Capítulo 54 – Filho Amado
Filho Amado.
Capítulo 54.
Anna fecha a porta: O Noronha veio aqui nos ajudar filho, apenas isso…
Noronha pede: Mãe, será que você poderia nos dar licença, preciso ter uma conversa bem séria com o Éssio.
Anna, desconfiada: Tudo bem, eu vou conversar com o médico sobre o tratamento.
Éssio, envergonhado: Olha Noronha, se você veio aqui pra me humilhar não vai conseguir. Eu sei que você deve estar transbordando de alegria em me ver aqui mas nada mais me abala nessa vida…
Noronha se senta: É…Na verdade eu tô feliz sim em te ver nessa cama de hospital. Você teve tudo o que mereceu.
Éssio surta: Seu frio, sem sentimentos!
Noronha: Calma Éssinho, era apenas uma brincadeira. Você não disse que não se abalava com mais nada? Olha, desse jeito não vai conseguir sobreviver ao tratamento.
Éssio, emburrado: Eu não vou fazer esse tratamento, eu não quero mais viver!- Ele cobre as mãos com o rosto.
Noronha debocha: Nossa, que noviço rebelde! Justo agora que ia ter uma solução pro seu tratamento…
Éssio se interessa: Solução? Que solução?
Noronha ri: Eu. Eu sou a solução porque eu vou pagar esse tratamento, de graça, porque eu sou uma pessoa muito bondosa e generosa.
Éssio grita: Nunca, eu nunca vou depender de você pra nenhuma coisa. Eu prefiro morrer mesmo se é pra ficar devendo gratidão pra uma pessoa como você. Queria ter morrido logo, pra evitar esse sofrimento.
Noronha começa a ter uma crise de riso.
Éssio, incomodado: Para…Para de rir, Noronha!
Noronha não consegue parar de rir, ele se aproxima do irmão: Ai…Ai Éssio foi a coisa mais tosca que eu já ouvi na minha vida…Ai meu Deus…Você não consegue mesmo bater de frente com a situação? Pois saiba que se você quiser ter um tratamento digno eu estou aqui pra isso. Mas se não quiser, jamais irei te obrigar.
Éssio: Eu poderia aceitar o tratamento se eu já não soubesse que você vai me humilhar frequentemente, e esfregar na minha cara que está pagando os custos…Você não é humano o suficiente pra ter uma atitude generosa sem querer algo em troca!
Noronha: Mas eu só quis duas coisas em troca, e não foi nada demais, não é nada perto de um tratamento caro como esse- Gesticula- Eu só exigi que vocês venham morar na minha humilde casa e que mamãe vire minha empregada!
Éssio se assusta: Nunca. Nós nunca vamos cumprir com as suas condições, já saquei seu jogo mas não vou participar dele, Noronha. Você está querendo pagar o tratamento pra gente depender se você e se rebaixar como empregado. Eu prefiro morrer mesmo como já disse, agora sai daqui e não me procura mais, você é a última pessoa que eu quero ver nessa situação.
Noronha pega um travesseiro no quarto: Olha, se você quiser morrer eu tenho métodos bem mais práticos e tem um que eu adoro- Ele se aproxima do irmão- Já fiz isso uma vez, lembra?
Éssio: Noronha, sai daqui, sai…
Noronha vai com o travesseiro pra cima dele: Por quê? Você disse que quer morrer, POIS EU TE AJUDO COM MUITO PRAZER SE É ASSIM…
Éssio, desesperado: PARA, EU VOU GRITAR! SOCORRO!
Noronha, descontrolado começa a sufocar Éssio, mas logo para e recomeça com a risada: Você realmente é uma pessoa muito confusa, ora diz que quer morrer e ora implora pela vida! Assim não consigo te entender, Éssinho! Decida entre a vida e a morte.
Éssio, tossindo: Tudo bem, eu vou aceitar a sua ajuda Noronha mas você tem que entender o quanto é difícil pra mim encarar alguém nesse estado. Eu me sinto pisado e nós de certa forma sempre rivalizamos, portanto é como se você estivesse triunfando.
Noronha, falso: Não se preocupe, eu posso te entender Éssio…É realmente lamentável o seu estado.
Éssio começa a chorar: Mas agora que você vai fazer isso pra mim acho que podemos esquecer tudo o que aconteceu entre a gente, aquelas brigas sem motivo, troca de tapas e ofensas…Numa situação dessa é onde se prova que os laços da família ainda estão fortes- Ele estende a mão- Vamos selar a paz? Acho que é o momento certo pra isso, já estava na hora, Noronha.
Noronha larga o travesseiro: SENHOR Noronha.
Éssio: O quê?
Noronha ajeita sua gravata: A partir de agora você vai me chamar de Senhor Noronha, certo? Eu vou pedir a sua transferência para um hospital particular pra que façam novos exames e comecem o tratamento. Acho que a nossa conversa acaba aqui, eu resolvi deixar tudo preto-no-branco pra depois você não diga que não avisei- Ele pega a maleta e se prepara para sair.
