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O Diário de um Nerd

O Diário de Um Nerd – Capítulo 03

Capítulo 03
Não Posso Continuar Com Isso

“Você não deve se sentir como um desperdício de espaço, você é original, não pode ser substituído. Se você soubesse o que o futuro guarda, depois de um furacão vem um arco-íris. Talvez a razão pela qual todas as portas estejam fechadas, é que você encontrará uma que te leve para a estrada perfeita.” Katy Perry – Firework

Cena 01 – Escola Elementar.
Léo começa a suar frio, ele sabe pelo jeito que Paulo o olha que o que ele pretende fazer não é bom.
Paulo, furioso: Você sabia que por sua causa a gente vai passar o resto da semana de castigo? Sabia, seu idiota?
Léo está ficando mais assustado.
Paulo: E sabe o que a gente vai fazer agora? Nós vamos te prestar a nossa gratidão.
Paulo dá uns passos pra trás.
Paulo: Davi, Mário, segurem ele!
Dito e feito. Davi e Mário partem pra cima de Léo e o seguram com força pelo braço, o garoto tenta se soltar e fugir, mas ele é muito fraco pros outros dois.
Léo, nervoso: Por favor, por favor, não faz nada comigo.
Paulo, esfregando as mãos: Relaxa nerd, eu vou tentar pegar leve. Adoraria dizer que vai ser indolor, mas isso seria mentira.
Paulo ergue o punho.
Léo: Não Paulo, por favor…
Antes que Léo consiga terminar de falar, o punho acerta bem em seu rosto com um soco tão forte que seus óculos saem voando.
Paulo, irônico: Olha só, quatro olhos sem dois.
Davi e Mário: (risos).
Léo continua lutando pra tentar se soltar, mas é inútil. Paulo acerta mais socos repetidamente no rosto do indefeso garoto. Quando ele dá o último, já está começando a sair sangue da boca de Léo. Ele parte pra uma região abaixo. Com toda a força e sem só, Paulo dá dois socos bem no estômago de Léo, fazendo o garoto perder o fôlego.
Paulo: Soltem ele.
Davi e Mário soltam Léo. O garoto põe a mão na barriga, tentando respirar melhor. Mas ainda não acabou. Paulo acerta mais um soco com força em Léo e dessa vez o garoto vai parar no chão. Caído, ele tenta se levantar, mas antes que possa, Paulo começa a dar-lhe seguidos chutes e pontapés.
Paulo, chutando: Toma isso, seu babaca.
Mário: Dá-lhe Paulo.
Mário e Davi só assistem sem fazer nada. Mário parece animado, dizendo pro amigo bater mais fortes. No rosto de Davi, parece estar uma leve expressão de pena do garoto.
Léo já está tossindo sangue e quase não consegue falar.
Léo, ofegante: Paulo… Paulo, para… Por favor…
Paulo, irônico: Ah, pedindo desse jeitinho, o que você não pede chorando que eu não faço rindo?
Paulo se abaixa e puxa Léo pelos cabelos e o escora na parede, fazendo-o se sentar.
Paulo: Escuta aqui, isso foi só uma demonstração, vai ter muito mais se você contar pra alguém, entendeu? Entendeu? Me responde.
Sem conseguir falar, Léo faz que sim com a cabeça. Paulo solta o garoto e fica de pé.
Paulo: Pronto, serviço feito. Vamos embora rapazes.
Paulo sai do local completamente satisfeito, Mário sai empolgado, mas Davi não parece partilhar da empolgação dos amigos. Ao sair pelo portão, ele olha para o sangue no chão e a expressão de dor no rosto de Léo, algo parece apertar seu peito e pesar em sua consciência. Mesmo assim, ele não diz nada e simplesmente sai acompanhando os amigos.

Cena 02 – Casa de Léo. Quarto.
Léo está com sua mãe e seu pai em seu quarto. O garoto acabou de tomar banho e está sem camisa. Isabel está passando alguns remédios nos cortes e feridas no corpo do filho.
Léo: Ai mãe, tá doendo.
Isabel: Desculpa meu filho, mas é preciso, isso aqui tá muito feio.
Robson está de pé escorado na parede.
Robson: Me diz de novo meu filho, como isso aconteceu?
Léo, nervoso: Eu já disse pai, eu cai da escada.
Isabel: Meu Deus, e que queda foi essa?!
Robson: Mas como você foi cair da escada Leonardo? Você é sempre tão cuidadoso? E como ninguém lá te socorreu?
Léo: Eu sei lá pai, eu devo ter pisado num lápis, ou então tinha cera na escada. E já tinha ido todo mundo embora, você sabe o quanto eu sou lento.
Robson: Hum… Foi isso mesmo que aconteceu?
Léo se lembra da ameaça feita por Paulo.
Léo: Foi, foi isso!
Isabel: Meu Deus, mas isso tá muito feio, eu acho melhor te levarmos ao pronto-socorro.
Léo: Não precisa mãe, eu já disse que não precisa.
Robson: Tem certeza? Eu posso te levar, sem problema…
Léo: Não pai, não precisa, eu tô bem. Ai, mãe…
Isabel, fazendo um curativo nas costas: Desculpa filho, aguenta firme.

