não combinam com a tua bela aparência. – beijou-lhe a testa. Nenhuma ferida mais havia em seu corpo e nenhuma circunstância lhe afligia.

Serena fitou-o… Estava envergonhada. Não foi contida a vontade de chorar em voz alta, como uma criança que ficara perdida do pai. Micael fez com que ela apoiasse sua cabeça em seu peito e afagou-lhe o cabelo.

– Obrigada… Obrigada… Obrigada… – eram a única palavra que a menina conseguia dizer.

– Apenas fiz da tua vida o que era bem visto aos meus olhos… Do jeito que me pediste. Vá, querida… Faça como determinei. Serei contigo. – ele levantou-se e auxiliou a jovem a fazer o mesmo.

– Obrigada. – não parava de olhar para baixo, com se fosse onde ela deveria estar. Serena nunca se sentira tão constrangida, porém tão aliviada.

Ela pegou uma das poucas tochas que iluminavam o lugar e saiu lentamente naquela escuridão, com medo de que houvesse algum guarda. Desnecessário, porque o local estava ermo.

Ao sair, vira todas as mudanças drásticas que ocorreram no reino durante sua ausência. Todo o povo que a deidade criara, para que sua irmã e ela própria governassem, se encontrava em um estado de extrema miséria e lástima. Todavia, o castelo de Lucian permanecia rico, elegante e encantador. A ira de Serena foi excitada. Ela queria expressar o seu rancor e aversão antes de voltar realmente para a vida santa que Micael propusera.

Um dos anjos que ficavam monitorando as portas da cidade na ponte acabara de descer para o vilarejo indigente, onde estavam os humanos. Serena saíra ao encontro de um dos habitantes, para saber o que estava acontecendo ali. Só descobrindo isso é que poderia tomar alguma atitude.

– Como assim “O que aconteceu?”, moça? – um rapaz de cabelos castanhos, quase negros, e um bigode ralo, resmungava. – Estás pensando que sou idiota? Não irás me distrair e tampouco me roubar! Além do fato de eu não ter nada para ser roubado! Não adianta ameaçar-me com este fogo em mãos!

– Não estou te ameaçando!

– Garotos, onde conseguiram esta tocha?! – o anjo da ponte se dirigiu até ela, parecendo reconhecer o objeto.

– “Garotos”?! Não a conheço! Muito menos sei de onde ela tirou estas chamas! Deve ser uma das feiticeiras que servem a Draco! Tu o deves saber: Draco possui muitos pagãos em seu palácio. É óbvio que muitos moradores daqui desejam estar lá também.

– Não sou feiticeira! – a dama protestou.

– Para uma serviçal de Draco, tu mentes muito mal! Pela maneira como se traja, tenho certeza que faz parte da nobreza! Mas para tuas roupas estarem tão rasgadas e sujas assim, deve ter fugido de uma das masmorras. – o anjo formulou suas suspeitas.

” ‘Uma das’? Quer dizer que fizeram mais calabouços agora?”, ela pensou.

– Já disse que não sou feiticeira!

O rapazinho que ali estava, tentou golpear a menina com a tocha que era segurada, porém ela desviou. Por isso, disse:

– Óbvio que és feiticeira! Só as feiticeiras preveem o futuro!

– Não previ porcaria de futuro nenhum nenhum! Pare com isto! Foi apenas um reflexo! Tu poderias ter me queimado!

– Tens razão. As teorias deste desgraçado são claramente broncas. Se não és feiticeira, permita-me que te leve até Draco, para que ele confirme. – o cavaleiro sugeriu.

Serena não poderia deixar que isso acontecesse. Ameaçou jogar as brasas no que tentou encaminhá-la até o ambiente que menos almejava estar. Desta maneira, o cavalo dele foi para trás e por causa do susto, o próprio acabou por cair de sua montaria. A donzela, deixou de lado a delicadeza, tomou o cavalo para si, desfazendo-se da tão chamativa tocha e cavalgando para longe. Foi a primeira saída que veio até sua mente. Contudo, ainda dava para ouvir o anjo que fora derrubado alertar seus companheiros, para fazer a emboscada…

Ela queria voltar até o castelo de Micael, entretanto, acabou num lago rodeado de árvores. Não sabia onde estava. Conseguiu ouvir relinchares e cavalgares à distância… Eles estavam aproximando-se. Optou por voltar a pé, mesmo naquele solo inundado… Acreditava que abismo entre o “santo” e o “profano”, que a separava do pedaço perfeito do mundo, deveria ter desaparecido após a emocionante reconciliação para com seu rei. Serena precisava correr…

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