Éssio, tenso: Mas que história é essa de “Senhor Noronha”? Foi alguma brincadeira? Eu não entendi…
Noronha ri: Você vai entender, querido. Daqui a alguns dias quando sair do hospital quem sabe…- Ele faz o gesto de tchau e sai.
Éssio, preocupado: Noronha, Noronha volta aqui…Algo me diz que isso não tá certo!
Mansão de José do Gado/ Dia.
José, estressado: Vamos, me digam do que eu não posso desconfiar!
Marinez disfarça: Ah Zé, não é nada demais…
José com raiva: DIZ LOGO, MARINEZ! TÔ SEM PACIÊNCIA HOJE…
Marinez inventa: É que eu assinei essa revista mensalmente, e não queria que você soubesse…
José joga o casaco no sofá: Não me importo, achei que era alguma coisa mais relevante, sinceramente…- Ele sai, deixando Marinez e Aurora assustadas.
NO DIA SEGUINTE…
Fórum Varzeônico/ Tarde.
Betânia e Jurema estão aguardando Jequinha e os outros dois intimados.
Jurema assoa o nariz com um lenço: Coitado do meu irmão…
Betânia, apressada: Querida, é como diz um popular ditado “ aceita que dói menos”. É isso que podemos fazer.
Jurema: Eu prefiro sofrer, isso mostra que eu ainda sentia algo pelo Belarmino.
Betânia vira o rosto: Faça como quiser, sugiro que monte um memorial do Belarmino, com vários porcos e vacas, você inclusive.
Antes de Jurema responder, Jequinha chega com Benê.
Betânia, indiferente: Eu suspeitei que esse idoso seria uma das pessoas que estaria no testamento, de vez em quando ele ia lá no sítio almoçar de graça.
Benê tira o chapéu: Boa tarde pra você também.
Jequinha tira a chave: Podemos ir para a nossa sala, que é a segunda à esquerda. A última convocada disse que irá se atrasar um pouco.
Jurema, intrigada: Então é uma mulher! Acho que meu irmão tinha outra esposa…- Ela olha pra Betânia.
Na sala…
Jequinha se senta na cabeceira, ele pega os óculos e o papel que Belarmino havia escrito.
Benê, triste: Só queria deixar claro que eu tô muito triste com essa morte, o Belarmino e eu sempre conversávamos sobre tanta coisa…
Betânia, indelicada: Ninguém se importa. Começa essa leitura logo, se você entender a letra dele, obviamente.
Jequinha: A primeira pessoa que ele cita é a esposa, Maria Betânia Flores. “Betânia, você sabe como nosso casamento sempre foi na base de igualdades. Mas nos últimos tempos nada mais era como antes, você não me amava mais e tinha se interessado por outro. Pois bem, saiba que tudo o que eu te deixei foi correspondente aos nossos últimos momentos juntos. Deixo pra ti o meu livro favorito que tanto li depois de brigarmos, Vidas Molhadas, de Graciliano Raízes. Também deixarei a minha coleção de miniaturas de locomotivas que ficava no guarda-roupa, a minha conta no banco, apesar de não ter nada nela. Ah, e o mais importante: Deixo a minha querida porca Grace para que você a cuide com muito amor e carinho.”
Betânia: E o resto?
Jequinha porém muda de página: Não tem resto. É só isso que ele deixa pra você.
Jurema e Benê não contém o riso.
Betânia, frustrada: Espera só pode estar havendo algum engano, essa carta é falsa eu aposto! Eu era casada com o Belarmino portanto tenho direito a metade do que conseguimos depois do casamento, e o sítio? Ele devia ser meu!
Jequinha, sério: Vocês não adquiriram nada depois do casamento, apenas um apartamento em Cuiabá que pegou fogo. Portanto agradeça de ele ainda ter te deixado um livro, uma coleção, a conta e a porca.
Betânia, furiosa: EU PROTESTO! QUERO O QUE É MEU POR DIREITO!
Jurema ri: Querida, aceita que dói menos, lembra?
Betânia range os dentes: Aquele fazendeiro troglodita não podia ter feito isso comigo! Maldito seja ele…
Jurema, debochada: Aposto que meu irmão sabia que você não o amava de verdade, portanto deixou o sítio e os outros bens pra mim. Não foi dessa vez que você conseguiu tirar vantagem sobre ele, Betty.
Jequinha continua: A próxima é Jurema “Minha irmã, apesar de ser adotiva você foi a única pessoa da família que jamais me virou as costas. Pra você faço questão de deixar uma quantia em dinheiro que ficava escondida atrás do meu quadro de Van Gogh”
Betânia: Então era lá que ficava!
Jequinha prossegue: “…E o dinheiro que tem lá você poderá aplicar em melhoria do seu mercado, apesar de que não é muito. Deixo também meus pertences de ouro, que você sempre admirou, e é claro, o anel de diamantes da nossa querida avó Robervalda que estava em minha posse. Fique bem, e tente controlar a sua língua, por favor”.
Jurema, indignada: Se ele não deixou o sítio pra mim só pode ter sido pra esse velho- Se refere a Benê- Não é justo, eu era a única da família!