Cena 03 – Casa de Alice.
Alice está deitada de barriga em sua cama com suas pernas pra cima, ela está lendo uma revista e falando no celular com sua melhor amiga Roberta, que também estuda com ela na mesma turma.
Alice, no telefone: Então amiga, como você tá se sentindo?
Roberta, do outro lado da linha: Ah, eu tô mal, metade do meu corpo ainda tá doendo desde a aula de Educação Física.
Alice: Pois é, pegaram pesado com a gente hoje.
Roberta: É verdade, tudo culpa daquele nerd esquisitão do Léo, por causa dele a gente levou aquele castigo todo, não foi justo, você não acha? Alice?
Alice fica muda. De repente a garota tem algumas lembranças. A garota se lembra da expressão de vergonha e tristeza que estava no rosto de Léo no momento em que ela e os demais alunos da turma o atacaram com bolas de papel. Em seguida ela lembra de outras coisas. Certas vezes, ela e as amigas populares ficavam paquerando Léo, fazendo o garoto ficar constrangido e alimentar a falsa esperança de que as coisas estavam melhorando e ele estava conquistando amigos. Neste momento, aquelas lembranças que antes eram engraçadas, fazem Alice ficar com envergonha e com raiva de si mesma.
Roberta: Alice? Alice, você ainda tá aí?
Alice, meio confusa: Ah, desculpa amiga, é que eu tive uns devaneios e uns pensamentos aqui e acabei me distraindo.
Roberta: Sei, tava pensando em quê?
Alice: No Léo.
Roberta: Hum, o esquisitão causador de todos os nossos problemas, mas por que você tava pensando nele?
Alice: Sei lá, mas é que de repente me veio na cabeça que nós o conhecemos há tanto tempo e ele sempre foi tão solitário.
Roberta: Do que você está falando?
Alice: Ah, você sabe, nós estudamos juntos faz tempo e desde sempre ele foi isolado, e mais, foi nosso alvo de gozação, sabe?! Quer dizer, a gente sempre riu dele, mas alguma vez você já viu ele rir?
Roberta: Não sei, não que me lembre. Mas por que isso agora?
Alice: De repente eu tô me sentindo mal, depois do castigo de hoje eu comecei a ver a situação dos dois lados, e me bateu uma culpa.
Roberta: Mas foram só brincadeiras Alice.
Alice: Bem, é que nós sempre o humilhamos e ele nunca nos fez nada.
Roberta: Agora que você falou, eu também não lembro se já o vi conversando com alguém, ele sempre vive isolado lá no fundão.
Alice: É, e isso não é de hoje.
Roberta: Ah, mas vai ver ele gosta de ser solitário.
Alice: Que tipo de pessoa gostaria de viver sozinha Roberta?
Roberta: Sei lá, por que você acha que o chamamos de “esquisitão”?
Alice: Olha, o que eu quero dizer é que a gente nunca deu a ele uma chance de ser nosso amigo. A gente precisa concertar isso.
Roberta: Como assim? Você vai pedir desculpas?
Alice: Não, não é suficiente. Eu estou pensando em fazer amizade com ele, assim, com a minha ajuda ele vai poder a se relacionar melhor com as outras pessoas.
Roberta: O quê? Mas como você pretende fazer isso?
Alice: Eu vou dar um jeito, pode apostar!

Cena 04 – Casa de Léo. Banheiro.
Léo está de pé escorado na pia do banheiro. O garoto olha fixamente para o fundo de seus olhos em seu reflexo. Ele se lembra de várias das vezes que foi humilhado por seus colegas. A vez em que o trancaram dentro da sala de aula; a vez que roubaram sua mochila e seus materiais e jogaram tudo na água que estavam lavando o banheiro; as vezes em que ele foi acertado pelas bolas nas aulas de Educação Física; as vezes em que passou fome na escola porque roubaram seu dinheiro pra comprar lanche; e por fim, todas as vezes eu seus pais perguntaram se estava tudo bem e ele se calou.
Léo, falando com si mesmo: Minha vida tem sido um inferno, se for pra ser assim eu não quero continuar.
O garoto tira um estilete do bolso de sua bermuda. Ele põe a lâmina pra fora e encosta ela no pulso. Ele conta até três e se prepara para se cortar.

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