Betânia: Aceita que…
Jurema: Se você falar isso mais uma vez eu te esbofeto na frente de todos e não tenho medo de arrancar seus cabelos, é bom que posso fazer novas perucas!
Jequinha, cansado: Vamos acalmar os ânimos senhoras, eu preciso terminar de ler esse testamento logo.- Betânia e Jurema se calam- Agora ele vai falar para o Benê. “Você foi o meu companheiro de anos no violino, portanto nada mais justo que lhe deixar aquele violino de ouro que ganhamos em 1973, provavelmente você ainda deve ter o seu, pois fique com o meu e lembre-se de mim toda vez que tocar nele. Benê, pra você também deixarei o meu carro, que não é novo e muito menos de 2014, mas tem muitos valores especiais, e disso você conhece bem e deixo a minha mala de dinheiro que ficava em cima do chiqueiro pra ti, use e abuse meu caro”.
Benê se emociona.
Jurema conclui: Se ele não deixou o sítio pra nenhum de nós três, só pode ser pra mulher misteriosa!
Betânia: Mas quem é essa maldita mulher?!
Josélia abre a porta e entra: Opa, desculpem o atraso.
Betânia e Benê, espantados: JOSÉLIA?!
Hospital particular Sta Edwiges.
Anna, Noronha e Jasmine esperam Éssio.
Anna, ansiosa: Tomara que essa cadeira de rodas tenha dado certo no Éssio…
Jasmine também está aflita: É verdade dona Anna, o coitado já está muito abatido com esse tiro que veio de repente. Acho que pra se recuperar ainda vai levar um tempo.
Anna concorda: Até que ele se recupere totalmente vai ficar em uma zona muito frágil, o médico me explicou. Ele deve ser tratado com muito cuidado, mas sem nenhum tipo de pena, ou ele vai ficar pior.
Noronha, ansioso: Zona frágil, é? Nossa…- Ele morde os lábios.
Éssio aparece em uma cadeira de rodas automática, mas ainda é puxado por um enfermeiro. O médico vem atrás.
Anna vai pra perto de Éssio: Tá tudo bem, filho? Você já tá melhor?
Éssio, triste: Bem não está, mãe. Acho que nunca mais vai ficar, pelo menos eu vou sair do hospital. Mais um dia e poderia pensar em…
Anna: Não…Não conclua essa frase.
O médico dá uma carta para Anna: Aqui tem todas as instruções sobre os cuidados necessários nesses primeiros dias, é bom que leiam tudo. Consultem um psicólogo e tentem contratar um cuidador pra ele, pois com o passar do tempo ele irá precisar até que se acostume.
Noronha coloca os óculos escuros: Eu conheço um ótimo psicólogo- Diz ironicamente.
Anna pega a carta: Obrigado doutor, acho que então nós já podemos ir.
Médico: Voltem aqui em uma semana, vamos começar a fisioterapia e o acompanhamento. Éssio é bom ressaltar que você ainda tem chances de voltar a andar se tudo correr bem.
Anna, confiante: Tudo vai correr bem doutor, com a graça de Deus. Nós…Tivemos uma ajuda, se não estaríamos ainda no hospital público.
Médico: O Noronha me contou tudo, vocês devem muito a ele, ou então Éssio nem teria chances de se recuperar. É muito bonito ver a cumplicidade entre esses irmãos, quiçá todos os irmãos fossem assim.
Todos se constrangem.
Noronha, apressado: Pois então vamos, Éssio. Pra sua nova e definitiva casa. Lá você vai viver momentos inesquecíveis- Ele sorri.
Anna sai empurrando a cadeira de rodas, e Jasmine os segue, mas não tira os olhos de Éssio.
Casa de Noronha…
Ema ajeita o sofá: Parece que a Anna e o Éssio vão vir morar aqui.
Helder bebe uma cerveja: Que porre…Eu odeio aqueles dois, você lembra como eles faziam mal ao Noronha? Ele ia lá em casa chorar, bons tempos aliás quando tínhamos dinheiro.
Ema bate nas almofadas: Helder, eles fizeram muito mal sim mas aquilo é coisa do passado, agora o Noronha tomou uma linda atitude e resolveu acolhe-los aqui e pagar o tratamento do irmão.
Helder: Pra mim o Éssio foi tão ruim que a vida resolveu dar o troco. Noronha tá sendo muito bonzinho, tem alguma outra intenção por trás disso.
Ema alerta: Cala a boca, Helder. Não vai ficar falando essas coisas ou a gente é demitido e voltamos pro nosso casebre.
Ela ouve o barulho do portão automático abrir.
Ema, apressada: Eles chegaram e o almoço ainda nem tá pronto. Larga essa cerveja e me ajuda!- Os dois vão até a cozinha.
Minutos depois, Noronha abre a porta e Éssio entra, sendo empurrado por Anna.
Noronha coloca as chaves no criado- mudo: Aqui vai ser a nova casa de vocês- Ele sorri.
Anna e Éssio estão boquiabertos com a beleza da mansão.
Termina o capítulo 54